Investigação foca Invasão, financiamento, omissão e estímulo

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Foto: Editoria de Arte/O Globo

Quatro dias após os atos terroristas em Brasília, as apurações sobre o caso foram divididas pelos órgãos de investigação em quatro frentes: identificar as pessoas que invadiram e depredaram as sedes do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto; descobrir quem financiou os manifestantes; apurar a omissão de agentes públicos que deveriam zelar pela segurança pública; além de encontrar eventuais conexões políticas entre líderes das manifestações com autoridades.

Nesta quarta-feira, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu a instauração de um novo inquérito específico para apurar essa última frente, das ligações políticas. Em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), o subprocurador-geral Carlos Frederico dos Santos, designado pelo procurador-geral Augusto Aras para conduzir as investigações sobre os atos antidemocráticos, solicita apuração sobre a responsabilidade dos deputados federais diplomados André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP). Segundo a PGR, “o discurso em apoio e a conclamação dos atos que culminaram na invasão às sedes dos Poderes constitucionais são indicativos de que o incitamento difundido (…) estimulou a prática das ações criminosas”.

Fernandes e Clarissa negaram nas redes sociais terem incentivado os atos. O deputado disse que não convocou ninguém e disse que não sabia que haveria “quebra-quebra nem vandalismo”. Já Clarissa afirmou que é “totalmente contra qualquer tipo de violência, vandalismo, ou de destruição do patrimônio público, que venha ameaçar a nossa democracia”. Waiãpi foi procurada, mas não respondeu aos contatos.

Em outra frente, a Polícia Federal analisa material apreendido anteontem na casa do ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres, em busca de elementos que demonstrem eventual conexões políticas com os envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Torres, que foi ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, é alvo de uma ordem de prisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que ainda não foi cumprida porque ele está em viagem aos Estados Unidos.

A busca pelos financiadores também avançou nesta quarta, após um vendedor de picolé de Salvador preso no domingo afirmar ter recebido R$ 400 para viajar a Brasília para participar do atos. Em depoimento à Polícia Civil, revelado pelo colunista Ancelmo Gois, do GLOBO, Gilvã Estrela da Silva informou que ficou sabendo da caravana “porque vendia picolés em frente ao acampamento de Salvador”.

As principais provas são as imagens do dia, feitas pelos próprios golpistas, por câmeras de segurança ou pela imprensa, permitem identificar centenas de vândalos

Foram cerca de 200 presos em flagrante na Praça dos Três Poderes, mas as autoridades estimam a presença de mais de 4 mil pessoas. Outras 1,2 mil pessoas foram presas no dia seguinte no acampamento no QG do Exército. Boa parte, como os idosos, já foi liberada

Os depoimentos têm ajudado a esclarecer a dinâmica e a motivação dos acontecimentos. Nos depoimentos, um dos presos afirma que a ideia era criar uma situação que justificasse a decretação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para que o Exército pudesse ser acionado

Até que ponto o acampamento no QG do Exército foi usado para planejar os atos

O papel das principais lideranças da invasão

A Justiça precisará distinguir a atuação de cada um nos mais de dez possíveis crimes cometidos no dia

O governo federal acusa o Governo do Distrito Federal de ter mudado o planejamento para o dia 8. Segundo o ministro Flávio Dino, o GDF decidiu deixar a Esplanada dos Ministério aberta e com menos policiais. O interventor na Segurança, Ricardo Cappelli, afirma que o ex-secretário Anderson Torres exonerou parte da cúpula da Secretaria e deixou o comando acéfalo.

As imagens apontam para a conivência de policiais e militares responsáveis pela segurança. A revista na barreira na Esplanada era frágil. Policiais fotografavam a multidão que cometia crimes. Outros foram fotografados tomando água de coco

Os depoimentos acrescentaram novos elementos. Um golpista afirmou que um militar do Exército ajudou vândalos a fugir do Planalto na chegada da polícia. Outros três disseram ter sido orientados a entrar no Planalto “para se abrigar”

Em sua defesa do STF, o governador afastado, Ibaneis Rocha, afirmou que houve “ato de sabotagem” por parte de sua equipe de segurança e citou, especificamente, “a deserção dos postos por parte de alguns policiais”

Anderson Torres e o ex-chefe da PM, Fábio Augusto, tiveram a prisão decretada

Qual a responsabilidade de cada membro da cúpula de Segurança do DF no policiamento ineficaz?

Qual o papel do GSI, responsável por proteger o Palácio do Planalto com um grupo de militares?

Quais responsabilidades do governo federal e das Forças Armadas na falta de prevenção aos episódios e na demora para resolvê-los?

As investigações da Polícia Federal e da Polícia Civil do Distrito Federal apontam que os atos terroristas foram bancados, em sua maior parte, por empresários. Em depoimentos, ao menos três golpistas presos afirmaram ter viajado a Brasília em ônibus fretados, sem qualquer custo. Uma professora de SP afirmou que a convocação foi feita num grupo de apoiadores do ex-presidente Bolsonaro

Em depoimento, Gilvã Estrela da Silva contou ter recebido R$ 400 para sair de Salvador e ir protestar em Brasília. Ele disse ter ficado sabendo da caravana “porque vendia picolés em frente ao acampamento de Salvador”

Mais de 100 ônibus nos dias anteriores aos atos. A polícia já identificou os donos dos veículos

Alguns donos dos veículos que transportaram golpistas têm ligação com lideranças bolsonaristas. Um deles, o empresário Maurício Nogueira, concorreu a deputado estadual em SP e fez campanha com a deputada Carla Zambelli

As autoridades têm a lista dos donos de veículos para chegar a quem pagou por eles

Ao chegar a quem financiou os manifestantes, a polícia investigará se há ligações com lideranças políticas ou outros grupos

O discurso de enfrentamento das instituições e contestação do sistema e do resultado das eleições por parte do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados ajudou, na visão de autoridades, a criação de grupos dispostos a atos como os de domingo

Na noite de anteontem, Bolsonaro compartilhou um post no Facebook que contestava a eleição de Lula, intensificando o discurso mesmo após os atos golpistas

A Procuradoria-Geral da República pediu para abrir inquérito contra três deputados federais diplomados suspeitos de incitar os atos de terrorismo em posts nas redes sociais: André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP)

Um dos desafios das investigações é demonstrar ligação direta entre líderes das manifestações com autoridades políticas
Para juristas, publicações nas redes sociais feitas por políticos ajudam a construir provas de incitação, mas, se isoladas, podem ser insuficientes para ligá-los a atos violentos

O Globo