Bolsonaro perguntou a hacker se conseguia fraudar eleição

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Foto: Reprodução

Alvo de um mandado de prisão preventiva nesta quarta-feira, o hacker Walter Delgatti relatou à Polícia Federal que o ex-presidente Jair Bolsonaro lhe perguntou se era possível invadir a urna eletrônica. O questionamento teria sido feito pelo então presidente no Palácio do Alvorada em um encontro ocorrido em agosto de 2022, conforme o depoimento de Delgatti.

Ele complementou ainda que Bolsonaro não teve relação com o acesso ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), quando um mandado de prisão falso em nome do ministro Alexandre de Moraes foi incluído no banco de dados. Este despacho fraudulento acabou motivando a operação 4FA, deflagrada hoje.

“Que apenas pode afirmar que a Deputada Carla Zambelli esteve envolvida nos atos do declarante, sendo que o declarante, conforme saiu em reportagem, encontrou o ex-Presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Alvorada, tendo o mesmo lhe perguntado se o declarante, munido do código fonte, conseguiria invadir a Urna Eletrônica, mas isso não foi adiante, pois o acesso que foi dado pelo TSE foi apenas na sede do Tribunal, e o declarante não poderia ir até lá, sendo que tudo que foi colocado no Relatório das Forças Armadas foi com base em explicações do declarante”, diz trecho do inquérito policial. A reportagem citada foi publicada pela revista “VEJA” em agosto de 2022 e mostra fotos do hacker indo ao Palácio da Alvorada.

Delgatti e a deputada Carla Zambelli (PL-SP) são os dois principais investigados da operação. A parlamentar foi alvo de mandados de busca e apreensão, enquanto Delgatti foi preso preventivamente.

As invasões no sistema do CNJ ocorreram entre os dias 4 e 6 de janeiro de 2023, quando foram inseridos onze alvarás de soltura de pessoas presas por diferentes delitos, além do despacho em desfavor de Moraes. A aproximação dos dois suspeitos, no entanto, ocorreu durante a eleição presidencial do ano passado, segundo as investigações.

Conhecido por hackear o celular de autoridades da Operação Lava Jato, Delgatti contou à PF que Carla Zambelli passou a contatá-lo, “pois queria que ele invadisse a urna eletrônica ou qualquer sistema da Justiça brasileira para demonstrar a fragilidade do sistema judicial pátrio”.

Em um segundo momento, Delgatti diz que Zambelli lhe pediu para “obter conversas comprometedoras” de Alexandre de Moraes.

“A deputada disse que, caso o declarante não conseguisse invadir a urna, que conseguisse obter conversas comprometedoras do ministro Alexandre de Moraes, invadindo seu aparelho telefone celular e seu e-mail”, diz a transcrição do depoimento de Delgatti. “A deputada disse que, caso o declarante conseguisse invadir os sistemas, teria emprego garantido, pois estaria salvando a democracia, o país, a liberdade”.

No depoimento, o hacker ainda afirmou que o texto do falso mandado de prisão contra Moraes foi redigido por Zambelli e “vazado” por ela à imprensa.

“Disse à deputada que conseguiria emitir um mandado de prisão em desfavor do próprio ministro, como se fosse ele mesmo emitindo, a deputada ‘ficou empolgada’, fez o texto e enviou para o declarante publicar”, diz a transcrição.

Segundo Delgatti, os serviços prestados à deputada do PL foram renumerados por ela. À PF, o hacker afirmou que foi pago por um assessor dela no valor de R$ 3.000 para “ficar à disposição” dela. Delgatti também entregou os extratos bancários de sua empresa – Delgatti Desenvolvimento de Sistemas — aos investigadores, que constaram um repasse total de R$ 13.500 efetuado por dois servidores de Zambelli.

Os dois servidores também foram alvos de busca e apreensão nesta quarta-feira.

O caso da invasão ao sistema do CNJ começou a tramitar na Justiça Federal, mas “subiu” para o Supremo em função do suposto envolvimento de Zambelli, que tem prerrogativa de foro privilegiado. No Twitter, o ministro da Justiça, Flávio Dino, escreveu que as ações ocorrem “no contexto dos ataques às instituições”.

Em entrevista coletiva nesta quarta-feira, a deputada federal Carla Zambelli reconheceu que tem “relação” com o hacker, a quem ajudou a ir a Brasília para um encontro com o ex-presidente Jair Bolsonaro e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto. Ela afirmou ainda que a invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça para incluir um mandado de prisão falso do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi uma “brincadeira de mau gosto”.

— O que tenho de relação com o Walter é que o conheci, saindo de um hotel. Vivia trocando de telefone, queria falar ao vivo. Nos vimos 3 vezes e conversamos sobre tecnologia. Uma vez o ajudei a vir a Brasilia, ele disse que teria provas e serviços a oferecer ao PL e o levei a Valdemar da Costa Neto, fizemos uma reunião — disse a deputada.— Ele (Delgatti) se ofereceu para participar de uma espécie de auditoria no primeiro e segundo turno das eleições. Ele encontrou Bolsonaro, que perguntou se as urnas eram confiáveis. Nunca mais houve contato entre eles.

O Globo