Militares argumentam que não contestaram Lula uma só vez

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Foto: André Borges/EFE

Ao explicitar suas desconfianças em relação aos militares, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não surpreendeu na caserna. Contentou os petistas que cobram do presidente a afirmação do poder civil sobre o militar e consideram que os fatos do dia 8, em Brasília, são uma oportunidade para enquadrar os militares que resistiam a desmontar os acampamentos diante dos quartéis. Atendeu ainda os que também defendem a desmilitarização do setor de inteligência do governo, desvinculando a Agencia Brasileira de Inteligência (Abin) do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

Desde o dia 8, generais e coronéis estão mais preocupados em cuidar das feridas surgidas entre os membros da ativa e manter e reconstruir a disciplina e a hierarquia abaladas pela radicalização dos que adotaram o discurso do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A reportagem ouviu de uma dezena de militares nesta semana expressões de desalento com a polarização que tomou conta do País e que levou à invasão da sede dos três Poderes como uma espécie de tragédia anunciada. Eles também fizeram questão de afirmar que, apesar dos dois meses de acampamentos na frente das unidades militares de todo o País não foi registrado um episódio de indisciplina de oficiais ou graduados da ativa.

Para eles, isso indicaria que dentro das casernas a coesão da tropa se manteve. Mas isso teve um custo. Relatos de oficiais dão conta da dificuldade de lidar com o fato de que todas as pessoas que estavam acampadas viam nos militares uma espécie de última defesa da República em razão da eleição de Lula.

Exemplo do desconforto entre os militares foi o fato de o general Gustavo Henrique Dutra Menezes, comandante militar do Planalto, ter visitado seis unidades e discursado para a tropa formada sobre os eventos de domingo. “Fizemos o certo. Não tem caminho fora do que é o certo”, repetiu o general para seus subordinados.

Reconstruir a institucionalidade e pacificar o País são as preocupações da maioria dos oficiais consultados. Se antes eles se viam como alvo de críticas de partidos de esquerda, agora eles se viram sob ataques de colegas radicalizados pelo bolsonarismo e de militantes da extrema-direita. Desde dezembro, quando ficou claro para o bolsonarismo radical que os generais não dariam um golpe de estado para impedir a posse do petista, começaram a circular em grupos do Telegram e do WhatsApp da extrema-direita listas com os chamados generais melancias, acusados de serem comunistas.

Cinco integrantes do Alto Comando do Exército estavam entre os principais alvos dos extremistas: o comandante militar do Sudeste, Tomás Miguel Ribeiro Paiva, o comandante militar do Leste, general André Luiz Novaes; o comandante militar do Nordeste, Richard Nunes, o chefe do Estado-Maior do Exército, Valério Stumpf Trindade e o diretor de Ciência e Tecnologia do Exército, general Guido Amin Naves. O comandante do Exército, general Marco Antonio Freire Gomes, chegou a escrever uma nota em defesa dos oficiais. De nada adiantou. Em novos ataques, os extremistas incluíram mais um general na lista: Dutra.

O cerco aos generais legalistas aumentou semana a semana. Os extremistas tentavam destruir a reputação dos oficiais como forma de provocar um movimento de insubordinação envolvendo coronéis. Alguns generais da reserva passaram a criticar abertamente os colegas que se recusaram a embarcar no golpe. Todos eles ligados ao ex-comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas e aos que aderiram ao governo Bolsonaro: Walter Braga Netto, Luiz Eduardo Ramos e Augusto Heleno. Os três foram apontados por oficiais como os principais responsáveis pelo radicalismo de alguns integrantes da reserva, caso do coronel Adriano Camargo Testoni, que participou dos eventos do dia 8 e publicou em suas redes sociais vídeos ofendendo generais e o Exército.

Estadão