Conheça o juiz lulista que comanda a Lava Jato

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Foto: Reprodução

Novo rosto da operação Lava-Jato, o juiz Eduardo Fernando Appio, que assumiu a 13ª Vara Federal de Curitiba no dia 7 de fevereiro, promete trazer novo gás à força-tarefa de combate à corrupção que ganhou notoriedade sob o comando do ex-juiz e atual senador Sergio Moro (União). O magistrado, que define Moro como ex-amigo e critica os métodos que o ex-juiz utilizou quando ocupava o mesmo cargo, teve seu nome e dados pessoais divulgados na lista de doadores para a campanha presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O juiz , no entanto, nega ter feito o repasse.

Segundo dados do site do Tribunal Superior Eleitoral, ele teria repassado R$ 13 para a campanha de Lula no dia 25 de setembro. Appio aparece ainda como autor de um segundo repasse, no valor de R$ 40, para a deputada estadual do Paraná Ana Júlia Ribeiro (PT-PR). O magistrado, porém, diz não saber como seus dados foram relacionados entre os doadores do Partido dos Trabalhadores (PT), mas fez questão de apresentar comprovantes bancários para negar que tenha feito as transações. O GLOBO procurou o TSE para explicar o que pode ter acontecido ou confirmar a doação, mas inda não obteve resposta.

Juiz federal há 23 anos, Eduardo Appio afirma que não se posicionou politicamente favorável a nenhum candidato e conta que sequer votou no segundo turno, por conta de problemas familiares. Ele também não pretende investigar um possível uso irregular de seus dados na declaração de doadores, porque considera o fato irrelevante e se disse focado exclusivamente nos trabalhos da Lava-Jato.

— Não vejo relevância nisso, não impacta em nada as minhas decisões. Até porque esses processos que estão nos TREs e que estou pedindo celeridade atingem majoritariamente quem está hoje em Brasília no governo. Se eu fosse um ideólogo de esquerda, seria muito mais confortável deixar os processos para arquivo, para prescrição — justifica.

Desde que assumiu o comando 13ª Vara Federal, Appio retomou audiências com testemunhas e delatores, já tendo ouvido, inclusive, Pedro Barusco e Alberto Youssef. Os depoimentos, segundo ele, foram relevantes e apresentaram elementos inéditos. Entre suas ações prioritárias à frente da Lava-Jato está dar celeridade aos cerca de 250 processos em tramitação na vara.

— Estamos com várias ações buscado exatamente a transparência. A principal dentre elas é oficiar com os Tribunais Regionais Eleitorais, em diversos estados da federação, pedindo que essas ações que foram remetidas por nós da 13ª para às Justiças Eleitorais tenham algum tipo de andamento e não fiquem completamente paradas como ficaram ao longo dos últimos nove meses. Isso gera uma sensação grande de impunidade e os valores continuam bloqueados comigo, só do caso do Antonio Palocci são quase R$ 80 milhões que estão parados”, relata o magistrado, adianto que pretende relatar os casos ao Conselho Nacional de Justiça, caso não tenham andamentos nas justiças eleitorais.

A força-tarefa da operação Lava-Jato foi encerrada em 2021, restando agora a tramitação dos processos na vara federal de Curitiba. Apoiador de primeira hora da operação, Appio, que se define como garantista, conta que o tema sempre esteve presente em seus trabalhos acadêmicos. As divergências surgiram, segundo ele, junto com questionamentos a respeito da relação de Moro com os procuradores do Ministério Público que integravam a força-tarefa e sobre o uso político das ações.

— Se os diálogos entre Moro e Deltan Dallagnol forem de fato verdadeiros, e há inúmeros indícios de que são, a começar pelo fato de que os procuradores aparentemente deletaram todos os arquivos de seus celulares funcionais no dia seguinte, a condução naquele momento não poderia ter sido pior pra fins de credibilidade do Judiciário. É evidente que você não pode combinar decisões com o Ministério público, o juiz tem que ser imparcial. Nunca vi isso em 30 anos dentro do sistema judiciário — avalia.

Appio releva ainda que as discordâncias com Moro a respeito do sistema Judiciário não são de hoje e que já foram debatidas, inclusive, no campo acadêmico.

— A minha tese de doutorado teve como título Controle Judicial das Políticas Públicas no Brasil, uma crítica ao populismo judicial. A tese do Moro, que foi.publicada no mesmo ano, defendia o ativismo dos juízes. Então, apesar da amizade pessoal no passado, sempre houve uma certa disputa de opiniões acadêmicas. No plano pessoal, gosto dele e da esposa, são bons de papo — relembra.

A relação de amizade com Sergio Moro, segundo ele, acabou sem uma ruptura ou briga, se dando exclusivamente à falta de tempo ocasionada por compromissos profissionais de ambos. Sobre um possível encontro com Sergio Moro, já que o senador tem como uma de suas principais bandeiras a defesa da Operação Lava-Jato e o combate à corrupção, o juiz se diz disponível.

— Fui amigo pessoal do Sergio Moro durante muitos anos, foi o único colega que eu convidei nos cinco primeiros aniversários da minha filha. A esposa dele é um doce de pessoa, gosto dela. Mas não vamos misturar o lado histórico institucional com o pessoal. Seria uma honra receber um senador federal em um gabinete que ele ocupou tanto tempo. Sempre pontuei que ele foi um servidor público dedicado, um trabalhador incansável. Seria uma honra receber esse ex-amigo, esse ex-colega— garante .

Appio substituiu no posto à frente da Lava-Jato o magistrado Luiz Antonio Bonat, titular de 2019 até o ano passado, quando foi promovido à segunda instância. O novo titular chega tendo como principal missão resgatar a credibilidade da Lava-Jato e garantir sua neutralidade política, ideológica e partidária.

— Vai ser enxugar gelo. Resgatar a credibilidade da 13ª Vara vai ser uma missão quase impossível. Mas se tudo isso virar um caso Banestado 2, vai ser muito ruim para a imagem da Justiça Federal— avalia ao se referir às muitas ações do caso que acabaram arquivadas.

O banco Banestado, privatizado em 2000 pelo então governador do Paraná, Jayme Lerner, serviu para, segundo as investigações de uma força-tarefa, remeter US$ 30 bilhões irregularmente para o exterior. As remessas eram feitas por meio de contas CC5 (de não residentes). Moro atuou no caso, antes de assumir a força-tarefa da Lava-Jato.

O Globo