Zanin e Weber levam à campanha por trabalhista no STF

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Foto: Carlos Moura/SCO/STF

Com a saída de Marco Aurélio Mello, a presidente Rosa Weber se tornou a única dos integrantes do Supremo Tribunal Federal com origem trabalhista – ambos são oriundos do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Além disso, seus votos demonstram tendência pró-trabalhador ao contrário da maioria da corte. Com isso, magistrados, procuradores, advogados e sindicalistas vêm pedindo a Lula que indique alguém da área para substitui-la após sua a aposentadoria, que ocorrerá no mês que vem.

Os votos do ministro Cristiano Zanin contrários à descriminalização do uso de maconha e à equiparação de homotransfobia à injuria racial e a favor de cadeia para furto de valores insignificantes aumentaram a pressão para que o presidente escolha uma mulher para a vaga de Weber. De preferência negra e progressista. Mas, para esse grupo, Lula precisa ir além.

“O caráter social da Constituição tem sofrido ataques e os direitos dos trabalhadores tem sido esvaziados. Infelizmente, o cenário que já não era positivo no STF piora muito com a saída de Rosa Weber”, afirma a constitucionalista e professora da FGV Direito-SP, Eloísa Machado. “Seria de se esperar que um governo preocupado com a dignidade do trabalho escolhesse nomes comprometidos com os direitos dos trabalhadores para compor o STF. Entretanto, a indicação de Zanin mostra um desvio neste propósito”, avalia.

A coluna também conversou com fontes no TST e em Tribunais Regionais do Trabalho, no Ministério Público do Trabalho e advogados. Em comum, afirmam que junto com a questão da representatividade de gênero e raça, seria importante que Lula não deixe a proteção aos trabalhadores sair enfraquecida com sua escolha.

Avaliam que tanto o valor social do trabalho quanto a livre iniciativa são princípios fundamentais da República, mas que o primeiro está menos representado no STF do que o segundo.

O Anuário da Justiça do site Consultor Jurídico analisou a tendência de votos dos ministros da corte, em 2022, e apontou que, com exceção de Weber e de Edson Fachin, que foram pró-trabalhador em 71% dos casos analisados, os outros nove ministros proferiram mais votos pró-empresa. Desses, oito foram pró-empresa em 80% ou mais dos casos

“A ministra Rosa Weber tem sido um voto importante para a proteção dos trabalhadores. Vai fazer muita falta, principalmente se o presidente não indicar alguém com uma visão que garanta pluralidade à corte”, afirmou um procurador do MPT que pediu reserva quanto ao nome.

Uma fonte ouvida no TST foi pelo mesmo caminho. “É evidente a preocupação de Lula no combate à fome e à desigualdade. Para alcançar isso, a única forma é com a promoção de direito e cidadania econômica por meio do trabalho, uma vez que a imensa maioria dos cidadãos sobrevive do seu trabalho”, afirma.

Em uma carta ao presidente Lula neste mês, os presidentes da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), da Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho (ANPT) e da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat) pediram a nomeação de uma mulher vinculada ao direito do trabalho no lugar de Weber.

Defendem no documento que a indicação de uma mulher que esteja imbuída do “genuíno propósito de assegurar a concretude dos direitos sociais, fundamentais e humanos, é imprescindível à manutenção no STF de um viés interpretativo de valorização do trabalho e de fortalecimento do sistema de justiça trabalhista”.

Um advogado trabalhista com livre trânsito no Palácio do Planalto afirma que até o ex-presidente Jair Bolsonaro entendeu a importância da discussão sobre o direito do trabalho no STF. E, com isso, quase indicou o conservador ministro do TST Ives Gandra Martins Filho para uma das duas vagas abertas. Ele é conhecido por suas posições pró-empresa.

Ao final, Martins Filho foi preterido pela indicação dos ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça. Mas bateu na trave.

Os ouvidos afirma que há em curso uma campanha contra o ramo do Poder Judiciário que trata de questões trabalhistas e que indicar alguém sensível aos pleitos de trabalhadores seria uma sinalização positiva de Lula, um ex-sindicalista e fundador do Partidos dos Trabalhador, para reforçar sua importância.

Lembram que Lula, que tanto criticou pontos da Reforma Trabalhista durante a eleição, deveria levar em conta que Rosa Weber e Edson Fachin têm sido as vozes críticas em casos de análise da reforma que chegam ao STF – mesmo que, por vezes, sejam votos derrotados.

Magistrados e procuradores apontam que há temas candentes que vão demandar decisões do STF, como a questão do trabalho para plataformas digitais.

“Há quem no Supremo encare entregadores como empreendedores livres. Mas esse ‘empreendedor livre’ está com uma bicicleta alugada do Itaú, levando uma caixa com o nome da iFood, transportando um lanche com fome, porque não terá tempo de parar para comer”, afirma um magistrado trabalhista.

A questão não se resolve com a indicação de um ministro ou uma ministra, claro. Tanto que uma das falhas mais apontadas pelos ouvidos pela coluna é a falta de juízes auxiliares no STF que sejam oriundos da área trabalhista. Mas já seria um alento.

“É essencial que alguém comprometido com o constitucionalismo social seja indicado no lugar de Rosa Weber”, resume Eloísa Machado.

Rosa Weber completa 75 anos no próximo dia 2 de outubro, o que torna sua aposentadoria compulsória. Lula não tem prazo para indicar uma substituta ou um substituto. O ministro Ricardo Lewandowski se aposentou em 11 de abril e Cristiano Zanin tomou posse apenas em 3 de agosto.

Uol