Antipetista até ontem, Casagrande apoia Bob Neto

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Foto: Leo Pinheiro/Valor

Aliado do Palácio do Planalto, o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), diz que o presidente Lula precisa compreender que há “limite” na postura de enfrentamento ao Banco Central e critica hipótese de intervenção política para alterar metas de inflação e forçar redução dos juros.

O governo erra ou acerta na forma de conduzir a discussão sobre os juros?

O ministro Fernando Haddad (da Fazenda) tem um comportamento equilibrado. O Brasil tem uma cultura de juros elevados, e esperamos que se conquistem as condições para reduzi-los. Porque a inflação acaba sendo só a ponta do iceberg. A taxa de juros tem a ver com capacidade produtiva, com base em infraestrutura montada. O debate deve ser feito de forma racional, com menor intensidade de palavras-chave e mantras.

Ficou acima do tom a pressão feita por Lula sobre o presidente do Banco Central?

Há uma reação por parte do Lula e outras pessoas porque o mercado, essa entidade invisível, reage com menor intensidade em algumas situações do que em outras. Mas a gente tem que compreender que essa indignação tem um limite, não dá para a gente ficar lutando contra moinhos de vento. Temos que conquistar os resultados sem precisar fazer essa guerra diária. Mas Lula e Haddad têm relação de total confiança, não vejo desautorização. São estilos distintos.

A discussão sobre revisão de metas de inflação, que não foi feita na reunião do Conselho Monetário, caberia agora?

Não. O debate político pode levar a decisões novas, mas quando você passa para uma intervenção política, gera efeitos contrários na economia.

O início do governo Lula acabou muito impactadotaminado pelos atos do dia 8 de janeiro?

Foi. Não posso ainda dizer que tenha sido uma tentativa articulada de um golpe, mas foram atos de vandalismo que muitos leram como tentativa frustrada. Pelo risco, era necessário que dominasse a pauta do governo naquele momento. Não podemos desmerecer a força do Bolsonaro e de seu movimento. Agregar todas as forças democráticas terá de ser tarefa constante.

O PSB tem três ministérios, dois por indicações pessoais de Lula: Flávio Dino (Justiça) e Geraldo Alckmin (Indústria). Pernambuco, o berço da legenda, ficou fora. Faltou mais carinho com o partido?

O PSB foi o partido mais importante, depois do PT, na aliança com o presidente Lula. Estar no governo não é só dar resultado em áreas específicas, mas participar de todo o projeto, e nisso nos sentimos contemplados no momento. O PSB de Pernambuco teve um problema, deu curto-circuito. Tanto é que o (ex-governador) Paulo Câmara se afastou do PSB. Lula com certeza acolherá o Paulo Câmara, mas naquele momento o partido se sentiu mais contemplado com a presença do Márcio França no Ministério de Portos e Aeroportos.

Na sua reeleição, aliados incentivaram um voto casado entre o senhor e o então presidente Jair Bolsonaro, apelidado de “CasaNaro”. Isto lhe afastou um pouco de Lula?

Desde o primeiro turno fizemos uma aliança muito ampla. Tive o PSDB como vice, coligação com o PP. Meu candidato sempre foi o Lula, em nenhum momento o pessoal teve dúvida. Bolsonaro tinha seu candidato, o Carlos Manato (PL), e o Espírito Santo foi o único estado em que ele, sendo majoritário, perdeu a eleição para governador.

O crescimento da oposição no Congresso trará dificuldades?

A representação do Bolsonaro no Legislativo e na sociedade não se resolve com a posse do presidente Lula. Portanto, a relação entre governo e Congresso terá de ser mais sofisticada. Porque você terá aqueles programaticamente contrários ao projeto do Lula, mas agora também há parlamentares com compromisso ideológico com o que os levou até ali.

As discussões com o governo federal sobre compensação da perda de arrecadação pela redução do ICMS sobre combustíveis se arrastam desde 2022. O que falta?

O valor que o governo está chegando hoje, R$ 26 bilhões com pagamento escalonado em três anos, não está longe do que esperamos. O problema maior é que alguns estados conseguiram compensar as perdas através da suspensão do pagamento da dívida com a União, com decisões liminares do STF. A maioria não obteve liminar, mas um estado como São Paulo, que obteve há mais tempo, acabou já compensando e na verdade teria que de alguma maneira devolver algum dinheiro. Isso tem atrapalhado a tentativa de unificar os governadores.

Além deste tema, a reforma tributária é a principal agenda do governo federal com os estados neste ano?

Não dá para atender todo mundo, mas os entes federativos precisam estar protegidos. Veja a confusão que deu o Congresso votar a redução do ICMS sem ter conversado. Os estados vão perder receita de ICMS, e os municípios, de ISS. O prazo de transição de 20 anos gera simpatia, mas o governo federal precisará dar a segurança de aportar recursos para um fundo de compensação no período. Por outro lado, todos temos de ceder. Não pode ser que nem a história do ponto de ônibus: todo mundo sabe que é importante passar perto de casa, mas ninguém quer ter na frente da sua casa.

O Globo