MDB quer faturar Minha Casa, Minha Vida

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Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Em meio ao relançamento do programa Minha Casa, Minha Vida, anunciado nesta terça-feira pelo presidente Lula (PT), uma queda de braço no MDB tem adiado, desde o fim de janeiro, a nomeação do titular da secretaria responsável por tocar as ações. Durante viagem à Bahia, Lula participou da cerimônia que oficializou o novo modelo do programa, uma das principais vitrines do governo federal, com ampliação da faixa de renda para moradias subsidiadas e previsão de contratar 2 milhões de residências até 2026. Ao lado do ministro das Cidades, Jader Barbalho Filho (MDB), Lula anunciou a entrega de 2,7 mil casas em seis estados, ainda sem a definição do secretário nacional de Habitação, órgão vinculado ao ministério e ao qual o Minha Casa, Minha Vida ficará diretamente subordinado.

No último dia 20, o Diário Oficial da União trouxe a nomeação de Hailton Madureira de Almeida como secretário de Habitação, mas o governo recuou e tornou a portaria sem efeito apenas três dias depois. Na ocasião, a alegação foi de problemas burocráticos, já a portaria associava a secretaria ao Ministério do Desenvolvimento Regional, extinto na reforma ministerial de Lula, e não trazia consigo a cessão de Hailton, que é servidor de carreira do Tesouro Nacional.

A demora de quase um mês para regularizar a situação, contudo, ocorre devido a uma disputa envolvendo as bancadas do MDB no Congresso.

Líder do partido na Câmara, o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL) deseja emplacar um aliado, o ex-deputado Maurício Quintella Lessa, na secretaria. Hailton, por sua vez, é um nome próximo a ex-senadores do MDB, especialmente de Romero Jucá (MDB-RR), que o levou para o segundo escalão do Ministério do Planejamento no governo Temer, em 2016. Ele também atuou por um breve período no Ministério de Minas e Energia, no governo Dilma, sob a gestão de outro ex-senador emedebista, Edison Lobão (MDB-MA).

A cessão de Hailton para assumir a secretaria de Habitação foi formalizada pelo Ministério da Fazenda ainda no início de fevereiro, conforme portaria assinada pelo ministro Fernando Haddad e publicada no Diário Oficial da União no último dia 2. Desde então, porém, a nomeação se arrasta na Casa Civil.

Nos bastidores, integrantes da bancada do MDB na Câmara alegam que há um acordo para que três secretarias do segundo escalão do Ministério das Cidades — Habitação, Mobilidade Urbana e Saneamento Ambiental — sejam ocupadas por indicações de deputados emedebistas. Outra secretaria, a de Políticas para os Territórios Periféricos, seguiu um acordo com a bancada do PSOL na Câmara; o escolhido foi Guilherme Simões Pereira, aliado do deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP), e já nomeado no dia 24 de janeiro.

— Não posso antecipar quem será o escolhido. Isso é uma decisão do governo, passando por um entendimento entre bancada do MDB na Câmara e o ministro — afirmou Isnaldo ao GLOBO.

A escolha original de Hailton não foi bem recebida por membros da bancada emedebista na Câmara, que enxergam a bancada do Senado privilegiada na formação dos ministérios de Lula. Na pasta das Cidades, a nomeação de Jader Filho é creditada à influência de seu irmão, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), e de seu pai, o senador Jader Barbalho (MDB-PA). A bancada do MDB apoiava outro nome, o do deputado federal José Priante (MDB-PA).

Jader, Jucá e Lobão figuraram entre as principais lideranças do MDB em estados das regiões Norte e Nordeste, tradicionalmente mais alinhados aos governos do PT. Nas eleições de 2022, contudo, Jucá buscou uma aliança com o então presidente Jair Bolsonaro. O trio é alvo de uma denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2017 contra o chamado “quadrilhão do MDB no Senado”, que ainda não foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Outro alvo do inquérito, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) é um dos aliados mais próximos de Lula no MDB e emplacou o filho, o também senador Renan Filho, no Ministério dos Transportes.

Quintella, por sua vez, foi ministro dos Transportes no governo Temer, época em que era filiado ao PL. Ele é réu por peculato, na Justiça Federal de Alagoas, devido a um inquérito aberto em 2009, quando atuava na secretaria de Educação do estado. Após deixar o PL por discordar da filiação de Bolsonaro em 2021, Quintella ingressou no MDB em Alagoas, ficando como primeiro suplente na Câmara nas eleições de 2022, e fez campanha para Lula no estado.

O impasse na secretaria de Habitação vem interferindo no preenchimento das outras secretarias destinadas ao MDB. Para evitar que Quintella seja “abandonado”, integrantes da bancada defendem que as três secretarias sejam nomeadas em conjunto, seguindo os nomes referendados por Isnaldo como líder do partido na Câmara. O pleito já chegou ao secretário-executivo do Ministério das Cidades, Hildo Rocha, ex-deputado do MDB no Maranhão e braço-direito de Jader Filho na pasta.

A tendência é que a secretaria de Saneamento seja destinada ao ex-deputado Leonardo Picciani (MDB-RJ), enquanto a secretaria de Mobilidade Urbana caberá ao MDB de São Paulo, numa indicação que passará pelo presidente nacional do partido, deputado Baleia Rossi (MDB-SP). Procurado, Baleia não quis se manifestar. Picciani não retornou os contatos da reportagem.

Ao lado da secretaria de Habitação que atua na formulação e acompanhamento das ações do Minha Casa, Minha Vida, as outras duas secretarias englobam as principais tarefas no guarda-chuva do Ministério das Cidades. A secretaria de Mobilidade Urbana tem, entre suas atribuições, a articulação de subsídios à tarifa do transporte coletivo, bandeira levantada por prefeitos de grandes cidades brasileiras, como Ricardo Nunes (MDB), de São Paulo. Já a secretaria de Saneamento deverá herdar atribuições da Funasa, estatal cobiçada pelo Centrão que foi extinta via medida provisória no governo Lula, e ficará responsável por acompanhar a implementação do novo Marco Legal do Saneamento.

O Globo