Redes bolsonaristas não sabem como defender o “mito”

Destaque, Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Reprodução/Alan Santos / PR/Divulgação

Passados três dias desde a operação de busca e apreensão da Polícia Federal (PF) na casa de Jair Bolsonaro em Brasília, as redes bolsonaristas demonstram desorientação quanto à estratégia de defesa a ser adotada no caso da fraude dos comprovantes vacinais.

Desde que a operação aconteceu, os grupos passaram a maior parte do tempo em silêncio quanto ao assunto.

Outros temas, como o PL das fake news, derrotas do governo Lula no Congresso e até a guerra na Ucrânia, foram preponderantes no período.

Os posts, memes e vídeos compartilhados por tem se concentrado em tratar Bolsonaro como vítima e investido na narrativa de uma perseguição política que seria capitaneada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que autorizou a Operação Venire.

Uma das imagens compartilhadas em alguns grupos ilustra escândalos como supostas armadilhas mal-sucedidas contra Bolsonaro, como o caso das joias sauditas e a queda do sigilo imposto sobre diversas informações do governo passado, como os cartões corporativos.

Em outro vídeo largamente compartilhado, o blogueiro Allan dos Santos, foragido da Justiça, acusa o STF de ter implementado um regime de exceção no país em conluio contra Lula e alerta ser “tarde demais” para o bolsonarismo.

É um comando sinalizado pelo próprio ex-presidente em uma coletiva a jornalistas após a ação da PF na sua casa, ao alegar que nunca escondeu sua postura antivacina e, portanto, não teria razões para forjar um cartão vacinal. Mas a estratégia não dá conta de toda a história desvelada pela investigação policial, especialmente no que diz ao fiel ex-ajudante de ordens Mauro Cid e outros aliados presos.

Até agora, o comportamento da base bolsonarista tem repetido o “modus operandi” adotado quando o escândalo das joias sauditas emergiu e Bolsonaro ainda estava no seu autoexílio nos Estados Unidos, quando boa parte dos apoiadores evitou o assunto.

Embora dessa vez esteja no Brasil e na capital federal, o ex-presidente se recolheu desde o dia da operação, e não há sinal de uma diretriz única, definida de cima para baixo, para ser reproduzida no ecossistema das redes bolsonaristas.

Há pouquíssimas menções às prisões, apesar das potenciais implicações para Jair Bolsonaro. Afinal, como o próprio então presidente declarou no ano passado, Alexandre de Moraes teria quebrado o “seu sigilo”, e não o de Cid, ao determinar a abertura dos dados telemáticos do então ajudante de ordens, tamanha a proximidade de ambos. Outro aliado preso, o ex-major do Exército Ailton Barros, já foi chamado de “irmão” pelo ex-presidente.

Nos bastidores do PL, desde a última quarta-feira fala-se em uma espécie de força-tarefa para vitimizar Bolsonaro, explorando a operação como mais um exemplo de abuso do Judiciário para atingi-lo. A estratégia foi reproduzida e disseminada por aliados, como o blogueiro Leandro Ruschel, e por dois de seus filhos políticos, o deputado Eduardo (PL-SP) e o senador Flávio (PL-RJ).

Só que, ao menos no âmbito das redes, resta claro não haver um plano para defender os aliados que encabeçaram o esquema de falsificação das vacinas às vésperas da viagem do então presidente para os Estados Unidos. Salvo uma mudança de curso nos próximos dias, esse cenário reforça a tese de que Bolsonaro deixar pelo caminho Cid e outros aliados, como o ex-assessor Max Guilherme e o próprio Barros.

O compasso de espera também reflete a dificuldade do ex-presidente e seu círculo mais próximo de controlar a situação. O caso do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, preso há mais de cem dias, e os rumores de uma delação premiada servem de aviso para o grupo.

Mas, até agora, o comportamento da militância tem sido bem diferente da força-tarefa bolsonaristas em momentos críticos para Bolsonaro, como na ocasião de depoimentos de aliados ou integrantes do então governo na CPI da Covid, ou até em temas mais espinhosos, como as denúncias contra ministros como Milton Ribeiro (Educação) e Ricardo Salles (Meio Ambiente).

O próprio volume escasso de mensagens chama atenção. Em que pese a restrição de diversos grupos bolsonaristas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após o 8 de janeiro e pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em função dos ataques às urnas eletrônicas e às fake news, os grupos servem como um termômetro da agitação da militância. A temperatura, pelo visto, está morna.

Sem subsídios para defender a conduta dos aliados e criar um “case” a favor de Bolsonaro, mesmo as redes bolsonaristas deverão seguir em velocidade de cruzeiro cuidando de temas mais “fáceis”, como reproduzir as conspirações sobre a ameaça da “censura” com o PL 3630, o das fake news, e retroalimentar ataques a Lula.

O Globo