Sucessão de Lira na Câmara começa ano e meio antes
Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo
A relação de desconfiança do Palácio do Planalto com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem precipitado uma intensa movimentação nos bastidores pela sucessão do comando da Casa Legislativa. Com a impossibilidade do deputado alagoano de concorrer a um novo mandato, dois nomes já despontam como favoritos ao cargo a pouco mais de um ano e meio da eleição: o do deputado Elmar Nascimento (BA), líder do União Brasil, e de Marcos Pereira (SP), presidente do Republicanos. Ao mesmo tempo, parlamentares de partidos da base tentam conquistar o apoio do governo para entrar na disputa, o que impacta na dificuldade do Executivo em formar uma tropa sólida no Parlamento.
Um dos interessados em receber o selo de candidato de Lula na corrida à presidência da Câmara é o atual líder do PSD, Antonio Brito (BA). Na terça-feira passada, a bancada do partido se reuniu com o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que ouviu apelos para que o governo se empenhe em eleger Brito em 2025. A campanha é endossada pelo presidente da legenda, Gilberto Kassab, conhecido por transitar bem entre as diferentes forças políticas do país.
— Fico contente com esse reconhecimento e tenho a compreensão que a eleição acontecerá no momento certo — afirmou Brito ao GLOBO, admitindo a candidatura.
O deputado do PSD cita, além de Marcos Pereira, o deputado Isnaldo Bulhões (AL), líder do MDB, como um concorrente interno dentro do seu bloco partidário. O emedebista, aliado do senador Renan Calheiros (MDB-AL), desconversa sobre a intenção de concorrer, e diz que o assunto ainda “não está na ordem do dia”. Apesar da distância da eleição da Mesa Diretora da Casa, a eventual promessa de apoio do Planalto é vista como um trunfo para garantir a fidelidade dos partidos que o pleiteiam.
Enquanto isso, defensores da candidatura do PSD não escondem que estão em campanha e afirmam que, diferentemente de Elmar e Pereira, Brito teria uma melhor interlocução com o governo. Argumentam ainda que ele poderia ser um nome mais confiável que os demais, por já fazer parte da base aliada.
A articulação do PSD conta ainda que o PT, dono da segunda maior bancada, deve abrir mão novamente de lançar um candidato em troca de um nome de consenso, a exemplo do que ocorreu na reeleição de Lira, no início do ano. Na ocasião, o atual presidente da Câmara juntou no mesmo bloco partidos aliados ao governo e de oposição, como o PL.
— Teremos de conversar com o bloco que elegeu o Lira. Todos os grandes partidos têm direito a reivindicar a presidência (da Câmara). Só não pode ser bolsonarista e nem oposição — disse o deputado Jilmar Tatto (PT-SP).
Diferentemente do deputado do PSD, os outros parlamentares evitam se colocar como candidatos neste momento por receio de queimar etapas, mas intensificaram a campanha nos bastidores. Em conversas reservadas, um dirigente partidário disse que nunca viu um processo tão antecipado pela eleição do comando da Casa.
Tanto Elmar quanto Pereira já viveram a mesma expectativa em 2019, quando faziam parte do grupo próximo ao então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (PSDB-RJ), e buscavam seu apoio para sucedê-lo. Maia, contudo, optou por lançar o nome de Baleia Rossi (MDB-SP), derrotado por Lira.
Insatisfeito, Elmar, então correligionário de Maia no DEM, rachou o partido e levou metade da bancada para o lado de Lira. Pereira, por sua vez, tentou angariar apoio de partidos da esquerda para entrar na disputa, mas, sem sucesso, abriu mão da candidatura em favor do atual presidente da Câmara.
Tido por seus pares como o principal cabo eleitoral na Casa, Lira faz mistério sobre em quem vai apostar. Questionado, disse não ver uma disputa antecipada. Em entrevista ao GLOBO em abril, disse que só deve definir seu candidato em 2025, quando ocorrerá a escolha, e “quem colocar a cabeça para fora neste ano é bobo”.
A disputa, porém, já provocou uma divisão da Câmara em dois superblocos partidários. Um grupo, liderado por União Brasil e PP, é mais próximo de Lira e tem Elmar como pretenso candidato. O outro abrange MDB, PSD, Republicanos e Podemos, e tem Pereira, Brito e Isnaldo como alternativas.
Aliados apontam Elmar como o favorito de Lira, e citam movimentos recentes do presidente da Câmara como indicativo — por exemplo, a tentativa de emplacá-lo como ministro. A empreitada, contudo, foi barrada por integrantes do PT baiano, de quem o deputado do União é adversário político.
Procurado para comentar a disputa, Elmar não quis se manifestar. Em maio, em entrevista ao GLOBO, disse considerar desrespeito com Lira discutir sua sucessão poucos meses após ele ter sido reeleito. Afirmou ainda que quem lançar uma candidatura agora correria o risco de ser “queimado”.
Já defensores da candidatura de Pereira dizem que ele tem um perfil mais moderado, necessário para comandar a Casa, e que teria um bom diálogo tanto com a esquerda quanto com a direita.
Por outro lado, integrantes do PT argumentam que, embora Pereira seja menos afeito a enfrentamentos do que Elmar, um apoio a ele seria mais difícil porque o Republicanos hoje não é da base. Citam, ainda, a possibilidade de o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ser lançado como nome da direita na disputa pela Presidência, caso o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) declare Jair Bolsonaro inelegível. Neste cenário, Lula e o presidente da Câmara ficariam em lados opostos.
Deputados do Republicanos mais próximos ao Planalto, contudo, acreditam que uma sinalização clara do governo em direção à candidatura de Pereira poderia mudar a situação. Lula tenta atrair a sigla para a base aliada e entregou cargos a nomes da legenda, que mantém o discurso de independência.
Questionado, Pereira desconversa sobre o assunto:
— Não discuti sucessão (na Câmara) com ninguém.
Enquanto isso, a oposição observa a movimentação e espera um cenário mais definido para se posicionar. Dono da maior bancada da Câmara, com 99 parlamentares, o PL se vê ilhado entre dois superblocos e dificilmente terá um nome competitivo na disputa.
— Ninguém vai desprezar um partido com uma centena de votos. Nosso apoio será fundamental. Por isso, nós seguimos dialogando com todas as frentes — disse o líder do PL, Altineu Côrtes (RJ).
Sucessão de Lira
Elmar Nascimento (União-BA)
A favor: Líder da terceira maior bancada da Câmara, é um dos nomes mais próximos do atual presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e tem se colocado como um interlocutor com o governo. Também tem influência sobre a Codevasf, que foi inflada com emendas cobiçadas por parlamentares.
Contra: Apesar de ser de um partido considerado da base aliada, mantém uma relação conturbada com o governo. Ele é adversário político do ministro da Casa Civil, Rui Costa, na Bahia. Também precisa lidar com a concorrência interna de outros nomes de seu bloco.
Marcos Pereira (Republicanos-SP)
A favor: Atual vice-presidente da Câmara, transita bem tanto com partidos da direita quanto da esquerda. É presidente do seu partido, cuja bancada na Câmara costuma ser fiel à direção nacional, diferentemente do União Brasil, com mais divisões internas. Tem perfil considerado moderado.
Contra: Seu partido tem apenas a sétima maior bancada da Câmara e, fora da base aliada, teria dificuldades em ter o apoio do governo. Além disso, o nome do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), desponta como um possível adversário dos petistas em 2026.
Antonio Brito (PSD-BA)
A favor: Faz parte de um partido com três ministros no governo e tem boa interlocução com o Palácio do Planalto. Também é considerado um nome que transita bem entre líderes de outros partidos.
Contra: Não conta com a mesma rede de apoio de Elmar e Pereira, que são considerados favoritos. Integrantes do próprio PSD dizem que a conversa sobre a pré-candidatura está ainda em estágio inicial.
Isnaldo Bulhões (MDB-AL)
A favor: Tem boa interlocução no Congresso e foi reeleito líder do MDB no início do ano. Seu partido tem três ministérios no governo, com influência sobre cargos cobiçados por parlamentares.
Contra: A exemplo de Antonio Brito, não conta com a mesma rede de apoio que Elmar e Pereira. Seu partido também mira o comando do Senado, o que pode tirar o foco da disputa pela Câmara.