Presidenta está de volta ao governo

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Foto: O Globo

Símbolo dos mandatos de Dilma Rousseff e alvo de um intenso debate público que mobilizou até linguistas renomados, o uso da forma “presidenta” voltou a figurar em páginas institucionais do governo federal, o que não acontecia desde o impeachment, em 2016. Agora, porém, não apenas para falar de Dilma, “presidenta” do Banco dos Brics, mas para se referir às mulheres à frente de empresas públicas, fundações e autarquias.

É como “presidenta” que se identificam Rita Serrano (Caixa), Betânia Lemos (Enap), Luciana Mendes Santos Servo (Ipea), Tarciana Medeiros (Banco do Brasil) e Fernanda Castro (Ibram). Curiosamente, todas técnicas e servidoras de carreira, o que refuta um uso restrito aos quadros políticos do governo.

Embora o termo tenha se alastrado pelas instituições no governo Luiz Inácio Lula da Silva, não houve uma orientação oficial da Secretaria de Comunicação Social. Ocorreu um movimento espontâneo por parte das ocupantes dos cargos.

— A questão do uso da palavra “presidenta” é algo muito natural para mim. Ela chama a atenção apenas pelo fato gritante de ser a primeira mulher a presidir o BB em 214 anos. Caso fôssemos mais mulheres no passado, o termo seria mais naturalizado. É uma palavra que existe no vocabulário da língua portuguesa. Então qual a razão para não usar? — afirma Tarciana Medeiros, que chefia o Banco do Brasil.

Ela lembra que usou “presidenta” pela primeira vez no saguão do hotel onde teve seu nome anunciado.

— Peguei o telefone logo depois do anúncio, liguei para “mainha” e falei: “Agora o BB tem uma presidenta” — recorda-se.

Se na eleição de Dilma o “presidenta” teve como objetivo enaltecer o fato histórico de que a petista era a primeira, e até agora única, mulher a presidir o país, 13 anos depois o escopo é outro: ressaltar o pioneirismo feminino em outras instituições, além de jogar luz sobre a importância da representatividade.

— A adoção de “presidenta” é uma forma de reafirmar a importância da presença das mulheres nesses espaços. Afirmar que não é mais um homem a assumir o posto máximo da instituição que, em seus 58 anos, só teve duas outras mulheres antes de mim a ocupar essa função — diz Luciana Servo, do Ipea.

O termo “presidenta” se fez presente durante todo o mandato de Dilma Rousseff por meio de anúncios oficiais, discursos e publicações nos sites e redes sociais do governo. Apesar da persistência, não dá para dizer que “presidenta” caiu nas graças da população — ou mesmo da imprensa.

Inegavelmente, o substantivo em sua forma flexionada ficou conhecido no país inteiro, mas o seu uso acabou muito mais restrito à militância petista.

Em 2016, vale lembrar, pouco antes de o Senado confirmar a cassação de Dilma, o então presidente interino Michel Temer tentou jogar uma pá de cal na discussão ao vetar “presidenta” das matérias da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC).

A “volta da presidenta”, agora numa versão 2.0, bem mais abrangente, se dá num contexto diferente do de 2010, no qual a diversidade se tornou uma pauta de relevância no debate público e também dentro do próprio governo Lula, que bateu o recorde de mulheres no comando de ministérios.

Gleisi Hoffmann, que se autodenomina “presidenta” do PT, diz que o termo é uma simbologia importante de afirmação da mulher em cargos na vida pública ou mesmo na iniciativa privada, onde esses espaços ainda são ocupados predominantemente por homens.

— Nada mais afirmativo na equiparação de direitos entre homens e mulheres do que usar a linguística para a definição de cargos ocupados por nós, inclusive é mais democrático. Com cada vez mais mulheres ocupando espaços de poder, vejo o uso desses termos como fundamental para valorização e respeito às mulheres — diz ela.

O Globo