Cerca de mil golpistas completam 30 dias de cana

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Foto: Victor Moriyama/The New York Times

Em mais uma vertente da apuração sobre os atos golpistas, a Polícia Federal prendeu nesta terça-feira quatro oficiais da Polícia Militar do Distrito Federal (PM-DF), entre eles o coronel Jorge Eduardo Naime, ex-chefe do departamento operacional, por suspeita de omissão no planejamento da segurança do dia 8 de janeiro. Um levantamento do GLOBO mostra que, um mês após os atos, completados hoje, há ao todo 965 pessoas detidas, enquanto 653 foram denunciadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

As investigações estão divididas em quatro frentes: a participação in loco nas invasões e responsabilidade por atos de vandalismos; o financiamento dos golpistas; a omissão de agentes públicos que deveriam zelar pela segurança pública; e o incentivo aos manifestantes radicais por meio das redes sociais.

Preso preventivamente ontem em nova fase da operação Lesa Pátria, o coronel Jorge Eduardo Naime cuidava do setor responsável por elaborar o plano que mobiliza os batalhões e efetivos para determinadas ações — reforço que não foi organizado, segundo o relatório da intervenção federal, a despeito dos documentos de inteligência que já destacavam o potencial violento dos atos. Ele foi afastado do cargo pelo então interventor federal Ricardo Cappelli em 10 de janeiro.

O militar tinha pedido folga às vésperas do ataque à Praça dos Três Poderes e estava fora de Brasília no momento da invasão ao Palácio do Planalto, ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Naime foi chamado às pressas para conter os invasores, já que havia solicitado folga em 3 de janeiro até o dia 8 — também estavam subordinados a ele oito comandantes de batalhões que estavam de férias, incluindo o do Choque. Além disso, ao GLOBO, Cappelli, hoje secretário-executivo do Ministério da Justiça, disse que viu com “os próprios olhos” o oficial tentando retardar a linha de contenção da PM-DF quando as sedes dos três Poderes já estavam desocupadas. O cordão de policiais visava a expulsar os manifestantes golpistas que ainda se concentravam na Esplanada dos Ministérios.

— A impressão que me dava é que ele não queria que a linha andasse. Ela estava avançando muito lentamente. Foi uma guerra para eu conseguir fazê-la andar — disse Cappelli, que naquela ocasião já havia sido nomeado interventor federal e coordenava a ação em campo.

Em nota, a defesa do coronel afirmou que ele “agiu conforme a lei e a técnica, realizando todas as prisões ao alcance das condições materiais com as quais contava no momento”. A defesa enfatizou que Naime participou da coordenação da operação de segurança da posse de Lula, em 1º de janeiro.

Também foram presos ontem o major da PM Flávio Silvestre de Alencar, o capitão Josiel Pereira César e o tenente Rafael Pereira Martins. Alencar era subcomandante do 6º batalhão de Polícia Militar do DF, na região da Praça dos Três Poderes e Esplanada. Ele é considerado especialista em controle de distúrbios civis.

O capitão César estava vinculado ao gabinete do comandante-geral da PM, como ajudante de ordens. Já o tenente Martins ingressou na PM-DF em concurso de 2019 e não tinha cargo comissionado na cúpula da corporação.

A operação de ontem foi mais um desdobramento das reações em decorrência da iniciativa golpista. Em 8 de janeiro e no dia seguinte, no acampamento bolsonarista em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, foram presos em flagrante, segundo relação divulgada pelo STF, 1.406 pessoas. Destas, 942 seguem presas após terem a prisão convertida em preventiva, enquanto 464 foram soltas, mas com tornozeleira eletrônica. Durante as investigações foram presas outras 20 pessoas pela Operação Lesa Pátria, da PF. Além desses, foram detidos Anderson Torres; Antônio Cláudio Alves Ferreira, que destruiu relógio de Dom João VI no Planalto; e Willian da Silva Lima, que roubou uma toga usada pelos ministros do STF.

Já o Exército abriu uma sindicância para apurar a conduta de um sargento do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP) que teria se juntado aos invasores do Planalto para cantar o Hino Nacional. O procedimento foi instaurado no início deste mês com base em imagens gravadas dentro da sede de Executivo. A sindicância tem um prazo de 30 dias para ser concluída.

Chamado a prestar esclarecimentos, o sargento, cujo nome é mantido em sigilo, alegou que cantou o hino para tentar ganhar a confiança dos invasores. O GLOBO apurou que o militar disse não ter sido o único.

A avaliação preliminar de oficiais envolvidos na investigação é que o comportamento não configura crime, mas uma “conduta inadequada”. Por isso, o comandante militar do Planalto, general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, determinou a abertura de uma sindicância à parte de um Inquérito Policial Militar (IPM) que já está em curso.

O IPM foi aberto em 12 de janeiro para apurar a atuação do BGP dentro do Planalto. O então comandante do batalhão, tenente-coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora, foi flagrado por câmeras de segurança discutindo com policias militares, enquanto vândalos destruíam o Planalto.

O Ministério Público Militar abriu até agora oito apurações preliminares sobre a participação de integrantes das Forças Armadas na invasão e depredação das sedes dos três Poderes. Segundo o MPM, o objetivo dessas notícias de fato que foram abertas a partir de 8 de janeiro é apurar “suposto auxílio de militares do Exército na fuga de manifestantes após participação em atos antidemocráticos”. Eventuais denúncias envolvendo oficiais ou generais serão analisadas pelo Superior Tribunal Militar (STM).

O Globo