Conservadorismo radical do brasileiro está diminuindo
Foto: Arte / O Globo
Após a emergência de uma nova direita no país e quase um ano depois da eleição presidencial mais polarizada desde a redemocratização, eleitores brasileiros seguem convictos em suas posições sobre temas polêmicos da agenda de costumes. A pesquisa “A Cara da Democracia”, feita entre 22 e 29 de agosto pelo Instituto da Democracia (IDDC-INCT), com financiamento do CNPq, Capes e Fapemig, reforça que há uma prevalência de avaliações conservadoras, mais identificadas com a direita, na sociedade. A depender da discussão, porém, a opinião fica mais dividida e uma parcela significativa da população se mostra favorável à diversidade, bandeira tradicionalmente associada a pautas da esquerda.
Os dados mostram que uma expressiva maioria da população segue a favor da redução da maioridade penal (65%), é contrária à legalização do aborto (79%) e rejeita a descriminalização das drogas (70%). Enquanto há queda ano a ano entre os que defendem punir criminalmente adolescentes — em 2018, esse índice chegava a 81% —, o movimento é o oposto nas temáticas de liberação do aborto e da flexibilização das drogas. Houve crescimento, respectivamente, de seis e quatro pontos percentuais entre os que se manifestam contra essas medidas em relação a 2022.
A tendência ocorre em um momento em que a legalização das drogas ganha visibilidade no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte retomou no mês passado o julgamento que pode descriminalizar o porte pessoal de maconha no país. A presidente do STF, Rosa Weber, também já sinalizou que pretende pautar uma ação que questiona a criminalização do aborto no início da gestação antes de se aposentar, em outubro.
A pesquisa revela que a maioria dos eleitores que afirmam gostar muito do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é contra legalizar as drogas. Nesse grupo, o índice é de 71%. Já entre os eleitores que afirmam gostar muito do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o percentual vai a 83%.
Recentemente, o voto do ministro Cristiano Zanin, indicado por Lula ao STF, contra a descriminalização do porte pessoal da maconha desagradou a militância petista e mais à esquerda. O tema da ação, delimitada na maconha, não é exatamente o mesmo da pesquisa, que perguntou sobre legalizar todas as drogas, mas os dados reforçam que há uma visão conservadora sobre a pauta mesmo no segmento da população que simpatiza com o atual presidente.
Apesar da resistência à legalização do aborto, a maioria dos brasileiros se posiciona contra a prisão de mulheres que interrompem a gravidez (59%). A parcela da população que pensa assim subiu nove pontos percentuais desde 2018.
Também fica mais próxima de uma maioria a defesa da adoção de crianças por casais gays. O percentual dos que são favoráveis à adoção soma 53%. Esse índice já foi de 37% há apenas cinco anos, quando mais da metade da população era contra a adoção (52%).
O casamento civil entre pessoas do mesmo sexo registra apoio menor e polariza ainda mais o país: hoje são 46% a favor, enquanto 44% são contra. Outros 3% optaram por um meio termo e responderam que sua posição “depende”.
A distância entre os favoráveis e contrários ao casamento gay já foi maior. Essa parcela era 49% em agosto de 2022, contra 43% dos que se posicionam contra o casamento de pessoas do mesmo sexo. Por outro lado, em 2018, apenas 38% dos brasileiros se diziam favoráveis ao casamento gay.
Os dados da pesquisa mostram comportamento oposto entre eleitores que dizem gostar muito de Lula e aqueles que mostram simpatia por Bolsonaro. Os mais simpáticos ao petista apoiam em peso o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo (60% a favor e 38% contra) e a adoção por essas famílias (63% a favor e 35% contra). Já entre os mais identificados com o ex-candidato do PL os percentuais são invertidos: 69% são contra o casamento civil de gays e lésbicas, e 60% se opõem à adoção por esses casais.
Um tema em que os brasileiros estão mais alinhados à esquerda no espectro político é o das privatizações no setor público. A população contra a medida soma 53%, enquanto 29% se mostram favoráveis. O segundo grupo caiu nos últimos anos. Em agosto do ano passado, chegava a 39% da população.
A pesquisa “A Cara da Democracia” foi feita com 2.558 entrevistas presenciais de eleitores em 167 cidades, de todas as regiões do país, entre 22 e 29 de agosto. O Instituto da Democracia (IDDC-INCT) reúne pesquisadores das universidades UFMG, Unicamp, UnB e Uerj. A margem de erro é estimada em dois pontos percentuais para mais ou menos e o índice de confiança é de 95%.