Pragmatismo de Lula com Venezuela pode render R$ 6 bi

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O governo Lula (PT) tem atuado para reconstruir as pontes com o ditador Nicolás Maduro de olho no pagamento de uma dívida da Venezuela com o Brasil que chega a US$ 1,27 bilhão (cerca de R$ 6 bilhões) — valor calculado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.

O Brasil encabeça o movimento de reinserção da Venezuela nos blocos econômicos mundiais, articulando uma nova roupagem do regime de Maduro aos olhos do mundo.

Para isso, Lula usa uma tática de “morde e assopra”: apesar de ter posado para fotos e exaltado Maduro, o presidente está sendo obrigado a olhar para a contestada política interna da ditadura venezuelana e a propor mais transparência nas próximas eleições.

O encontro com Maduro em maio se tornou negativo para Lula, que recebeu uma série de críticas. O episódio, por ter demonstrado uma proximidade mais do que diplomática, foi visto como um escorregão do petista.

A estratégia agora é focar nos benefícios econômicos que a Venezuela trará ao Brasil. O país vizinho deve US$ 1,27 bilhão ao governo brasileiro, e uma boa relação diplomática abre espaço para negociar o pagamento.

Lula reabriu a embaixada do Brasil em Caracas. Maduro voltou a ser recebido por um presidente brasileiro, em maio, após oito anos. Os dois se reuniram em Brasília e posaram para fotos no Palácio do Planalto.

O Itamaraty mantém a tradicional postura de discrição ao tratar da Venezuela. Mas o ministério acompanha com atenção os desdobramentos da política interna do país vizinho. Recentemente, a nova candidata de oposição a Maduro, Maria Corina Machado, foi considerada inelegível pelos próximos 15 anos em um processo que teve início em 2015. A notícia incomodou vários países.

Os diplomatas, segundo apurou UOL, consideram que há um longo processo até as eleições de 2024. Por serem questões internas, eles esperam se manifestar sobre o assunto apenas se houver convite ou abertura do governo Maduro. O foco é reconstruir a relação diplomática com um país de fronteira e importante parceiro comercial.

Uma das iniciativas já estabelecidas é a retomada do fornecimento de energia para Roraima pelo país vizinho. O fornecimento, cessado em 2019 por Bolsonaro, já foi garantido pelo ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia), com o discurso de fazer “uma grande integração energética na América Latina”.

Lula também tem defendido a entrada da Venezuela nos Brics. O cálculo da gestão petista é o seguinte: quanto mais países sul-americanos se desenvolverem, melhor para toda a região. Na visão de Lula, desenvolver os vizinhos é, ao mesmo tempo, desenvolver o Brasil — como o presidente fez nos seus dois primeiros mandatos.

A Venezuela era um dos principais parceiros econômicos do Brasil até o início do governo Temer. Em 2012, com Dilma Rousseff, foram arrecadados cerca de US$ 5 bilhões em exportações para a Venezuela, segundo dados do governo federal.

As exportações despencaram a partir de 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT). O então presidente Michel Temer (MDB) esfriou as relações com o país vizinho, e a crise econômica na Venezuela agravou o quadro.

Sob Bolsonaro, não houve relação diplomática entre os dois países.

Foco na economia e sem falas polêmicas de Lula. É essa postura defendida pelo assessor especial e ex-chanceler, Celso Amorim. Ele já sugeriu diversas vezes que o presidente foque suas falas na economia e na relação bilateral e evite frases polêmicas.

Depois de muito resistir, Lula parece ter ouvido: o presidente tem tentado fazer a ponte entre a Venezuela e outros países. Na ida à Bélgica, na cúpula entre países da Europa, América Latina e Caribe, esse foi um dos assuntos tratados pelo brasileiro, em meio aos debates do acordo entre Mercosul e União Europeia, com forte posicionamento em defesa da democracia.

No encontro, o Brasil encabeçou uma iniciativa com Argentina, Colômbia, França, Venezuela e o Alto Representante da União Europeia. Eles pediram “eleições livres” no país e o fim das sanções internacionais.

[Os chefes de Estado] fizeram um apelo em prol de uma negociação política que leve à organização de eleições justas para todos, transparentes e inclusivas, que permitam a participação de todos que desejem, de acordo com a lei e os tratados internacionais em vigor, com acompanhamento internacional. (…) Esse processo deve ser acompanhado de uma suspensão das sanções, de todos os tipos.
Declaração conjunta em Bruxelas

Conselheiros de Lula argumentam que o caminho é evitar a exaltação ao regime de Maduro. Líderes europeus já expressaram a preocupação em relação a um possível retorno da Venezuela ao bloco sul-americano, condição que o Brasil defende.

Lula estreitou os laços com a Venezuela ainda durante o governo de Hugo Chávez, desde o primeiro mandato do petista, em 2003. O Brasil liderou à época um grupo de pacificação na já conturbada política interna venezuelana. Agora, em 2023, a liderança do sucessor de Chavez, Nicolás Maduro, é contestada por órgãos internacionais. A Assembleia Constituinte instalada em 2017 não é reconhecida por vários países, incluindo o Brasil. No ano passado, a ONU denunciou que agências do governo venezuelano cometem crimes contra a humanidade para reprimir a oposição.

Uol