Fusão entre DEM e PSL criou mostrengo

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Foto: Pedro Ladeira / Folhapress

Conhecido pela profusão de caciques e pela falta de unidade — empecilhos para o diálogo com o governo Lula (PT) —, o União Brasil também acumula conflitos internos e desentendimentos com governadores, mesmo sendo contabilizado na base em 21 dos 27 estados. Além da pressão por cargos, valendo-se do tamanho de suas bancadas, lideranças egressas dos extintos DEM e PSL disputam protagonismo em seus redutos após a fusão que deu origem ao União. Sem coesão, o partido já projeta novos entraves no relacionamento com o Palácio do Planalto após oficializar a nomeação do deputado Celso Sabino (União-PA) no Ministério do Turismo.

Em São Paulo, onde integra a base do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o União ameaça barrar pautas do governo na Assembleia Legislativa (Alesp) em meio a reclamações por espaço. Tarcísio resiste a entregar à sigla a presidência da Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano, pleiteada pelo grupo do vereador Milton Leite, influente no antigo DEM. O diretório estadual do partido está a cargo de Antonio Rueda, braço direito do presidente nacional da sigla, Luciano Bivar. Com influência além de São Paulo, Rueda também participa de conversas por cargos na gestão e, a interlocutores, sinaliza que a relação no estado pesará num eventual apoio do partido a uma candidatura presidencial de Tarcísio.

No Rio, Rueda indicou postos no Detran e no Rioprevidência na gestão do governador Cláudio Castro (PL), além de ter conquistado a Secretaria de Habitação do prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD). Sem emplacar suas próprias indicações, o prefeito de Belford Roxo, Waguinho, que presidia o diretório estadual do União, decidiu migrar para o Republicanos. Na briga com Rueda, e antes de deixar o cargo, ele autorizou a desfiliação de seis deputados do União Brasil. O caso está na Justiça Eleitoral.

Disputas no partida — Foto: Infoglobo

Tentativas do Planalto de contemplar lideranças do União para arregimentar apoios do partido esbarram em divisões regionais. No Mato Grosso do Sul, por exemplo, a ex-deputada Rose Modesto foi nomeada em maio para chefiar a Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco), em paralelo a uma disputa com a senadora Soraya Thronicke pelo diretório estadual. Irritada com a cúpula do partido, Thronicke se desfiliou e migrou para o Podemos, mas deixou um aliado na presidência estadual do União após uma batalha judicial. O governador Eduardo Riedel (PSDB) tenta manter boa relação com as duas alas.

No Ceará, o governador Elmano de Freitas (PT) vem se aproximando de parlamentares do partido, sob resistência do ex-deputado Capitão Wagner (União-CE), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro. Hoje sem mandato, Wagner se abrigou na gestão do prefeito de Maracanaú, Roberto Pessoa, que o nomeou como secretário municipal de Saúde; sua mulher, a deputada federal Fernanda Pessoa (União-CE), é um dos nomes que se aproximam da gestão petista.

— Dentro do União Brasil há diversas tendências. Alguns parlamentares são mais alinhados ao governo federal, outros são de oposição. O União saiu grande das urnas em 2022, atrás só de PT e PL, o que torna o partido importante tanto para alianças eleitorais quanto para garantir a governabilidade — avalia o senador Efraim Filho (União-PB).

Efraim emplacou um aliado, Irlen Guimarães Filho, na Superintendência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf) em João Pessoa. Apesar da aproximação com o governo Lula, o União faz oposição na Paraíba ao governador João Azevêdo (PSB), aliado do Planalto.

O senador avalia que a troca no Turismo, costurada por Lula com lideranças do União no Congresso, “influencia pouco” o partido como um todo. Após a fusão entre DEM e PSL, o União teve seu comando pulverizado em nacos de poder para caciques regionais, com interesses distintos.

Em Pernambuco, reduto de Bivar, ex-presidente do PSL e hoje à frente do União Brasil, seus dois colegas de bancada na Câmara, Mendonça Filho e Fernando Coelho Filho, ambos egressos do DEM, defendem uma postura de oposição ao PT. Bivar, por sua vez, emplacou cargos no primeiro escalão das gestões da governadora Raquel Lyra (PSDB) e do prefeito do Recife, João Campos (PSB), que estão em campos opostos, e também vem sendo consultado sobre indicações no governo Lula, embora classifique o partido como “independente”.

Às vésperas da votação da Reforma Tributária, Bivar divulgou um comunicado, subscrito por 38 dos 59 deputados do União, solicitando a retirada de pauta do projeto, o que irritou outro cacique da sigla, o deputado Elmar Nascimento (BA). Momentos antes, o Palácio do Planalto havia adiado a substituição no Ministério do Turismo, o que contrariou Bivar. Nascimento, por outro lado, se alinhou ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que articulava a votação antes do recesso parlamentar.

O incêndio só foi contornado porque o Planalto, no mesmo dia, confirmou publicamente que Sabino seria nomeado, o que fez a bancada votar majoritariamente a favor da reforma. O deputado José Rocha (União-BA), um dos signatários da nota, minimizou as idas e vindas ao confirmar que a causa foi o “problema” envolvendo Sabino.

— Foi, sim. Mas logo foi resolvido.

O Globo