Brasil tentará emplacar nome em Painel da ONU
Foto: Luara Baggi/Ascom MCTI
Apesar da derrota da brasileira Thelma Krug na disputa pela presidência do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a atuação do governo federal demonstrou a seriedade dada ao tema. O Ministério das Relações Exteriores (MRE) encabeçou, nos bastidores, uma forte campanha de convencimento dos demais países-membros do órgão — ligado à Organização das Nações Unidas (ONU) —, um dos principais organismos que tratam da política climática. Cientista de destaque e com atuação de mais de 21 anos no IPCC, a brasileira chegou ao segundo turno das votações, perdendo para o escocês James Skea por 69 votos a 90.
Thelma seria a primeira pessoa representante da América Latina e do Caribe a assumir o cargo, e a primeira mulher. Apesar da oportunidade perdida, o apoio que conseguiu angariar foi expressivo. Pesou contra ela o esforço dos países europeus.
Mesmo com o jogo político envolvido na escolha do presidente, o IPCC é considerado um órgão técnico e fortemente blindado contra os interesses políticos. O Painel é formado por cientistas de renome que atuam no estudo das mudanças climáticas, e seus relatórios, publicados em períodos de cinco a sete anos, são usados para basear políticas públicas.
Fontes do MRE ouvidos pelo Correio garantiram que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não diminuirá o trabalho para ocupar posições de destaque em órgãos internacionais. E lembram que a escolha de Belém para sediar a COP30, em 2025, foi uma grande vitória para ambição brasileira de liderar as discussões sobre mudanças climáticas.
A votação para o IPCC ocorreu em Nairóbi, no Quênia, da qual participam 195 países. O MRE enviou uma equipe de diplomatas para acompanhar as tratativas, que foi liderada pela secretária-geral, embaixadora Maria Laura da Rocha. A ministra do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, Marina Silva, também esteve na capital queniana para cabalar votos a favor de Thelma Krug.
Em evento na embaixada do Brasil em Nairóbi, Marina defendeu a candidatura da brasileira. “Cientista renomada, detentora de vasto conhecimento sobre múltiplos fenômenos relacionados ao tema, a dra. Thelma Krug reúne todas as qualidades imprescindíveis para liderar o IPCC em seu sétimo ciclo de avaliação. Caso eleita, ela será a primeira mulher e a primeira representante da América Latina e Caribe a presidir o IPCC”, enfatizou, na última terça-feira.
Thelma e a sul-africana Debra Roberts foram as primeiras mulheres a se candidatar à presidência do Painel, criado em 1988. Também concorreram o vencedor Skea e o belga Jean-Pascal Van Ypersele.
O coordenador de Comunicação e Política Climática do Observatório do Clima, Claudio Angelo, elogia o esforço brasileiro para emplacar a cientista. “O Brasil investiu pesadamente. Foi uma campanha de lobby internacional grande, e o Itamaraty estava muito ativo tentando ganhar votos”, disse.
Angelo alerta, porém, que o aspecto político da escolha para a presidência do IPCC não se reflete na gestão do órgão, de natureza técnica. Um dos exemplos é o do cientista indiano Rajendra K. Pachauri, que presidiu o Painel entre 2002 e 2015, eleito, inclusive, com apoio dos Estados Unidos. Sua eleição foi, a princípio, vista com desconfiança, já que era considerado alinhado com os interesses da indústria americana de combustíveis fósseis. Sua condução do Painel, porém, levou a um dos mais importantes relatórios, o de 2007, que ganhou o Prêmio Nobel da Paz.
“O fato de ter um presidente do mundo desenvolvido não quer dizer, necessariamente, que o IPCC vai seguir esses interesses. É um painel científico. Isso dá para dizer que está na agenda da Europa, do Reino Unido, dos Estados Unidos. Esses países todos têm tecnologia de energia limpa para vender”, salientou.