Relator deixou brecha para Bolsonaro voltar em 2030
Foto: Rafael Luz/STJ/Divulgação
Jair Bolsonaro apostou tudo, inclusive o que não tinha — sorte. Gastou cerca de R$ 300 bilhões além do limite orçamentário, entregou o governo ao Centrão, entrou em confronto aberto com o Judiciário, convocou multidões às ruas e provocou crise de hierarquia e disciplina nos quartéis. Atravessou o mandato de quatro anos numa espécie de cruzada contra uma miragem de fraude eleitoral. Nunca apresentou uma única prova, mas isso, aparentemente, não tinha a menor importância. “Não estava perdido em autoengano”, apontou Benedito Gonçalves, juiz-corregedor do Tribunal Superior Eleitoral, acrescentando: “Estava fazendo política, estava fazendo campanha. A recusa de valor ao conhecimento técnico a respeito das urnas e a repulsa à autoridade do TSE foram manejadas como ferramentas de engajamento” Gonçalves votou na noite de terça-feira (27) pela condenação de Bolsonaro por crime de abuso de poder em 18 de julho do ano passado, quando discursou diante de uma plateia de diplomatas estrangeiros sobre supostas manipulações no sistema de votação eletrônica. Mais uma vez, não tinha uma única prova para sustentar as acusações, mas divulgou a versão ao vivo num comício transmitido pela televisão estatal e redes sociais, “com uso da estrutura pública e das prerrogativas do cargo de presidente”. Para o juiz-corregedor, ele “é pessoalmente responsável pela preparação, execução e transmissão do encontro e, sobretudo, pelos efeitos pragmáticos da mensagem que deliberadamente difundiu”. Gonçalves isentou o candidato a vice-presidente Walter Braga Netto e propôs que Bolsonaro fique fora de qualquer disputa eleitoral por oito anos “seguintes ao pleito de 2022”. Isso deixa uma fresta. Se for seguido pelos demais juízes do TSE, Bolsonaro tem chances reais de disputar as eleições gerais de 2030, quando estará com 75 anos de idade (Lula estará com 84). Oito anos de inelegibilidade, pela proposta de Gonçalves, contam-se a partir do domingo 2 de outubro de 2022. Mantida a tradição, o primeiro turno eleitoral de 2030 acontecerá no domingo 6 outubro – quatro dias depois do término da sentença. Até lá, Bolsonaro estará na planície, sem sucessor ou legado. Manter aglutinados dos aliados de hoje será o seu principal desafio. Raros são os políticos que sobreviveram ao naufrágio do esquecimento.