Mourão gastou R$ 4 milhões em luxos

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Foto: Wilton Junior/Estadão

O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) gastou R$ 3,8 milhões com o cartão corporativo da Vice-Presidência da República ao longo dos quatro anos de mandato em que esteve ao lado de Jair Bolsonaro (PL). O general da reserva superou as despesas feitas por Michel Temer (MDB) no mesmo cargo. Somente em 2022, ano em que disputou e venceu a disputa para o Senado, os gastos de Mourão somaram R$ 1,5 milhão.

Os dados disponíveis nos registros do governo federal mostram despesas da Vice-Presidência entre 2013 e 2022. Mourão ocupou o posto de 2019 a 2022; Michel Temer de 2013 a 2016. Em valores corrigidos pela inflação, o vice de Bolsonaro gastou ao todo R$ 4.195.038,46, enquanto o vice de Dilma Rousseff, R$ 3.465.743,62. A diferença de despesas é de R$ 729.294,84.

Temer nunca ultrapassou a cifra de R$ 1 milhão em despesas por ano. Ele ficou perto disso, em 2013 e 2016, quando gastou respectivamente R$ 901 mil e R$ 915 mil, em valores atualizados. Já Mourão superou a marca nos últimos dois anos no cargo.

As principais despesas do ex-vice de Bolsonaro estão relacionadas a alimentação, hospedagens e viagens. Repetem-se nos gastos do general da reserva compras em supermercados – alguns deles gourmets –, peixarias, hotéis, empresas de fornecimento de alimentação a bordo e até clínicas e hospitais, no Brasil e no exterior.

Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e consultados pelo Estadão em parceria com a Fiquem Sabendo, agência de dados especializada no acesso a informações públicas. As informações foram publicizadas com o fim do mandato.

Seis empresas receberam mais de R$ 100 mil cada do vice-presidente ao longo dos quatro anos de governo. São elas: o Mercadinho La Palma (R$ 311.498,83), o Pão de Açúcar (R$ 282.421,49), a Super Adega (R$ 264.391,34), o Big Box (R$ 241.197,16), a Atlântica Hotéis (R$ 204.080,15) e a International Meal Company (R$ 102.071,53), empresa que fornece comissaria aérea.

Mourão também recorria à Ueda Pescados e ao La Palma, empresas que costumavam abastecer o clã Bolsonaro no Palácio da Alvorada. O La Palma, que vende produtos para a alta gastronomia, lidera as despesas do ex-vice-presidente. A peixaria levou R$ 89 mil.

O cartão corporativo do vice pagou ainda despesas ordinárias. Como R$ 205 na Açaí Capital, loja especializada na venda do produto rico em antioxidantes. Também há gastos de R$ 551 na sorveteria Brazilian Ice Cream e de R$ 1,3 mil na padaria francesa La Boutique. Todos em 2019. Além de R$ 9,3 mil na doceria Sweet Cake.

Ciclista amador, Mourão gastou R$ 518 em lojas especializadas em manutenção e venda de bicicletas em Brasília. Ele costumava pedalar nos fins de semana no entorno do Palácio do Jaburu – residência oficial da Vice-Presidência –, acompanhado de guarda-costas.

Durante viagens internacionais, as maiores despesas eram com hotéis e alimentação aérea. Mas os documentos também registram idas a restaurantes. Em Lisboa, por exemplo, a conta no tradicional Gambrinus foi de R$ 1.043 .

Como vice-presidente, Mourão tinha a prerrogativa de usar o avião presidencial, um Embraer 190 – VC-2, em todos os deslocamentos, para fins públicos ou privados, mesmo agendas de campanha. Essa pode ser uma explicação para as despesas elevadas.

Ao contrário do antecessor, Michel Temer, que reclamava ser “decorativo”, Mourão desempenhou papel diplomático durante o governo Bolsonaro. Cumpriu agendas no exterior e no Brasil, viajou a posses presidenciais e chefiou o Conselho da Amazônia. Em mais de uma ocasião, organizou viagens com diplomatas estrangeiros à floresta.

Os extratos obtidos pela reportagem mostram uma ampla gama de produtos e serviços adquiridos por Mourão com o cartão corporativo da Vice-Presidência da República. Além de alimentos, diárias de hotéis, remédios e atendimentos médicos, odontológicos e laboratoriais, o general da reserva usou o cartão para locação de carros, compra de sementes, mudas e insumos, material esportivo, lojas de móveis e manutenção do lar.

O uso do cartão corporativo para pagar despesas pessoais é autorizado pelo governo. Como revelou o Estadão, Bolsonaro comprou de medicamentos a material para pesca. O ex-presidente disse várias vezes que não usava a forma de pagamento.

Apesar das diretrizes da Controladoria-Geral da União (CGU) para que os órgãos do governo facilitem o acesso a informações públicas, na prática a ausência de normativas específicas permite que setores da máquina pública sigam impondo regras não previstas, que criam obstáculos à consulta a notas fiscais.

Um relatório enviado à reportagem pela Vice-Presidência da República indica que existem 234 processos arquivados em meios físicos, com 3.455 notas fiscais. A reportagem pediu para consultar o acervo presencialmente, uma opção prevista na LAI, mas o governo disse que só poderia dar acesso a cinco arquivos por vez. Dessa forma, a consulta a toda a documentação exigiria 46 visitas ao arquivo.

Procurado, Mourão afirmou que o cartão corporativo não ficava com ele. “Existiam agentes que recebiam suprimentos de fundos, seja para as despesas do Palácio Jaburu, seja para as viagens”, disse à reportagem.

Estadão