Já se vislumbra harmonia entre poderes

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O terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entra na quarta semana com uma situação atípica no país desde a redemocratização: a tentativa de instalação de um golpe de Estado ou de, pelo menos, um caminho aberto para a derrubada do regime republicano. Os atos criminosos de bolsonaristas no dia 8, contudo, ganharam projeções diferentes, adiantando entre Executivo, Legislativo e Judiciário uma relação harmônica que precisaria ser trilhada a partir da interação cotidiana entre os Poderes para que se reestabelecesse no Brasil a plenitude do Estado Democrático de Direito.

Previsto constitucionalmente, o modelo de freios e contrapesos vem, há cerca de uma década, estremecido, após termos como politização do Judiciário diante de atos no mensalão e na Lava-Jato ficarem em voga. A cena de Lula caminhando de braços dados com Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), do Palácio do Planalto à Corte, junto a Augusto Aras, representante máximo do Ministério Público Federal (MPF) e da Procuradoria-Geral da República (PGR), e governadores, após reunião de solidariedade aos ataques terroristas na Esplanada, ganhou espaço e apontou para uma pacificação democrática.

“O grande desafio do presidente Lula é reorganizar a direita civilizada no país e isolar Bolsonaro e o bolsonarismo para acabar com o avanço do fascismo no Brasil”, opina Marco Aurélio de Carvalho, jurista e coordenador do Grupo Prerrogativas. “O presidente vai investir em uma relação de independência e harmonia com os demais Poderes, dando segurança jurídica e previsibilidade para as relações entre Executivo, Legislativo e Judiciário”, completa.

Professor de ciência política, João Feres argumenta que a agressão aos Três Poderes forçou uma relação para que as instituições atacadas se unissem, mas pondera que há, para Lula, o “grande desafio de se viabilizar, do ponto de vista orçamentário, e poder governar sem ter oposição muito grande para discutir no parlamento pautas como o teto de gastos”. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), já sinalizou que intenciona que haja debate sobre a regra instalada no período de Michel Temer (MDB) na Presidência e que cria entraves para investimentos do Orçamento da União em áreas como saúde e educação, estabelecendo assim uma política de austeridade.

“Há uma agenda conservadora, mais tradicional, ditada por partidos neoliberais, alinhados a uma concepção de gasto público.” Para a professora de ciência política da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Luciana Santana, apesar dos atentados e dos resultados advindos deles, Lula conseguiu se fortalecer antes mesmo do prazo que, até de maneira inconsciente, teria para estabelecer a conexão com Legislativo e Judiciário. “Lula até conseguiria com um tempo maior de mandato.”

A docente considera, no entanto, que não é possível cravar que o perfil junto ao Congresso será de harmonia plena, apesar dos indícios, e que esse cenário poderá ser previsto após o início da próxima legislatura, em 1º de fevereiro. Na ocasião, Câmara dos Deputados e Senado voltam a funcionar em sua plenitude, com parlamentares empossados. “Há uma composição mais desfavorável ainda para Lula, inclusive formada por parlamentares cujos partidos estão no governo, como o União Brasil. O presidente precisa tomar rumos diferentes dos de 2003 e 2007, anos de seus anteriores mandatos, em que havia outro perfil congressista.”

Correio Braziliense