Governo Lula faz “risco Brasil” despencar

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Foto: Getty Images

Embalado pelas aprovações do novo marco fiscal e da reforma tributária na Câmara dos Deputados, além da elevação de sua nota de crédito por duas das maiores agências de classificação de risco do mundo – a Fitch e a DBRS Morningstar –, o Brasil viu o chamado “risco país” cair nesta semana para o patamar mais baixo em dois anos.

Na quarta-feira (26/7), dia em que a Fitch elevou o “rating soberano” do Brasil de “BB-” para “BB”, com perspectiva estável, o risco país recuou para 166 pontos. Trata-se do menor nível desde junho de 2021, quando alcançou 162 pontos.

Na semana anterior, o risco país, também chamado de risco Brasil, estava em 175 pontos. Há um ano, em 290. No início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em janeiro, o indicador marcava 254 pontos.

O risco país, ou risco soberano, é um indicador que mede o grau de confiança em diversas economias, geralmente de países emergentes. Criado em 1992 pelo banco J.P. Morgan, um dos maiores dos Estados Unidos, o índice tem como base variáveis como estabilidade política, responsabilidade fiscal, crescimento econômico e a relação dívida/PIB.

Em linhas gerais, o risco soberano funciona como uma espécie de “seguro” de crédito contra a possível inadimplência de determinados países. O objetivo é medir o risco de um governo dar um calote em sua dívida: quanto maior é o risco país, maior é a chance de um calote.

Trata-se de um termômetro que orienta os investidores na avaliação sobre eventuais aportes financeiros naqueles países. Além do Brasil, nações como Argentina, México, Rússia, Turquia e África do Sul são permanentemente avaliadas por meio do risco país.

Segundo analistas do mercado ouvidos pela reportagem do Metrópoles, a queda do risco Brasil é consequência, principalmente, das reformas estruturantes aprovadas desde o governo de Michel Temer (2016-2018). Também houve uma reacomodação do próprio índice, depois do impacto de episódios extremos e pontuais, como a pandemia de Covid-19, a guerra entre Rússia e Ucrânia e a polarizada eleição presidencial no Brasil, em 2022.

“O que observamos agora é uma correção, após a alta expressiva em meses e anos anteriores. É uma trajetória de volta à normalidade”, afirma o economista Bruno Musa, sócio da Acqua Vero Investimentos. “Independentemente de governo A ou B, a chance de o Brasil dar calote na sua dívida, hoje, é zero. O país tem reservas internacionais de US$ 350 bilhões e um fluxo de dólar que tem sido positivo. O real vem se mantendo mais valorizado e, portanto, há um perfil menor de risco da dívida. Tudo isso contribui.”

Para Hugo Queiroz, diretor de Corporate Advisory da L4 Capital, a turbulência política do país nos últimos anos não foi capaz de desviar o Brasil da rota da modernização econômica, com a aprovação de reformas como a trabalhista (2017), a da Previdência (2019), além do marco do saneamento (2020) e, neste ano, do marco fiscal e da reforma tributária.

“Essa queda do risco Brasil indica que o país está, desde 2016, em uma trajetória correta no sentido de modernização da economia. Não é algo que aconteceu nos últimos seis meses ou nos últimos quatro anos. Isso é resultado de fatos que vêm ocorrendo de seis ou sete anos para cá, desde o governo Temer, passando pelo governo Bolsonaro, até o governo Lula”, diz Queiroz.

Na reta final das eleições presidenciais do ano passado, o risco Brasil ultrapassou os 300 pontos, muito próximo do auge alcançado no início da pandemia. A expectativa, relembra Bruno Musa, era a de que um novo governo do PT adotaria uma política econômica muito semelhante àquela levada a cabo pela ex-presidente Dilma Rousseff (2011-2016), que levou o Brasil à maior recessão de sua história, no biênio 2015-2016.

“O que o mercado estava esperando no começo do governo era uma política econômica 100% heterodoxa, sem nenhum tipo de freios e contrapesos pelo Legislativo. Mas o que se vê, pelo menos até agora, é que o Congresso tem conseguido colocar alguns freios. O novo marco fiscal, por exemplo, é ruim e não será capaz de segurar a dívida brasileira, que vai continuar crescendo. Mas, certamente, poderia ter sido pior, assim como a reforma tributária”, avalia.

A melhora na avaliação de três das quatro principais agências de classificação de risco do mundo sobre o Brasil também contribui para a queda do risco país, segundo os analistas ouvidos pelo Metrópoles. Antes da Fitch e da DBRS Morningstar subirem o “rating” soberano brasileiro, nesta semana, a S&P Global já havia melhorado a observação sobre a nota de crédito do país, em junho. A agência manteve a nota em “BBB”, mas a perspectiva mudou de “estável” para “positiva”.

“A nota de crédito do risco soberano do Brasil confirma essa trajetória dos últimos anos. Isso ajuda a baixar o risco país. Permanecendo nesse caminho de reformas, o Brasil, provavelmente, vai atingir o grau de investimento, que é um selo de qualidade importante”, afirma Queiroz. O grau de investimento, que o Brasil perdeu em 2015, é um atestado de bom pagador conferido pelas agências de risco a países e instituições.

“Historicamente, os países que perdem grau de investimento tendem a recuperá-lo entre seis e sete anos, se fizerem o dever de casa. O país já caminha para oito anos sem essa nota de crédito”, pondera Bruno Musa. “Muitos dos fundos internacionais só podem trazer dinheiro para países que têm grau de investimento. É claro que a subida da nota pelas agências foi uma notícia positiva, mas, tecnicamente, o país ainda não pode atrair o fluxo de capital que tinha há alguns anos”, explica.

Segundo os especialistas, a tendência é o risco país permanecer no patamar atual ou cair ainda mais, caso o Brasil recupere o grau de investimento em breve. Para tanto, é imprescindível que a trilha de reformas iniciada em 2016 continue a ser seguida.

“Só haverá deterioração no risco país se o ambiente de reformas desaparecer do horizonte ou se houver hostilidade ao investimento privado e ao que foi construído desde 2016. Caso tudo continue no caminho que está indo, provavelmente podemos ter patamares do risco país inferiores aos atuais, principalmente se o Brasil obtiver o grau de investimento”, afirma Queiroz.

Se os textos finais do marco fiscal e da reforma tributária forem muito desfigurados, complementa Musa, poderá haver algum impacto negativo sobre a confiança dos investidores. “Também é preciso ficar atento ao cenário macro. Se a inflação global recrudescer e os EUA continuarem subindo juros, isso afetará a nossa moeda, o que pode prejudicar as expectativas”, afirma.

“Temos alguns sinais preocupantes. O governo central voltou a ter déficit no mês de junho. Os principais bancos e casas de análise estão mostrando que o déficit brasileiro será próximo a 1,5% do PIB neste ano, quando a expectativa do governo, com o marco fiscal, era de 0,5%. Essa meta, obviamente, não será cumprida. São ameaças que deveriam estar em nosso radar”, alerta.

Metrópoles