Vice-presidente do PT irrita Lula cada vez mais

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Foto: Reprodução

Berço político do clã Bolsonaro, o Rio de Janeiro dava sinais de uma guinada à direita no último pleito presidencial quando o vice-presidente do PT, Washington Quaquá, foi convocado pelos caciques da sigla para pôr em prática sua mais notória qualidade — tecer costuras nos bastidores, com um pragmatismo que extrapola matizes ideológicos, para tentar reverter o jogo. E assim ele aproximou Lula de Waguinho, o controverso prefeito de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, uma operação que acabaria mais tarde alçando à Esplanada dos Ministérios a mulher dele, a agora titular do Turismo, Daniela Carneiro, que já se enredou em escândalo que expõe seus elos com integrantes da milícia local. Em outro lance, Quaquá lançou-se numa cruzada em prol de uma aliança com o então candidato à reeleição ao governo do Rio Cláudio Castro (PL), que navegava em águas bolsonaristas, quando o postulante de sua legenda ao cargo era Marcelo Freixo (PSB).

Com a base bem fincada no município de Maricá, do qual foi prefeito por quase uma década, o hoje deputado federal segue como peça-chave para mover as engrenagens petistas que trabalham a toda para conquistar apoios na banda da oposição. Mas, mestre das polêmicas, Quaquá está mais uma vez no centro delas — a ponto de uma ala mais à esquerda do PT querer encampar um processo de ética interno mirando sua expulsão.

Seu mais recente e espinhoso imbróglio envolve Eduardo Pazuello (PL-­RJ), ex-ministro de Bolsonaro e atual deputado federal, com quem ele se encontrou em uma reunião em Brasília onde estava o novo presidente da Petrobras, Jean Paul Prates. Na ocasião, Quaquá achou por bem esbanjar cordialidade com o político de pendor negacionista que comandou a pasta da Saúde em plena pandemia, deixou-se fotografar sorridente a seu lado e foi além: postou a imagem no Instagram acrescida da frase “A tarefa do governo Lula é unir, pacificar e reconstruir o nosso país”. Não demorou, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, estrilou: “Tudo tem limite”, disparou sob os holofotes das redes, enquanto Lula externava contrariedade mais discretamente, a seu núcleo próximo. A partir daí, começou a circular um abaixo-assinado, capitaneado por um grupo de militantes, defendendo a instauração do processo para a exclusão do companheiro das hostes petistas. Pelo Whats­App, Quaquá reagiu com virulência e postou vídeos disparando contra os opositores adjetivos como “imbecil” e “jumento”, para citar os mais gentis.

Outro episódio que enfureceu uma banda petista foi o jantar de 8 de fevereiro em que ele, na condição de coordenador da bancada fluminense em Brasília, confraternizou com o deputado Otoni de Paula (MDB-RJ), um dos expoentes evangélicos do bolsonarismo. Fuzilado por críticas vindas de todos os lados, Quaquá atiça ainda mais as labaredas: “A esquerda não tem força sozinha, mas se deixa levar por gente que ficou na Rússia de 1917. Precisa de psicanálise”, disse a VEJA. Durante o Carnaval, a temperatura das hostilidades se elevou ao ritmo de samba. Ele montou no Sambódromo carioca um camarote de três andares, com capacidade para receber até 1 000 foliões. Organizado e bancado pela confecção de roupa Favela e Periferia, da qual é dono, o espaço foi projetado para abrigar a habitual romaria de políticos na Marquês de Sapucaí. O barraco que antecedeu a festa, porém, jogou água no uísque Royal Salute (1 200 reais a garrafa) servido aos convidados. Incentivada pelo namorado, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), a dar um pulinho no QG momesco de Quaquá, Gleisi foi taxativa: “Não subo aí de jeito nenhum”, falou, ao passar pela entrada. No dia seguinte, cedeu e selaram a paz, ao menos provisória, depois de um papo de quinze minutos. “Não há crise nenhuma”, amenizou Quaquá.

Apesar de certos narizes petistas ainda torcerem diante dos excessos fisiológicos do vice-presidente da sigla — a quem alguns classificam como “o Centrão do partido” —, ninguém acredita que o processo para afastá-lo prospere. Bem conectado, não são poucos os que lhe devem favores. Numa de suas passagens pela prefeitura de Maricá, cidade cujos cofres amealharam bilhões com os royalties do pré-sal, o PT nacional sangrava e perdia capital político, minguado pelo impeachment de Dilma Rousseff e, depois, pela prisão de Lula. O bom Quaquá, então, deu guarida a muitos companheiros que se viram à deriva, sem cargos nem mandatos. “Ele abrigou umas 147 pessoas na prefeitura”, diz um aliado próximo. Um dos quadros a entrar na conta é Lurian Lula da Silva, primeira filha do presidente, que chegou a se mudar para Maricá e a assumir por lá o diretório municipal do PT. Por dois anos, ela atuou como assessora de Rosângela Oliveira Zeidan (PT), deputada estadual pelo Rio e então mulher do próprio Quaquá.

Em uma recente articulação, ele trabalhou para emplacar o filho, Diego Zeidan, vice-prefeito de Maricá, no comando da secretaria municipal de Economia Solidária do Rio. Mais próximo do prefeito Eduardo Paes após as eleições, ainda está por trás de duas outras indicações na seara do alcaide — as secretarias de Desenvolvimento Social e de Meio Ambiente. Filiado ao PT desde os 14 anos, ele presta homenagem ao alto-­comis­sário José Dirceu, a quem observou em ação e a quem elogia: “A geração de Dirceu ensinou o PT a fazer alianças”. Colegas da Universidade Federal Fluminense (UFF), onde Quaquá estudou ciências sociais e presidiu o diretório acadêmico, contam que, lá atrás, ele já se envolvia em altas negociações políticas no câmpus. “Ele sempre falou com gente de todas as correntes de pensamento, sem se preocupar com a coerência”, lembra um ex-colega de turma. Sem esconder suas ambições, Quaquá conta que vai se candidatar à sucessão de Gleisi na presidência do PT, em 2025. E a corrida, como se vê, já começou.

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