Estratégia eleitoral de prefeito de SP vira piada

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Foto: Edilson Dantas

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), ainda busca uma marca para sua gestão que dê força ao plano de reeleição em 2024. Enquanto não avançaram propostas como a da tarifa zero nos ônibus municipais, lançada no fim do ano passado, o emedebista tem para apresentar ao eleitorado paulistano até aqui um programa inédito e bilionário de recapeamento de ruas e avenidas.

Pessoas próximas ao prefeito admitem que o asfaltamento tem um efeito eleitoral limitado e certamente não será a bala de prata da campanha de reeleição do emedebista. Um dos propósitos da iniciativa é ajudar a melhorar as conversas sobre o prefeito na capital, especialmente entre a classe média, motoristas de aplicativo e taxistas, que usam diariamente as ruas de São Paulo.

A lógica política por trás do programa, no entanto, é ampliar e também reforçar o arco de alianças do prefeito, já que se trata de um investimento bilionário e de alta capilaridade. Na prática, Nunes poderá atender a interesses locais de vereadores paulistanos, que, em troca de apoio político, poderão indicar ao prefeito ruas de suas regiões de influência para serem recapeadas.

O asfalto novo agrada ao eleitorado de classe média, mas é também motivo de chacota entre opositores de Nunes. O GLOBO ouviu de pessoas próximas a possíveis adversários do prefeito na eleição de 2024 que o emedebista aparenta não ter outra ideia para a cidade a não ser tapar buracos.

O atual programa de recapeamento foi lançado em junho do ano passado e pretende renovar 20 milhões de metros quadrados de asfalto na capital paulista até o fim de 2024. O investimento previsto inicialmente era de R$ 1 bilhão, o que já faria deste o maior programa de recapeamento da história da cidade, mas os valores escalaram.

O orçamento aprovado pela Câmara Municipal para 2023 autorizava R$ 944 milhões para essa finalidade, mas a prefeitura liberou créditos extras que elevaram o total disponível para R$ 2,1 bilhões. Esse valor adicional foi aprovado por um comitê formado apenas por representantes da prefeitura, sem a participação dos vereadores.

Para o marqueteiro Paulo Vasconcelos, que trabalhou na campanha de Andrea Matarazzo (PSD) na última eleição paulistana, a opção de Nunes por investir tão alto em um programa de recapeamento é mais uma indicação de que o prefeito está mirando o eleitor mais alinhado a Jair Bolsonaro. O ex-presidente disse apoiar o nome do ex-ministro e atual deputado federal Ricardo Salles (PL) para a disputa de 2024.

— Entendo que o Nunes optou pelo campo bolsonarista, até contratou seu antigo marqueteiro (Duda Lima), e esteja agora fazendo obras que atendam especialmente esse eleitorado de classe média. Asfalto bom não é uma coisa prioritária para quem anda de ônibus, é algo que pode agradar mais a um público pragmático que não depende tanto de serviços públicos em saúde ou educação, por exemplo — analisa.

No canal de atendimento telefônico da prefeitura (156), as reclamações referentes a buracos e pedidos de recapeamento ocuparam o terceiro lugar entre os assuntos mais demandados pela população no ano passado, atrás apenas da poda de árvores e de informações referentes ao CadÚnico.

Pesquisa contratada pela prefeitura e realizada de 25 a 26 de fevereiro pelo Ipespe mostra que saúde (61%), educação (46%) e zeladoria urbana (24%) — categoria onde a pavimentação de ruas está inserida — deveriam ser, nessa ordem, as prioridades da administração municipal nos próximos meses.

Ao mesmo tempo, a zeladoria está entre as áreas de pior performance da prefeitura. São 45% dos paulistanos os que enxergam uma piora na zeladoria e conservação da cidade nos últimos quatro anos. Só 14% dizem que ambas melhoraram no período, e outros 36% não viram mudanças.

No mês passado, Nunes enviou à Câmara Municipal um projeto que pretende incluir a pavimentação de ruas entre as ações que podem ser custeadas com recursos do Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb). O fundo é abastecido com dinheiro vindo do mercado imobiliário e da indústria da construção civil e concentrava mais de R$ 1 bilhão no ano passado. Originalmente, o Fundurb se destina a financiar projetos habitacionais ou melhorias no transporte coletivo.

A proposta, ainda em análise nas comissões da Câmara, é criticada pela oposição.

— A cidade vai viver agora só de pavimentação? O Fundurb deve ser usado para moradia e mobilidade urbana — defende o vereador Sinoval Moura (PT), presidente da Comissão de Trânsito, Transporte e Atividade Econômica da Câmara.

Em nota, a prefeitura de São Paulo assegurou que o programa de recapeamento é “eficiente” e que a qualidade do asfalto novo é prioridade para a gestão Nunes: “Não está só recompondo o asfalto, mas reestruturando a via desde sua composição mais profunda, quando necessário”.

O Globo