Direita procura algum escândalo nos ministérios de Lula

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Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

A oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Câmara pretende formar um grupo para fiscalizar, individualmente, pelo menos 10 ministérios do governo. A ideia é que cada deputado acompanhe de perto as ações das pastas com orçamentos vultosos, como Educação e Saúde, e aquelas que têm mais importância política, a exemplo do Ministério da Fazenda.

Trata-se de uma estratégia inspirada no “shadow cabinet” – gabinete sombra, em tradução livre –, que funciona em países parlamentaristas, como Reino Unido, Austrália, Dinamarca, Portugal e Espanha. No parlamento britânico, os integrantes da equipe são escolhidos pelo líder da oposição e reproduzem os ministérios. Cada parlamentar lidera uma área específica, questiona as políticas adotadas e se apresenta como membro de um futuro governo alternativo ao que está no poder.

A iniciativa na Câmara é liderada pelo deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), que foi procurador e coordenou a força-tarefa do Ministério Público na Lava Jato. A intenção do grupo é começar o trabalho com dez ministérios e depois aumentar o número de pastas fiscalizadas. O gabinete de Dallagnol, que não tem cargo de liderança na Casa, iniciou uma espécie de “mapeamento” dos colegas para, então, convidá-los a participar da empreitada.

Na lista dos ministérios com os maiores orçamentos da Esplanada constam Previdência, Desenvolvimento e Assistência Social – que toca o programa Bolsa Família –, Saúde, Educação, Defesa, Trabalho, Fazenda, Transportes, Cidades e Justiça. Juntos, eles tomam conta de R$ 1,8 trilhão.

Fora dos maiores orçamentos está o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional. A pasta coordena, por exemplo, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), órgãos com orçamento bilionário, cobiçados pelos parlamentares e com histórico de denúncias de corrupção.

O PT foi o primeiro partido a tentar implantar um “shadow cabinet” no Brasil. Em 1990, a sigla formou um “governo paralelo”, grupo para analisar e questionar as ações da então administração de Fernando Collor.

“O ministro da Justiça era o José Dirceu, o ministro de Minas e Energia era o (Luiz) Pinguelli (Rosa). Eram figuras proeminentes do PT que faziam o ‘shadow cabinet’ do governo Collor”, disse o cientista político Márcio Coimbra, professor da Faculdade Presbiteriana Mackenzie, em Brasília. “Não funcionou muito bem, não tinha muita visibilidade. Mas a ideia era muito boa, porque você tinha o Collor e o Lula como dois grandes polos da eleição de 89.”

Coimbra destacou que, no sistema parlamentarista, há um encontro por semana no qual governo e “shadow cabinet” discutem as políticas públicas estabelecidas pelos ministérios. No seu diagnóstico, o fato de não haver uma sessão de controle semelhante no Congresso brasileiro fez a iniciativa do PT se perder.

“Num governo parlamentarista, o governo inteiro participa de uma sessão de controle, na qual ele fica no Parlamento respondendo perguntas da oposição e de outros parlamentares”, afirmou o cientista político.

Na avaliação de Coimbra, a iniciativa “funciona muito bem” no sistema parlamentarista e ajuda a levar o debate “mais para perto do povo”. No exterior, os congressistas e seus assessores participam desses gabinetes.

“É o momento de fazer um controle direto do governo. É uma necessidade que o governo tem de prestar contas semanalmente do que está fazendo e é uma forma que a oposição tem de mostrar sua cara e gerar debates profundos sobre políticas públicas”, observou Coimbra.

Para o cientista político Eduardo Grin, professor do Departamento de Administração Pública da FGV-SP, as regras constitucionais do sistema parlamentarista contribuem para o funcionamento do “shadow cabinet”. Ao contrário do presidencialismo, o parlamentarismo não tem data fixa para as eleições e tem menos partidos.

“Pode ser que amanhã seja chamada uma eleição (no parlamentarismo) e aquele que era partido de eleição virou governo. Portanto, ele tem que estar atualizado com as políticas”, argumentou Grin. “É diferente do nosso caso, em que a gente tem eleição a cada quatro anos.”

Estadão