Bolsonaro será condenado por genocídio de yanomamis

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Foto: Marco Bello/Reuters

As denúncias contra o ex-presidente Jair Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional (TPI) ganharam a adesão de uma parte importante de investigadores da instituição, dispostos a fazer avançar o processo. Informações dos bastidores da Corte recebidas pelo UOL revelam que, dentro da procuradoria de Haia, uma parcela da equipe espera tomar uma decisão positiva sobre os casos contra Bolsonaro. Pedindo anonimato diante da sensibilidade do caso, interlocutores da Corte deixaram claro aos autores das denúncias que o caso está mobilizando os funcionários da procuradoria do tribunal, que existe “interesse” e que há uma perspectiva de que não será simplesmente arquivado.

Desde 2020, Bolsonaro é alvo de diferentes denúncias no TPI por crimes contra a humanidade e genocídio, seja no contexto do desmonte das políticas de proteção aos povos indígenas, destruição ambiental ou por conta de sua gestão da pandemia diante de minorias. Por enquanto, a procuradoria da Corte ainda não tomou uma decisão se abre oficialmente um inquérito. Mas está avaliando as informações recebidas. Por ano, Haia recebe cerca de 700 queixas de todo o mundo, sobre dezenas de casos. Fontes na Corte confirmaram à coluna que cinco casos referentes ao presidente brasileiro estão em avaliação preliminar de jurisdição. Um deles foi descartado. Mas uma das tendências é de que a procuradoria opte por unificar todas as informações submetidas por diferentes grupos brasileiros e estrangeiros para avaliar se existe uma base razoável para abrir uma investigação.

Em maio, o dossiê de Bolsonaro ainda ganhará um capítulo extra. O UOL obteve a confirmação de que as informações sobre a crise do povo yanomami devem chegar à corte em Haia. Os dados vão fazer parte da denúncia que foi apresentada ainda em 2021 pela Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) contra o ex-presidente brasileiro por crime de genocídio e crimes contra a humanidade. De fato, no final de 2021, os grupos decidiram ampliar a denúncia, incluindo o avanço do desmatamento e a invasão de terras indígenas por garimpeiros. Agora, as novas evidências vão ser anexadas ao processo, com informes sobre a situação descoberta. Um dos pontos sendo avaliado pela Corte é a admissibilidade. Pelas regras do TPI, um processo apenas deve ser aberto quando o sistema Judicial doméstico do país está incapacitado para lidar com a denúncia. Para observadores internacionais, as imagens de crianças do povo yanomami em estado avançado de desnutrição, os dados de mais de 570 mortes em quatro anos e a explosão da malária podem ampliar a pressão para que o Tribunal dê seguimento ao processo. Ainda que o novo governo brasileiro tenha sinalizado sua intenção de mudar a forma de lidar com a situação e que contribuiria para investigações, há um entendimento de que apenas a abertura formal de um inquérito pela procuradoria de Haia poderia dar um ímpeto extra ao processo no Brasil, mesmo que não resulte em uma denúncia final.

Entre as medidas adotadas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, uma delas foi o veto ao embaixador que o ex-presidente Jair Bolsonaro esperava indicar para ocupar o cargo em Haia, tradicionalmente uma embaixada sem grande destaque para a estratégia global do Itamaraty. O gesto foi interpretado como uma indicação de que o processo contra Bolsonaro terá importância pelo novo governo e que quer alguém de confiança. No governo Bolsonaro, embaixadores próximos à gestão do ex-presidente chegaram a fazer circular a narrativa de que os casos em Haia tinham sido arquivados. Não é a percepção na corte que, quando a informação foi incompleta em uma das denúncias, informou aos autores da queixa a fragilidade do caso.

Ainda assim, outro obstáculo é a definição do crime que seria imputado sobre Bolsonaro. Para que um ato seja considerado como genocídio, ele precisa atender aos seguintes critérios: O autor infligiu certas condições de vida a uma ou mais pessoas; Essa pessoa ou essas pessoas pertencia(m) ou pertence(m) a um grupo nacional, étnico, racial ou religioso particular; O autor agiu com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso enquanto tal; As condições de vida — que podem incluir, mas não se restringem a, privação deliberada de recursos indispensáveis à sobrevivência, tais como água, comida e serviços médicos — foram afetadas calculadamente para levar o grupo à destruição; Os atos se deram no contexto de um padrão de conduta semelhante dirigida contra o grupo ou a conduta era tal que podia causar por si mesma a destruição.

No documento original da denúncia de quase 150 páginas, a Apib diz que o governo Bolsonaro agiu de forma deliberada para “exterminar” etnias e povos e estabelecer um Brasil sem indígenas. “Está em curso uma política de genocídio dos povos indígenas no Brasil, combinada com a prática de diferentes crimes contra a humanidade. São crimes que estão, neste momento, sendo praticados”, alertava o documento, naquele momento. “A política anti-indígena em curso no Brasil hoje é dolosa. São atos articulados, praticados de modo consistente durante os últimos dois anos, orientados pelo claro propósito da produção de uma nação brasileira sem indígenas, a ser atingida com a destruição desses povos, seja pela morte das pessoas por doença ou por homicídio, seja pela aniquilação de sua cultura, resultante de um processo de assimilação”, explicava. Bolsonaro também é acusado de “extermínio e a perseguição a povos indígenas através de um ataque generalizado e sistemático contra os povos indígenas, bem como a imposição de outros atos inumanos, tipificados respectivamente como genocídio e crimes contra a humanidade pelo Estatuto de Roma”.

Uol