Militares deixam de ter privilégios na Justiça
Foto: Gabriela Biló/Folhapress
Cerca de 80 integrantes das Forças Armadas terão que explicar à Polícia Federal como uma horda golpista acampou em frente ao quartel-general do Exército, desfilou sem ser incomodada e invadiu o Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro. Não é pouca coisa. A tropa equivale à dimensão de uma companhia militar de tamanho modesto. Entre os intimados, estão dois generais.
A criação de uma força-tarefa para ouvir os agentes contribui para dois processos. O primeiro é o acerto de contas da Justiça com os responsáveis pela investida golpista, incluindo facilitadores dos ataques. O segundo é o que deveria ser uma progressiva desmilitarização do poder civil depois dos últimos quatro anos.
Tomar 80 depoimentos não encerra esses ciclos, mas a investigação manda sinais de que qualquer busca por apaziguamento entre as instituições civis e os militares não deve ser confundida com uma anistia.
Devem falar com a PF agentes lotados no Palácio e os antigos chefes do Comando Militar do Planalto e do Batalhão da Guarda Presidencial. Alguns serão ouvidos como testemunhas e outros devem ser investigados por omissão —todos dentro de um inquérito na Justiça comum, não em tribunais militares.
Essa etapa da investigação ajudaria a retirar das Forças Armadas um status de que ela desfrutou no governo de Jair Bolsonaro. Os militares devem depor sem o revestimento de poder político que a instituição recebeu naquele período e responder pelas falhas em uma missão que deveria ser trivial: a segurança do Palácio do Planalto.
Já seria um avanço em relação ao ciclo passado. Em 2020, o então ministro Augusto Heleno reagiu com uma ameaça pública (“consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional”) ao pedido de um partido político para apreender o celular de Bolsonaro. No ano seguinte, o ministro da Defesa se queixou de um “ataque leviano às instituições” quando a CPI da Covid puxou o fio dos militares envolvidos em suspeitas na negociação de vacinas.