Boulos desmonta dúvidas sobre apoio do PT
Foto: Fábio Vieira/Metrópoles
Em entrevista à coluna, o deputado federal Guilherme Boulos (PSol-SP) garante que o vice em sua chapa à Prefeitura de São Paulo será indicado pelo PT. Nesta semana, um vídeo de conversa entre o deputado e Datena ganhou repercussão. Nela, Datena se ofereceu para compor chapa com o psolista.
“Meu vice será do PT. Isso já está decidido”, disse Boulos. O deputado também comentou a possibilidade de enfrentar, nas eleições de 2024, Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Boulos vê como provável um cenário de polarização, em SP, entre os nomes apoiados por Lula e Bolsonaro.
“Se for o Eduardo Bolsonaro, terei o maior prazer de enfrentá-lo. Já o enfrentei na disputa para deputado federal e fui mais votado que ele”, diz.
A seguir, a íntegra da entrevista.
Nesta semana, vazou um vídeo de uma conversa entre o senhor e Datena. O senhor pensa em ter como vice um político de centro-direita ou de direita na sua chapa para a Prefeitura de São Paulo?
Meu vice será do PT. Isso é parte do acordo firmado. Eu disse isso ao Datena em nossa conversa.
O senhor terá o apoio do PT como partido, mas foi avisado de que terá de conquistar a militância. Como será esse processo?
Eu tenho muita confiança de que nós vamos caminhar juntos numa frente progressista em São Paulo, com o PT, com o PCdoB, com o PV, com a Rede, que é federada com o PSOL. E eventualmente com o PDT, com o PSB, que hoje tem uma candidatura própria que eu respeito, mas acho que está no campo.
Eventualmente com Solidariedade, com partidos do campo progressista que estiveram, parte deles, na própria frente para eleger o presidente Lula, porque é essencial apresentar um projeto pra São Paulo.
São Paulo hoje é triste de ver. Eu que nasci, fui criado em São Paulo, vejo tudo abandonado. É uma cidade que tem R$ 34 bilhões em caixa, maior orçamento da sua história e a maior população de rua da sua história. Uma zeladoria que é uma loucura. É buraco, semáforo que não funciona, matagal por todo lado, é lixo por todo lado na cidade.
São Paulo sempre muito conectada a visões de vanguarda. Hoje ,você vê que Barcelona está com todo um debate sobre centro urbano. Paris está com debate de redução de distâncias. Nova York está com um debate de combate à segregação urbana, com edifícios mistos. Santiago está com um debate de integração urbana que absolutamente inovador. E São Paulo, qual é o projeto que hoje tem em São Paulo?
Como classifica a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB)?
Olha, 61% dos moradores de São Paulo não sabem o nome do prefeito. Ou seja, São Paulo precisa de um novo projeto.
O senhor prevê uma eleição polarizada entre os candidatos apoiados por Lula e Bolsonaro?
Eu espero no ano que vem poder discutir a cidade de São Paulo, os temas da cidade de São Paulo, mas é natural (a polarização). São Paulo não é uma ilha. É inevitável que a polarização nacional entre bolsonarismo e esquerda também se reflita na eleição municipal.
Eu acredito que o bolsonarismo vai ter um candidato em São Paulo. Se for o Eduardo Bolsonaro, terei o maior prazer de enfrentá-lo. Já o enfrentei na disputa para deputado federal e fui mais votado que ele. Espero enfrentá-lo ele ou qualquer outro candidato bolsonarista, eventualmente o atual prefeito.
É natural que esses debates estejam conectados, mas eu espero não ficar num debate ideológico vazio, de estereótipos. A gente sabe as fake news. Vão dizer: “Ah, o Boulos vai invadir sua casa, é radical, é extremista”. Às vezes, eu vejo o atual prefeito falando ‘é radical, é extremista’, mas eu acho que esses slogans não colam mais.
As pessoas ficaram um pouco calejadas e ninguém quer reduzir a eleição a meme. Eu quero discutir a cidade de São Paulo.
O governador Tarcísio parece pragmático na relação com o Governo Federal. O senhor acredita que, se eleito, vai conseguir também trabalhar com ele?
Se, sendo candidato ano que vem, eu for eleito prefeito de São Paulo, naturalmente eu terei que trabalhar com o presidente Lula, com o governador do estado, com todas as instâncias e forças institucionais da cidade. Isso não quer dizer que não existam diferenças políticas.
Certamente existem embates também nessas posições políticas, tanto no processo eleitoral como depois. Não sejamos ingênuos. Mas quando você é eleito… O presidente Lula foi eleito com 51% dos votos, mas, uma vez que ele é empossado, não representa mais 51% da população, representa toda a população brasileira e portanto precisa se colocar como um estadista, como presidente do Brasil.
Então é lógico que, se eu tiver oportunidade de ser eleito prefeito de São Paulo, vou ter que dialogar com com todas as instituições.
O prefeito Ricardo Nunes sugeriu que, no seu programa de governo, o senhor colocará que lugares pretende invadir…
Eu fui adversário, no segundo turno de 2020, do Bruno Covas. E foi uma das campanhas mais civilizadas e cordiais no último período em São Paulo. Ele ganhou a eleição, eu reconheci a vitória. Eu não ataquei, ele não me atacou.
Eu gostaria de fazer um um debate nesses termos no ano que vem. Parece que o atual prefeito não se coloca nesse nível. Eu acho que ele tem um problema, que é disputar a hegemonia da direita. Ele quer ser o candidato da direita, do Bolsonaro.
Ele fica querendo polarizar comigo, me xingar todo dia, me atacar todo dia. E não vou cair nesse jogo. Ele parece que passa dia e noite se preocupando com adversários eleitorais. Mostra, inclusive, o porquê que a gestão é tão mal avaliada.
Sua campanha vai ter mais estrutura no ano que vem porque terá o apoio do PT. O que isso representa?
Eu espero que isso possa tornar o jogo menos desigual. Em 2020, a minha campanha, somando fundo eleitoral, doações, teve três ou quatro vezes menos recursos que a campanha do Bruno Covas.
Partindo para o cenário nacional, Lula passará por ameaças de impeachment ao longo dos próximos anos devido a um Congresso majoritariamente conservador?
Não vejo risco nenhum nenhum. Primeiro porque eu acho que hoje muita gente consegue enxergar o caos institucional que o impeachment, o golpe parlamentar contra a Dilma, abriu no país.
Depois disso o país entrou numa anomia constitucional. Ninguém quer repetir isso. acho que até o PSDB e o PMDB hoje se arrependem. O Aécio Neves, ao contestar as eleições de 2014, criou a semente da da força bolsonarista que engoliu a centro-direita, a direita tradicional brasileira. Até hoje não se recuperaram. Então, acho que ninguém quer repetir isso.
E, segundo: o presidente Lula tem uma história de trato político com o Congresso, com adversários que é conhecida e comprovada. Eu não acho que haja qualquer risco. Às vezes se faz uma cobrança com três meses de governo que parece que foram três anos. Está no começo.
Gente da base do governo acha que Lula tenha erra ao dar superpoderes ao presidente da Câmara e do Senado. Na questão das emendas, por exemplo.
O governo apoiou o a reeleição do Lira. Não foi o caso do PSOL, meu partido, mas o governo apoiou. E nós temos que ter uma noção de qual é a correlação de forças dentro da Câmara. Os partidos do campo em torno do Lira, do dito Centrão, têm maioria na Casa.
Então, o diálogo com o presidente da Câmara e com o campo político que o presidente da Câmara representa neste momento é necessário para o governo construir a sua governabilidade. Agora o que não se pode é manter um método de governabilidade que o Bolsonaro inaugurou. As emendas de relator, orçamento secreto, que o Supremo já colocou um limite.
O que se fala é que a nova costura beneficia justamente a cúpula da Câmara e do Senado na questão das emendas.
É, eu acho que não, mas essa decisão não foi nem do presidente Lula, foi do Supremo. O Supremo colocou fim no orçamento secreto. Então isso está dado. A gestão das emendas hoje em definição, de liberação, se dá na Secretaria de Relações Institucionais, a SRI, com o ministro Padilha.
Agora, é evidente que há um diálogo em nome da governabilidade, da construção de maioria para as pautas que o governo vai aprovar aqui com o Lira e com os partidos que o Lira é o principal representante.
Quando o senhor acha que essa relação do governo com o Congresso vai destravar e as matérias vão começar mesmo a ser votadas?
Eu acho que teve uma trava que não dependeu do governo. Teve uma trava que foi a disputa entre Câmara e Senado, em relação ao rito das Medidas Provisórias. Acho que isso travou pautas. Era para o Congresso estar discutindo já o Minha Casa Minha Vida, o novo Bolsa Família, a alteração da Esplanada.
E o que que falta pro governo construir essa governabilidade?
Acho que o primeiro ponto era a questão das MPs, que tem paralisado a agenda. Ela tem sido uma disputa que tem consumido a agenda das casas. Nós precisamos resolver isso. Eu acho que estamos perto de uma solução.
Como você acha que o governo deve resolver a questão de juros com Banco Central? Isso também está atrapalhando?
Acho que a atitude do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é injustificável. É uma atitude que tem feito mal ao Brasil. Depois de todos os gestos que o governo deu em relação à estabilidade fiscal, de tentativa de diálogo, até mesmo na perspectiva de indicação das diretorias do Banco Central, Campos Neto manteve os juros mais altos do planeta. E ainda fez um comunicado, eu diria agressivo, do Copom.
Mostra que ele está levando o debate para as suas convicções políticas. Todo mundo sabe que ele foi indicado pelo Bolsonaro. Todo mundo sabe que ele era de um grupo de WhatsApp chamado Ministros de Bolsonaro até poucas semanas atrás. A gente sabe que ele votou no Bolsonaro. Agora, se ele é presidente do Banco Central, precisa ter o mínimo de isenção e de compromisso com o crescimento econômico do país.
Se houvesse uma maioria no Senado para que ele pudesse ser destituído, eu acho que esse seria um caminho razoável. Agora, não sei hoje no Senado se nós temos a maioria.
E sobre pontos de divergência entre Gleisi Hoffmann, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad? A Gleisi tem colocando posições um pouco mais radicais no campo econômico e o Haddad tem seguindo uma linha mais pragmática, em termos de agradar mais ao mercado. Quem tem razão?
É natural que, num governo de coalizão, um governo amplo, você tenha diferenças na política, na economia. Eu não sou juiz pra dizer quem é que tem razão nesse embate. Agora, eu acredito que o presidente Lula foi eleito com uma agenda de crescimento econômico, combate à fome, de superação do teto de gastos, que é uma medida draconiana e com a perspectiva de ampliação dos investimentos públicos.
E Haddad tem seguido essa linha sustentada pela campanha ou poderia melhorar em alguns aspectos?
Eu não vou fazer um julgamento do trabalho do Haddad. Acho que nós estamos com três meses de governo e o governo está começando a arrumar a casa. Pegou um país destruído, devastado. Quero apostar que numa sintonia da equipe econômica do governo com o conjunto das preocupações políticas e sociais, liderada pelo presidente Lula, para que a gente consiga este ano avançar no crescimento.
O Lula errou quando disse que que o Moro promoveu uma armação quanto a ser vítima do PCC?
Eu vi a imprensa demonizando o Lula depois dessa declaração e dizendo que o Lula está ressentido, que o Lula está rancoroso. Eu acho que as pessoas precisam ter o mínimo de capacidade de se colocar no lugar daquilo que o Lula sofreu nos últimos anos.
O Lula foi linchado publicamente numa operação articulada pelo Sergio Moro, que, depois ficou demonstrado, fez conluio com a acusação e por isso foi declarado pelo Supremo Tribunal Federal como juiz parcial. O Lula ficou preso por isso 580 dias. Foi impedido de participar de uma eleição onde ele era favorito em 2018.
Enquanto esteve preso, viu seu neto morrer, viu o seu irmão morrer e foi impedido de ir ao enterro. Aí o Lula se torna presidente da República e, depois de tudo isso, as pessoas não conseguem ter a compreensão quando ele faz um desabafo sobre Sérgio Moro? Pelo amor de Deus, né?
É lógico que ninguém defende ameaça e a gente se solidariza com qualquer um que seja ameaçado. Agora, daí a elevar o Sergio Moro como arauto da moralidade, desculpe, né? Está longe disso.
A questão central foi Lula apontar “armação”, levantando suspeita sobre o trabalho da PF e do próprio Ministéiro da Justiça.
Isso daí é compreensível com base no que ele sofreu. Não estou aqui endossando, dizendo que foi ou não foi. Agora, as pessoas precisam julgar o que o Lula passou e o mal que o Sergio Moro fez ao país. Sérgio Moro não é o mocinho da história. Longe disso.
Bolsonaro voltou ao país. Qual vai ser o efeito político?
Espero que ele comece a responder pelos crimes que cometeu. Que ele vá para o banco dos réus responder pelas joias, pelos crimes que cometeu na pandemia, por todas as atitudes, inclusive a relação dele, dos filhos, da família, com rachadinha, com milícia do Rio de Janeiro.
E pela utilização do aparato de estado da Polícia Federal para encobrir isso. Espero que agora, no Brasil e não mais como presidente, ele seja responsabilizado.
O senhor vê elementos para que Bolsonaro seja preso?
Eu acredito que há. O PSol inclusive entrou, no dia 1º de janeiro, com pedido de prisão do Bolsonaro. A responsabilização do Bolsonaro por crimes na pandemia ficou evidente durante a CPI.
Ela só não foi levada durante o governo dele ao Supremo Tribunal Federal porque o Augusto Aras sentou em cima do relatório dos pedidos da CPI. Mais do que evidente o quanto ele boicotou vacina, o quanto ele atua na desinformação com tratamentos não comprovados de cloroquina, o quanto ele desestimulou o uso de máscara de proteção, de medidas que foram tomadas por estados e municípios.
Segundo, a responsabilização dele pelo 8 de janeiro. Pelo 8 de janeiro e pelo golpismo no sentido amplo. Bolsonaro passou quatro anos atiçando o golpe.
Já se fala em CPI do do MST. Como a base do governo vai conciliar movimentos sociais com governabilidade?
Movimento social é fundamental para qualquer democracia que tenha vitalidade. Aliás, nós só temos uma democracia no Brasil hoje porque teve um movimento social chamado “Diretas Já” há quarenta anos.
Nós só temos direitos trabalhistas, de Previdência, porque teve toda uma história. A trajetória circular do movimento sindical conquistou isso. O Estatuto das Cidades, que foi uma conquista importante pra avançar nos direitos a moradia, direito a cidade, infraestrutura urbana, serviços públicos, é uma conquista do movimento de reforma urbana no Brasil.
Os assentamentos que ajudaram a democratizar, ainda insuficientemente, a terra no Brasil foram conquistas do MST e de outros movimentos do campo. Criminalizar o movimento social é sinal de uma mente retrógrada, autoritária. E se não conseguiram fazer isso durante quatro anos de governo Bolsonaro, não é agora que vão conseguir.
O governo impôs sigilo nas visitas a Lula no Palácio da Alvorada. Depois de a coluna revelar a prática, recuou…
Eu não defendo sigilo a não ser em assuntos que comprovadamente demandem isso: segurança nacional, temas de preservação de pessoas, de identidades, de testemunhas. Eu não acho que, de forma geral, o sigilo seja uma boa prática de governo.
Qual o principal foco da sua atuação parlamentar neste momento?
O Minha Casa Minha Vida. Eu tenho participado de todo o debate desde a Casa Civil e o Ministério das Cidades. A MP do Minha Casa Minha Vida.
Ajudamos a construí-la, e vamos participar do debate aqui na Câmara. Eu acho que nós temos uma oportunidade, nesse novo Minha Casa Minha Vida, de ter avanços significativos, de avançar na localização de moradias populares mais perto das regiões centrais. Foi um problema da versão anterior, que construiu, mas nos fundões, nas periferias.