CPIs do MST e do Golpe focam em GDias
Foto: Brenno Carvalho
Exonerado por suspeita de omissão no 8 de janeiro, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência (GSI) general Gonçalves Dias foi o personagem principal, ontem, de duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) no Congresso. O ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Saulo Moura Cunha afirmou, em oitiva no colegiado que apura os Atos Golpistas, que mandou alertas a GDias, como é conhecido, sobre a possibilidade de uma ação extremista como a que acabou ocorrendo naquela data. Já na comissão que mira a atuação do Movimento dos Trabalhadores Sem terra (MST), onde prestou depoimento, o ex-chefe do GSI foi pivô de um bate-boca entre o relator, deputado Ricardo Salles (PL-SP), e a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR).
Ao comparecer à CPI dos Ataques, Cunha afirmou que o registro de que GDias havia recebido os alertas chegou a ser formalizado em um documento, depois arquivado por ordem do próprio general, segundo o ex-diretor da Abin. Cunha estava à frente da agência no dia 8 de janeiro.
— Fiz os dois relatórios. O primeiro continha os alertas encaminhados pela Abin a grupos e também os alertas encaminhados por mim pessoalmente ao ministro-chefe do GSI. Entreguei essa planilha ao ministro, e ele determinou que fosse retirado o nome dele dali, porque não era o destinatário oficial daquelas mensagens, e que ali fosse mantido apenas as mensagens encaminhadas para os grupos de WhatsApp. Eu obedeci a ordem.
A alteração dos registros originou dois relatórios com informações distintas sobre os destinatários dos alertas: um com e outro sem o nome de GDias. A edição do documento, com a extração do nome de GDias, foi revelada em maio pela colunista do GLOBO Malu Gaspar. Em depoimento à CPI da Câmara Legislativa do Distrito Federal, em junho, o militar negou adulteração do material.
— A Abin respondeu (a solicitação do Congresso) com um compilado de mensagens de aplicativo. Esse documento tinha lá ‘ministro do GSI’. Eu não participei de nenhum grupo de WhatsApp, eu não sou o difusor daquele compilado de mensagens. Então aquele documento não condizia com a realidade. Esse era um documento. Ele foi acertado e enviado — disse na ocasião.
De acordo com Cunha, o documento com o registro de que GDias recebeu alertas foi arquivado na Abin em caso de necessidade de “consulta futura”. Ele refutou que tenha adulterado informações e reiterou que a mudança ocorreu por ordem do então ministro. Segundo o oficial de inteligência, a Abin difundiu para diversos órgãos do governo 33 alertas citando, entre outros pontos, a “detecção ao estímulo de invasões”.
Mais tarde, durante depoimento à CPI do MST, GDias afirmou que a Abin ficou subordinada ao GSI do início do governo até 1º de março e que, nesse período, não recebeu “pelo correio Sisbin nenhum relatório” sobre os atos. O ex-ministro fez referência ao Sistema Brasileiro de Inteligência, que reúne diferentes órgãos de inteligência de governo e que, no entendimento dele, seria o canal oficial para a difusão de informações do tipo. Ele não tratou dos “alertas” citados pelo ex-chefe da Abin. Procurada, a defesa de GDias não se manifestou.
— Não recebi nenhum relatório pelo sistema Sisbin no período em que a Abin ficou sob minha gestão — afirmou Dias.
Cunha acrescentou que o então ministro foi avisado também por telefone, cerca de uma hora antes da invasão das sedes dos três Poderes. Mais cedo, por volta das 8h, disse que havia tratado com ele sobre as movimentações de ônibus. Segundo Cunha, GDias respondeu: “Acho que vamos ter problemas”.
Ontem GDias compareceu na CPI do MST e seu depoimento terminou em bate-boca. Ao ser questionado pelo relator, Ricardo Salles, sobre como classifica a ditadura militar, o ex-ministro não respondeu, afirmando que o assunto não era objeto da comissão. O relator, no entanto, insistiu na pergunta repetidas vezes.
— Quero apenas entender se você faz parte da ala que considera revolução ou golpe — disse Salles.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, saiu em defesa do ex-ministro, afirmando que a pergunta não tinha pertinência, e foi rebatida pelo relator:
— A senhora fala na sua vez.
O bate-boca se estendeu por mais de dez minutos.
— Seus colegas, unanimemente, defendem a ação de 1964. Vou perguntar novamente, é a última oportunidade — prosseguiu Salles.
Mesmo assim, GDias insistiu em não responder.
— Deputado, isso não é objeto da comissão. O Exército pauta a sua conduta em cima da hierarquia, disciplina e cadeia de comando, amalgamado pelos valores éticos — afirmou o ex-chefe do GSI, que foi aplaudido pela ala governista.
Ao retomar os trabalhos ontem após o recesso parlamentar, a CPI do MST aprovou a convocação do ministro da Casa Civil, Rui Costa. A ofensiva ocorre em meio à nova temporada de invasões dos sem-terra.