Zambelli vai calar em depoimento à PF
Foto: Hugo Barreto/Metrópoles
A deputada Carla Zambelli (PL-SP) foi alvo da Polícia Federal (PF) nesta semana em operação que investiga um ataque hacker aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e de tribunais.
Segundo as investigações, a invasão foi feita “com a utilização de credenciais falsas obtidas de forma ilícita”. A parlamentar pode responder pelos crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica.
A operação prendeu preventivamente Walter Delgatti, conhecido como hacker da Vaza Jato e suposto responsável pelas invasões. Ele afirmou à PF que teve um encontro com Jair Bolsonaro (PL). Na ocasião, o então presidente perguntou se seria possível invadir o sistema das urnas eletrônicas.
Zambelli prestaria depoimento à PF na última quinta-feira (3/8), mas alegou que tinha uma viagem marcada e pediu que a oitiva fosse adiada para esta segunda-feira (7/8). Em nota, sua defesa afirma que Zambelli ficará em silêncio se não receber os autos do processo até o horário do depoimento, às 14h.
“Embora a deputada queira ser ouvida e prestar todos os esclarecimentos – justamente por não ter cometido ou participado de qualquer ilicitude – sobre os fatos relativos à operação deflagrada nesta semana, por expressa orientação da defesa técnica, não responderá às perguntas até que sejam fornecidas cópias de todo o Inquérito e das cautelares – o que ainda não ocorreu –, justamente para assegurar a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal.”
A parlamentar terá de explicar à PF qual sua relação com Delgatti. Em coletiva de imprensa realizada na data da operação, Zambelli afirmou que manteve contato com o hacker durante certo tempo, e que chegou a se encontrar com ele três vezes.
“O que tenho de relação com o Walter é que o conheci saindo de um hotel. Ele vivia trocando de telefone, eu queria falar ao vivo. Nos vimos três vezes e conversamos sobre tecnologia”, disse.
Em sua decisão, Moraes autorizou a polícia a analisar o conteúdo de aparelhos eletrônicos que foram apreendidos, como dados, arquivos eletrônicos, mensagens eletrônicas e e-mails, que esteja armazenado em computadores, servidores, redes, “inclusive serviços digitais de armazenamento em nuvem”.
Conforme noticiou a coluna de Paulo Cappelli, do Metrópoles, Delgatti escondia, atrás de um quadro em sua casa, um pen-drive com os dados que conseguiu do sistema do CNJ. Em um período de três meses, Delgatti copiou todos os códigos-fonte, as senhas de bancos de dados e chaves de acesso do sistema do CNJ.
Em junho deste ano, o hacker havia sido preso por descumprir medidas judiciais. Ao receber a PF em sua residência, Delgatti perguntou se o motivo da presença dos agentes seria “a investigação do CNJ”.
Em sua delação, Delgatti afirmou que Zambelli o contratou para invadir as contas de e-mail e o telefone do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele teria conseguido acessar o e-mail, mas não encontrou nada “comprometedor”, e não conseguiu invadir o celular.
Em depoimento, o hacker contou que a deputada fez o pedido em um encontro na Rodovia dos Bandeirantes, na capital paulista, em setembro de 2022.
Os dados das transações financeiras acessados pela PF mostram que Delgatti recebeu R$ 13,5 mil, via Pix, de pessoas próximas à deputada federal. Um contrato obtido pela investigação pode revelar que dinheiro público talvez tenha sido utilizado nesse pagamento.
“Os pagamentos foram sempre relacionados ao site, para fazer melhorias no site. Não foi da minha cota. Todo dinheiro foi de empresa que eu subcontratei, e essa empresa pagou, mas do meu bolso, não da cota”, disse Zambelli.
Apesar das afirmações, os dados de transparência da Câmara dos Deputados revelam que, de outubro de 2022 a abril deste ano, um total de R$ 94 mil foi pago por Zambelli a um serviço de divulgação parlamentar, cuja dona é Monica Romina Santos de Sousa, esposa de Jean Hernani Guimarães Vilela, assessor da deputada e responsável por parte do pagamento ao hacker. Ao todo, foram sete pagamentos de R$ 9 mil por mês.
Segundo Delgatti, Zambelli teria levado o hacker a uma reunião com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, para discutir a possibilidade de ele integrar uma equipe de consultores contratados para fiscalizar as urnas eletrônicas.
Suspeita de ter pedido que Delgatti invadisse as urnas, Zambelli terá de explicar à PF o por quê de ter convocado o hacker e qual a sua intenção em criar uma equipe de consultores.
Zambelli também terá de detalhar aos policiais o encontro que articulou entre o então presidente, Jair Bolsonaro (PL), e Delgatti.
“Uma vez, o ajudei a vir a Brasília, ele disse que teria provas e serviços a oferecer ao PL e o levei a Valdemar da Costa Neto. Fizemos uma reunião”, admitiu a parlamentar. “Ele [Delgatti] se ofereceu para participar de uma espécie de auditoria no primeiro e segundo turno das eleições. Ele encontrou Bolsonaro, que perguntou se as urnas eram confiáveis. Nunca mais houve contato entre eles”, acrescentou.
O delator teria respondido a Bolsonaro que “isso não foi adiante, pois o acesso dado pelo TSE [Tribunal Superior Eleitoral] foi apenas na sede do tribunal”, e Delgatti não poderia ir lá. A reunião teria ocorrido no Palácio do Planalto.
O nome 3FA é uma referência à autenticação de dois fatores (2FA), que é um protocolo de segurança de gerenciamento de identidade e acesso com a exigência de duas formas de identificação. Só assim, o usuário consegue acessar dados. No caso dos investigados, foi preciso a atuação da PF, do MPF e do Judiciário contra a ação dos criminosos.