Receita ia leiloar contrabando de Bolsonaro

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Foto: DIV

As joias de diamantes do ex-presidente Jair Bolsonaro e da primeira-dama Michelle, apreendidas no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, estavam prestes a ser incluídas em um leilão da Receita Federal após a tentativa frustrada do ex-presidente de recuperar os itens.

O Estadão apurou que o colar, os brincos, o anel e o relógio da marca Chopard, no valor de 3 milhões de euros, o equivalente a R$ 16,5 milhões, depois de passarem mais de um ano em poder da alfândega, seriam oferecidos em leilão de itens apreendidos pela Receita por sonegação de impostos. Essa decisão, porém, acaba de ser suspensa, porque as joias passaram a ser enquadradas como prova de crime.

 

Como revelado pelo Estadão em reportagem nesta sexta-feira, 3, o governo Jair Bolsonaro tentou trazer ilegalmente para o País um conjunto equivalente a R$ 16,5 milhões. As joias eram um presente do regime da Arábia Saudita para o ex-presidente e a então primeira-dama e foram apreendidas no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. As joias estavam na mochila de um militar, assessor do então ministro Bento Albuquerque, das Minas e Energia, Marcos André dos Santos Soeiro, que estivera no Oriente Médio na comitiva do ministro, em 26 outubro de 2021. Albuquerque representava Bolsonaro na reunião de cúpula “Iniciativa Verde do Oriente Médio”. As peças foram descobertas pela alfândega quando ele tentou entrar no Brasil sem declará-las, contrariando a legislação.

O valor das joias, de 3 milhões de euros, já tinha sido estimado pela equipe de auditores e iria embasar a oferta no leilão. A avaliação revisava o preço inicialmente previsto pelos fiscais – que, no ato de apreensão das joias, chegaram a estimar, de imediato, que os diamantes valeriam cerca de US$ 1 milhão. A marca Chopard é uma das mais famosas e caras do mundo. De origem suíça, foi fundada em 1860 e costuma ser utilizada nos tapetes vermelhos de Hollywood.

Depois que os itens foram apreendidos, o governo Bolsonaro tentou, por diversos meios, reaver as joias, sem sucesso. A reportagem apurou que houve quatro tentativas frustradas do ex-presidente de reaver as pedras preciosas, envolvendo seu próprio gabinete, três ministérios (Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores) e militares. A última ocorreu quando faltavam apenas três dias para o presidente deixar o mandato, em 29 de dezembro.

A única forma, porém, de liberar as joias, seria o pagamento do imposto de importação, equivalente a 50% do preço das joias, além do pagamento de uma multa de 25%, o que custaria R$ 12,3 milhões. A reportagem apurou que, devido ao valor milionário das joias, havia muita apreensão entre os servidores da própria Receita Federal, por questões de segurança atreladas à retenção dos itens, que ficaram armazenados no cofre da alfândega, em São Paulo.

O Estadão apurou ainda que, como nenhuma tentativa de retirar as joias teve êxito, no dia 23 de fevereiro do ano passado, a Receita Federal emitiu um auto de infração e declarou a “pena de perdimento aos bens por abandono”. Devido à falta de manifestação, porém, o “abandono” foi sacramentado em 25 de julho do ano passado.

Na prática, no entanto, as joias estavam longe de serem abandonadas por Bolsonaro. Como revelou a reportagem, no dia 28 de dezembro do ano passado, três dias antes de deixar o Palácio do Planalto, o gabinete pessoal do presidente da República emitiu um ofício à Receita para pedir as pedras preciosas, mas não conseguiu.

No dia 29 de dezembro, Bolsonaro despachou ainda um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) de Brasília para Guarulhos na intenção de, no fechar das cortinas de seu governo, resgatar o presente das Arábias, mas o servidor da Receita, firme em sua missão institucional, não cedeu aos apelos do encarregado.

Portal da Transparência mostra que sargento Jairo Vieira da Silva foi a Guarulhos por ordens do presidente Jair Bolsonaro

O Estadão localizou a solicitação à FAB para levar até o cofre onde estavam as joias o chefe da Ajudância de Ordens do Presidente da República, primeiro-sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva. O documento dizia que a viagem de Silva era “para atender a demandas do Senhor Presidente da República naquela cidade”, com retorno “em voo comercial no trecho Guarulhos para Brasília”.

Para a utilização de avião da FAB, há uma ordem de prioridade estabelecida, conforme decreto presidencial atualizado em 2020 pelo próprio Bolsonaro. Primeiro, em casos de emergências médicas. Segundo, quando há razões de segurança. Depois, viagens a serviço.

O recebimento de presentes pelo presidente da República não é ilegal. Em julgamento realizado em 2016, contudo, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou à Secretaria de Administração da Presidência da República que todos os presentes recebidos por presidentes devem ser restituídos ao patrimônio da União. Segundo a Corte de Contas, os ex-presidentes só podem ficar com aqueles de caráter personalíssimo ou de uso pessoal como roupas e perfumes.

O Globo