Bolsonaristas convocaram CPI e se deram mal
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os atos de 8 de janeiro desagradou a oposição nesta semana. Proposto pelo PL, o colegiado frustou expectativas de ligar petistas aos atos antidemocráticos e reacendeu suspeitas do envolvimento de Jair Bolsonaro (PL) em planos golpistas.
O ápice das suspeitas sobre o ex-presidente ocorreu na última quinta-feira (17/8), com o depoimento do hacker Walter Delgatti Neto. O depoente fez uma série de acusações contra Bolsonaro, que foi apontado como mandante de ações antidemocráticas (leia mais abaixo).
Ao longo dos meses, a CPMI apresentado efeito contrário ao desejado pela oposição no Congresso Nacional. Parlamentares que apoiam Bolsonaro apostavam no colegiado como uma estratégia para manchar o governo Lula.
A criação do colegiado chegou a ficar engavetada por algumas semanas no Congresso, mas foi efetivada em maio. Após uma manobra do senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), o governo conseguiu maioria na CPI e iniciou a pressão contra nomes ligados a Bolsonaro, frustrando a oposição.
Alvos do colegiado
Instalada em 25 de maio, a CPMI já ouviu 11 personagens suspeitos de participação direta ou indireta no protesto que destruiu parte dos prédios do Supremo Tribunal Federal, do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional. São eles:
Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF)
Valdir Pires Dantas Filho, perito da Polícia Civil do Distrito Federal
Renato Martins Carrijo, perito da Polícia Civil do Distrito Federal
Leonardo de Castro, delegado
George Washington de Oliveira Sousa, um dos envolvidos na tentativa de explosão de uma bomba no Aeroporto de Brasília
Jorge Eduardo Naime, ex-chefe do Departamento Operacional da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF)
Jean Lawand Júnior, ex-subchefe do Estado Maior do Exército
Mauro Cid, tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL)
Saulo Moura da Cunha, ex-diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin)
Anderson Torres, ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e ex-ministro de Bolsonaro
Adriano Machado, fotógrafo da agência Reuters
Walter Delgatti, hacker
Eventuais ligações com Bolsonaro
Silvinei Vasques foi ouvido pela CPI em 20 de junho. Indicado ao posto pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, ele negou que o cargo tenha sido usado em benefício do então chefe e também refutou manter qualquer relação pessoal com o ex-mandatário.
Vasques é investigado pelo Ministério Público Federal devido a uma operação da PRF realizada nas estradas durante o domingo do 2° turno das eleições. O ex-diretor-geral também chegou a ser intimado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para esclarecer as operações policiais relacionadas ao transporte de eleitores no segundo turno das eleições. A PRF realizou mais de 500 operações no dia, que foram suspensas só após determinação da Justiça Eleitoral.
Eduardo Naime declarou que a “ação da PM sempre foi limitada pelas Forças Armadas”. O coronel também disse ter sido impedido pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ainda durante o governo Bolsonaro, de escoltar manifestantes que iriam ao Palácio da Alvorada conversar com o então presidente, em 12 de dezembro de 2022. Segundo o militar, quando ele chegou ao local, os bolsonaristas já estavam falando com o chefe do Executivo federal
A oitiva com Jean Lawand Júnior foi convocado após serem encontradas no celular de Mauro Cid mensagens do militar pedindo ao ex-ajudante de ordens de Bolsonaro para convencer o então presidente da República e as Forças Armadas a darem um golpe de Estado.
Durante seu depoimento, Lawand tentou blindar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ou o Alto Comando do Exército de qualquer relação com as mensagens de cunho golpista. Ele não foi defendido, porém, pela maioria da bancada bolsonarista da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito.
Ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), Mauro Cid foi ouvido pela CPI em 13 de julho, mas fez uso do direito ao silêncio em praticamente toda a oitiva. Ele se recusou a responder perguntas em mais de 40 ocasiões, e se calou durante as sete horas de depoimento. Cid se recusou, inclusive, a responder questões básicas, como informar a própria idade.
Anderson Torres
Torres foi questionado sobre as acusações de omissão e conivência com os atos golpistas. O ex-ministro utilizou a ocasião para se defender sobre a minuta do golpe: “Em 10 de janeiro, durante uma busca e apreensão em minha casa, a polícia encontrou um texto apócrifo, sem data, uma fantasiosa minuta que vai para a coleção de absurdos, que, constantemente, chegam aos detentores de cargos públicos. Vários documentos vinham de diversas fontes para que fossem submetidos ao ministro”, afirmou.
De acordo com Torres, a proposta era uma “aberração jurídica” e “imprestável para qualquer fim”. O ex-secretário de Justiça também negou ter encaminhado o documento para alguma outra autoridade.
O ex-ministro de Bolsonaro foi preso em 14 de janeiro no bojo das investigações sobre possíveis omissões de autoridades durante os atos golpistas ocorridos em Brasília, no dia 8 de janeiro. Ele chefiava a Segurança Pública do DF quando ocorreram as invasões golpistas nas sedes do Congresso, Sumpremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto, mas, na data, estava em viagem de férias aos EUA. Anderson Torres cumpriu a prisão no 4º Batalhão da Polícia Militar, no Guará (DF).
Delgatti
O depoimento mais prejudicial a Bolsonaro foi o de Walter Delgatti, conhecido como hacker da Vaza Jato. Na oitiva, Delgatti afirmou que a ordem para invadir os sistemas digitais do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) teria partido da deputada Carla Zambelli (PL-SP) e de Bolsonaro. O hacker também disse que Bolsonaro teria ofertado a ele indulto similar ao que concedeu a Daniel Silveira (PTB), caso ele tivesse algum problema com a Justiça.
Questionado a respeito de quem pediu para ele assumir a autoria do suposto grampo contra o ministro Alexandre de Moraes e sobre quem o convidou para fazer propaganda eleitoral a fim de sugerir ao povo uma suposta fraude no sistema eleitoral, Delgatti respondeu: Bolsonaro.
Logo após o depoimento com as contradições que fizeram Delgatti ser convocado para novo depoimento na PF, a defesa de Bolsonaro soltou uma nota sobre as afirmações:
“Considerando as informações prestadas publicamente pelo depoente Sr. Walter Delgatti Neto perante a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito na presente data, a defesa do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, informa que adotará as medidas judiciais cabíveis em face do depoente, que apresentou informações e alegações falsas, totalmente desprovidas de qualquer tipo de prova, inclusive cometendo, em tese, o crime de calúnia”, diz a nota da defesa.
Indiciamento
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8/1, afirmou, na quinta-feira (17/8), que já existem “fortes condições” de pedir o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao fim dos trabalhos do colegiado.
Segundo Eliziane, a comissão deve pedir quebras de sigilo e documentos a órgãos de fiscalização, como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), para buscar possíveis elementos que provem a suposta participação do ex-presidente no planejamento de atos golpistas.
Metrópoles