Dono do PL vê “bom momento” para Bolsonaro

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Foto: Wenderson Araujo/Valor

A despeito da desarticulação política do governo e das comissões parlamentares de inquérito criadas no Congresso, Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, diz acreditar que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), conseguirá colocar em votação no curto prazo o novo arcabouço fiscal. Ele assegura que seu partido, que tem hoje 12 senadores e 99 deputados, não irá apoiar propostas que elevem a carga tributária. Mas defende mais liberdade para o governo gastar.

“Acho que tem que dar liberdade para o governo. É o governo que tem que fazer a parte dele de segurar [gastos]”, afirmou ele, em entrevista ao Valor.

Diante da falta de entregas do governo, Valdemar Costa Neto relativiza o potencial impacto negativo da operação da Polícia Federal contra Bolsonaro por suposto envolvimento em fraude de cartões de vacina. “Quem está dando um bom momento para o Bolsonaro é o Lula. Porque está parado o governo”, comenta. “Quando você entra na casa de um ex-presidente da República por causa de um cartão de vacina, a tendência disso é jogar ele para o céu. Vai melhorar a situação dele. Isso daí é 50% da facada.”

O pior momento foi o 7 de Setembro de 2021. Pensei que ele (Bolsonaro) fosse fazer uma loucura, que fosse fechar o Supremo”

Ele admitiu ter ficado preocupado com a possibilidade de que Bolsonaro “fizesse uma loucura” no dia 7 de Setembro de 2021. “Eu pensei que ele fosse fechar o Supremo.” A seguir os principais pontos da entrevista ao Valor:

Valor: O governo pouco realizou, tem problemas de articulação e o Congresso não votou nada de impacto. Qual é a avaliação que o senhor faz dessa conjuntura?

Valdemar Costa Neto: O grande problema nosso hoje é que o Congresso não cumpre as suas funções de legislar. Então, o Judiciário se sente na obrigação de legislar, hoje eles estão legislando. E o Executivo com a dificuldade que está: cinco meses e eles não conseguem fazer nada. Não estão se entendendo bem no governo, o PT não está se entendendo bem. Eles têm responsabilidade com as coligações, e não estão respondendo bem.

Valor: Há sinal de melhora na articulação política do governo?

Valdemar: Vão ter que encontrar um caminho, um modo. Eles têm gente qualificada, mas problemas com deputados de vários lugares, deputados qualificados que não foram atendidos com espaço. Todo mundo quer espaço para poder fazer as coisas. Não temos dinheiro para nada no Brasil. O único lugar que tem dinheiro é aqui [Brasília].

Valor: Mas, quanto à articulação política, o que está errado? Só o problema de espaço?

Valdemar: O comportamento dele [Lula] também.

Valor: Está faltando o Lula entrar mais na articulação?

Valdemar: O que eu ouço é que os ministros políticos não estão se entendendo.

Valor: E o arcabouço fiscal?

Valdemar: Está difícil. Eles [governo] vão penar. Eles estão há cinco meses no governo, já era para isso estar andando. Pela votação de ontem [derrota no decreto do saneamento] dá para sentir que eles não acertaram a vida com o Congresso. E nós vamos ser totalmente contra o aumento de impostos.

Valor: O governo Bolsonaro foi muito criticado por abrir buracos no teto de gastos e pela PEC que adiou o pagamento de precatórios. Para o governo Lula, as novas regras fiscais deveriam ser mais restritivas ou dar mais liberdade para o governo gastar?

Valdemar: Acho que tem que dar liberdade para o governo. É o governo que tem que fazer a parte dele de segurar [gastos]. Vamos estar na oposição sempre, mas não em matérias que sejam de interesse público.

Valor: O PL já tem alguma orientação para a reforma tributária?

Valdemar: Não. Mas em algumas matérias, se precisar fechar questão, vamos fechar, como fizemos no PL das Fake News. Nós somos a favor de coisas ali.

Valor: Por exemplo?

Valdemar: Somos a favor que a imprensa, se faz um investimento para fazer uma matéria… e o camarada fica faturando no seu investimento? Não está certo. A imprensa tem direito a receber os recursos. Outra coisa: os contratos que são feitos fora do Brasil têm que ser feitos aqui. Se ele vai fazer a propaganda aqui, não pode fazer o contrato nos Estados Unidos. E temos que lutar pela liberdade de o cidadão falar. Não queremos nenhum louco fazendo loucura, o que temos que fazer é vigiar. Mas foi um erro o Orlando Silva ser o relator.

Valor: Ele já era relator do tema na legislatura passada.

Valdemar: Mas ele não se elegeu, é suplente, e é do PCdoB. Tinha que pegar um camarada mais de centro. Só de ele ser do PCdoB esse pessoal nosso, de extrema direita, não quer nem ver nem discutir. Apesar que discutiram. Vão ter que achar uma maneira ideal de fazer isso, para estabelecer critérios.

Valor: O PL tem batalhado por espaços nas CPIs. Como será a atuação dos parlamentares do partido?

Valdemar: [A instalação das comissões] Foi uma derrota do governo. O governo deveria ter lutado para não deixar implantar essas CPIs, pois isso atrasa o trabalho do Congresso. Quando CPI pega, o pessoal [parlamentar] dá a vida para a aparecer.

Valor: E a CPI dos Atos Antidemocráticos?

Valdemar: Nós devemos ter a vice-presidência. Com essa questão do general no dia 8, a pressão aumentou [o general Gonçalves Dias deixou o comando do Gabinete de Segurança Institucional depois da divulgação de vídeos em que aparece no Planalto durante a invasão] e eles estão preocupados. Não colocaram policiamento lá. Quem vai ter muita dificuldade nessa CPI é o Flávio Dino [ministro da Justiça].

Valor: Por quê?

Valdemar: Até me dou com ele pessoalmente. Gosto dele. Mas ele fez uma portaria no dia 6 de janeiro determinando que a Guarda [Força] Nacional desse segurança da rodoviária à Praça dos Três Poderes, publicou no Twitter e não pôs ninguém lá.

Valor: E a CPI do MST ocorre em meio a invasões de terras produtivas…Ela vai entrar firme nessa história?

Valdemar: Isso não poderia ter voltado. O MST tem aspiração de ter doação do governo e o governo tem obrigação de cuidar desse pessoal, mas eles não respeitam. Vão ter que tomar providências, pois a propriedade dos outros tem que ser respeitada.

Valor: Apesar das CPIs, o presidente Arthur Lira disse que garante a votação das novas regras fiscais em breve. É possível conciliar isso?

Valdemar: Acho que sim. O presidente da Câmara tem um poder monstruoso. Ele proíbe a CPI de funcionar, tem esse poder e poder para tudo. Vota o que ele quer. Pode não aprovar, mas vota o que ele quer. Dá para ele tocar, sim. Limita-se o funcionamento de uma CPI. Se você limitou e não dá mídia, o pessoal sai de lá.

Valor: Por outro lado, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi alvo de uma operação nesta semana por suposto envolvimento em fraude de cartões de vacina contra Covid-19. Qual o impacto disso na imagem dele e nos planos do partido?

Valdemar: É um choque você ver a Polícia Federal na casa de um ex-presidente por causa de um cartão de vacina. Veja como acabou mal a Lava-Jato. Não é conselho, porque quem sou eu para aconselhar o Supremo? Mas, quando você entra na casa de um ex-presidente da República por causa de um cartão de vacina, a tendência disso é jogar ele para o céu. Vai melhorar a situação dele. Isso daí é 50% da facada, na minha opinião.

Valor: O senhor acha que ele ganhou a eleição em 2018 por causa da facada?

Valdemar: Sim, por causa da facada.

Valor: Mas a operação pode prejudicá-lo, não?

Valdemar: Para mim, não pegaram nada lá. Talvez fossem com outro objetivo. Estão dizendo que tem pen drive, tem nada. Bolsonaro nem mexe com esses negócios.

Valor: Mas apreenderam o celular dele, não pode ter algo lá?

Valdemar: Não acredito que tenha nada grave. Bolsonaro teve problema de comunicação na pandemia, muito grande. Mas o desemprego diminuiu, estávamos com inflação menor do que Estados Unidos, Inglaterra. Eu quero provar que o governo Bolsonaro deixou o país zerado.

Valor: Não teve desembolsos acima da média para tentar impulsionar a campanha? Isso teve efeito nas contas públicas.

Valdemar: Não, isso estava tudo dentro da programação. Não podíamos manter o preço do combustível do jeito que estava, ninguém aguentava. Só não esperávamos a pandemia durar tanto tempo.

Valor: Mas a pandemia poderia ter sido abreviada se o governo tivesse agido de forma diferente em relação à vacina e ao isolamento?

Valdemar: Ele fazia os comentários dele, não tomar vacina e tudo mais. Isso atrapalhou. Esse erro de comunicação levou ele à derrota, porque o Bolsonaro naquele período assustava principalmente as mulheres. Perdeu uns 20 milhões de votos.

Valor: Outra marca foi o ataque às instituições. Durante a campanha a gente ouviu que os aliados pediam cautela, mas isso não se refletia no comportamento dele. Existe algum arrependimento da parte dele? Por exemplo, quanto ao confronto com as instituições?

Valdemar: Isso sim, foi um erro dele. O pior momento dele com o Supremo foi no Sete de Setembro do ano retrasado [2021]. Porque até eu pensei que ele fosse fazer uma loucura. Eu pensei que ele fosse fechar o Supremo. Eu estava preocupado. Qualquer ato ilegal que você cometa hoje, em qualquer país como o nosso, ninguém apoia. Porque ninguém quer que isso aconteça no país dele. Por exemplo, você pegar Exército, Marinha, Aeronáutica, e dizer: “Lula não vai assumir”. Ninguém apoia.

Valor: O senhor acredita que o TSE julgará Bolsonaro inelegível?

Valdemar: Acho que não. Não existe nada contra o Bolsonaro, não pode deixá-lo inelegível porque ele falou alguma coisa.

Valor: Existe também a acusação de que ele tenha feito uso da máquina pública na eleição.

Valdemar: Mas tudo foi feito na lei.

Valor: O PL vai tentar calibrar o estilo do Bolsonaro para as próximas eleições?

Valdemar: Eu acho que quem está dando um bom momento para o Bolsonaro é o Lula. Porque está parado o governo.

Valor: Quais os planos para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro?

Valdemar: Bolsonaro e ela vão ajudar muito nas eleições municipais, vamos eleger mais de mil prefeitos. Ela está organizando o PL Mulher para valer, porque nós precisamos de mais mulheres na política.

Valor: E para 2026, se ocorrer a inelegibilidade do Bolsonaro, quais os planos para ele?

Valdemar: Tem o [senador] Flávio Bolsonaro, que vai sair de candidato a prefeito do Rio de Janeiro. Se ele trabalhar, ganha do Eduardo [Paes], porque ganhar dele não é parada fácil.

Valor: Flávio é o herdeiro político do Bolsonaro?

Valdemar: Se acontecer alguma coisa com o Bolsonaro, Flávio pode ser candidato a presidente. Ele tem que ir bem lá [no Rio]. O [deputado] Eduardo Bolsonaro é bom também. Um é diferente do outro. O Eduardo é o cara do batente, o Flávio é mais cabeça. E tem o [governador] Tarcísio em São Paulo, que é um fenômeno.

Valor: Mas ele não é do PL…

Valdemar: Não é, mas amanhã pode ser.

Valor Econômico