Governadores também enfrentam problemas com base
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A exemplo do que vem ocorrendo na esfera federal, pelo menos oito governos estaduais ampliaram a liberação de emendas parlamentares nos primeiros seis meses de 2023. Os crescimentos mais significativos ocorreram em São Paulo (231%), Bahia (181%), Paraíba (95%), Amapá (70%) e Minas Gerais (5%). Levantamento do GLOBO mapeou as 27 unidades federativas do país: 16 não prestam contas detalhadas do orçamento e duas, Rio e Ceará, não dispõem do mecanismo de partilha de recursos. Já Santa Catarina reduziu o volume (-68%), em comparação com os do ano passado.
As emendas são um instrumento por meio do qual deputados podem destinar verbas do Executivo a seus redutos eleitorais — o valor varia em cada estado. Os parlamentares indicam em quais áreas e ações desejam alocar recursos. Como as emendas são impositivas, cabe ao governo decidir apenas o calendário de execução dessas melhorias. A reportagem se debruçou sobre os recursos empenhados, ou seja, etapa em que o Executivo reserva o dinheiro a ser liberado.
Assim como na relação entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o Congresso Nacional, os estados ampliaram a participação dos deputados. Nas assembleias estaduais, a demanda ganha ainda mais peso devido ao baixo orçamento de pequenos e médios municípios, base eleitoral de parte dos parlamentares. É o que pontual Monalisa Torres, mestre em Políticas Públicas pela Universidade Estadual do Ceará (Uece):
— O perfil geral dos municípios é não ter autonomia financeira e, por isso, dependem do governo estadual e federal. O aporte das emendas é essencial para aplicar políticas públicas, principalmente para manter uma agenda de obras.
O mecanismo funciona como uma via de mão dupla. O Executivo garante ao deputado a aplicação de recursos. Por outro lado, como tem prerrogativa de definir o calendário de liberação, se utiliza desse poder para negociar fidelidade do parlamentar nas votações no Legislativo.
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À frente da maior economia do país, o governador paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tem investido no mecanismo para tentar angariar uma base fiel. Embora venha convivendo com percalços na Assembleia Legislativa, o esforço surtiu efeitos. Em maio, conseguiu aprovar o reajuste salarial dos policiais, projeto caro ao governo.
Em Minas, Romeu Zema (Novo) passou a investir na mesma estratégia, após um primeiro mandato de resistências, mas ainda não conseguiu virar o jogo. Apesar de alegar ter uma base sólida no parlamento (57 dos 77 deputados), o mineiro tem enfrentado impasses para aprovar propostas de caráter não administrativo, como o Regime de Recuperação Fiscal (RRF).
Como noticiou o GLOBO, o movimento acompanha o que ocorreu no governo federal. No primeiro semestre deste anos, Lula autorizou o empenho de três vezes mais recursos do que ex-presidente Jair Bolsonaro fez em 2019, seu primeiro ano de mandato. Diferentemente do que ocorreu no Executivo federal, porém, nos estados, alguns governadores conseguiram se reeleger, como os de Amapá, Goiás e Minas.
Os estados que ainda não contam com emendas impositivas, Ceará e Rio de Janeiro discutem a criação do mecanismo em suas assembleias. Ao GLOBO, o presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar (PL), confirmou que colocará o tema em votação nas próximas semanas.
No Rio, o texto em tramitação prevê que cada um dos 70 deputados possa destinar R$ 25 milhões ao ano. Já no estado do Nordeste, antes do recesso, os parlamentares da oposição ao governador, Elmano Freitas (PT), vinham cobrando a previsão desses recursos no orçamento.
— Emenda impositiva não é favor de governador, é prerrogativa de Assembleia — diz Felipe Mota (União Brasil).
Para os especialistas ouvidos pelo GLOBO, embora ainda possa ser usada como instrumento de barganha política, a aplicação de emendas impositivas é essencial para a manutenção do processo democrático. Sem essa medida, os parlamentares ficam na mão do Executivo, o que facilita a destinação de recursos apenas para aliados do governo.
— Quando não há emendas, acaba abrindo espaço para que os governos privilegiem as lideranças de maior proximidade, o que pode sufocar as oposições — diz a cientista política Luciana Santana, da Universidade Federal do Piauí.
Apenas a existência do instrumento, porém, não garante a transparência. Dezesseis estados mapeados pela reportagem não possuem dados detalhados. Demandados, afirmaram não ser uma obrigação legal.