Lula sinaliza que não pode baixar a guarda

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Foto: Estadão

Sem grandes surpresas, os discursos de posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva apontaram para um esforço de conciliação nacional (“vou governar para 215 milhões de brasileiros”), mas sem deixar de lado profundas diferenças históricas com a gestão de Jair Bolsonaro (“democracia para sempre”). Os recados mais duros de Lula foram dados na primeira fala, no Congresso Nacional, e deixaram claro que muitas ações do ex-presidente, como as relacionadas à pandemia, serão levadas à Justiça.

Seria ingênuo esperar que Lula voltasse ao Palácio do Planalto com um tom completamente conciliatório por pelo menos três motivos.

O primeiro é que ele sabe que enfrentará uma oposição muito combativa. O ex-vice-presidente da República e futuro senador Hamilton Mourão, em pronunciamento oficial no dia 31, por exemplo, reforçou que fará “dura oposição ao projeto progressista de turno”. Pesquisa Datafolha divulgada no último dia de 2022 mostrou que 26% dos brasileiros acreditam que Lula fará um governo ruim ou péssimo, um índice superior ao de todos os presidentes eleitos desde a redemocratização.

Nesse sentido, a contundente fala de Lula mantém líderes da oposição, Bolsonaro inclusive, sob pressão constante, atentos ao risco de ações judiciais como consequência de decisões tomadas quando estavam no governo. É o inverso do que Lula e o PT viveram quando deixaram o poder em 2016, às voltas com a Operação Lava Jato.

Em segundo lugar, faz sentido que Lula critique pesadamente o legado de Bolsonaro porque sabe que enfrentará dificuldades diante de tantas restrições econômicas. Lula precisa administrar as expectativas de seu eleitorado, e prepará-lo para uma melhora gradual. Não é à toa que o novo lema oficial fala em “reconstrução”. Isso só faz sentido se Lula deixar claro o que foi destruído.

Por fim, ressaltar as diferenças com o governo Bolsonaro permite a Lula manter por mais tempo acesa a chama da “frente ampla”. Sem a ameaça do bolsonarismo, o novo presidente e o PT terão dificuldades para segurar alguns de seus neo-aliados de centro.

Ainda é muito cedo para falar em fissuras, em pleno período de lua de mel do novo governo. Mas, pensando no governo como um todo, o mais racional é manter uma linha consistente de “frente pela democracia” contra a oposição.

Estadão