País vive surto de homofobia
Foto: Breno Esaki/Metrópoles
No primeiro semestre de 2023, as denúncias de homofobia no país aumentaram 90,27% em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo o Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos. Foram registradas 1.076 denúncias de janeiro a junho deste ano, enquanto nos meses de julho e agosto mais 597 casos foram adicionados à estatística. Em 2022, as denúncias somavam 565 no primeiro semestre, chegando a 1.906 até o final do ano.
A homofobia é um termo que descreve o preconceito, a aversão e a discriminação direcionados a indivíduos com base em sua orientação sexual, particularmente aqueles que fazem parte da comunidade LGBTQIAP+. Ela se manifesta desde insultos e piadas ofensivas até agressões físicas e exclusão social.
Lei para homofobia
Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero ao crime de racismo. Além disso, determinou que crimes motivados por homofobia ou transfobia devem ser considerados hediondos, ou seja, especialmente graves. O STF também instou o Congresso a transformar essas decisões em leis para garantir a proteção completa da comunidade LGBTQIAP+.
Segundo Gustavo Coutinho, advogado e professor, membro do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero (GADvS), as denúncias de homofobia não são tratadas da forma correta pelo sistema legal.
“Infelizmente, a política criminal voltada para o combate da homotransfobia ainda é dependente da vontade individual de gestores, que ainda não compreendem estas ações como advindas de uma obrigação constitucional. Assim, cada estado possui um modelo de registro de ocorrências diferente”, explica o advogado.
Embora a lei já reconheça a homofobia como um crime, muitas pessoas da comunidade LGBTQ+ não se sentem seguras para denunciar incidentes, devido a obstáculos que dificultam a aplicação da jurisprudência.
“É preciso garantir uma uniformização das normativas na segurança pública e no Sistema de Justiça, em âmbito nacional. Além disso, é necessário investir em formação continuada e periódica para os profissionais destes sistemas, realizar campanhas informativas e responsabilizar os espaços que cometem violência institucional. No Brasil, ainda não temos uma política nacional para a população LGBTI+. Precisamos garantir não só o combate aos crimes de ódio, mas a promoção dos direitos sociais, como acesso à educação, à saúde e ao mundo do trabalho”, explica Coutinho.
O maquiador carioca, Dian Angelo, de 21 anos, é uma pessoa não-binária e performa como drag em algumas ocasiões. Ele relata já ter passado por inúmeros episódios de homofobia> mas um, em especifico, o marcou.
“Ano passado eu estava indo para um curso, maquiado, e um cara começou a me ameaçar com um pedaço de madeira, dizendo que era um absurdo o jeito que eu estava. Ele gritava alto, de forma agressiva”, conta Dian.
O jovem relata que, a cada situação de preconceito que passa, menos vontade tem de sair de casa. “Eu acabo ficando cada vez mais recluso, por não me sentir seguro. Não posso vestir as roupas que eu quero. Eu nunca consegui sair montada sem sofrer preconceito. Sempre escuto xingamentos ou ameaças. Já recebi mensagens de pessoas desejando a minha morte”, desabafa.
Nem durante a infância Dian escapou de ataques homofóbicos. “Eu tinha dois melhores amigos de infância, héteros, que se afastaram de mim com o tempo. Uma parte de mim acha que foi o fato de eu fazer parte da comunidade LGBT. Na escola eu sofri bastante homofobia também. Uns meninos já jogaram pedras em mim, na saída da escola, somente por eu ser afeminado”.
Apesar de todos os obstáculos, Dian afirma ser feliz do jeito que é. “Me amo do jeitinho que eu sou, não mudaria nada, mesmo com o preconceito. Eu estou aqui, dando a cara a tapa e recebendo todas essas porradas, para que lá na frente outras pessoas não recebam elas tão fortes. Seguimos na luta”, diz.
Das 1.973 denúncias de homofobia entre janeiro e agosto deste ano, 476 ocorreram na casa da vítima e 19 na casa de familiares. João (nome fictício) relata o impacto da família ao descobrir que ele é gay.
“Ninguém me aceitou. Eu lembro que apontaram o dedo pra mim e falaram que eu ia para o inferno, falavam ‘você é um bicho, você é um monstro, você tem que morrer’. Até hoje, depois de alguns longos anos, eles ainda não me aceitam. Eu tenho medo de ser quem eu sou. Dentro de casa, principalmente”, conta.
O ator Victor Meyniel foi espancado na portaria de um prédio, no sábado (2/9), em Copacabana. O episódio é considerado um crime de homofobia.
Ele teria conhecido o agressor em uma boate na zona sul do Rio de Janeiro. Imagens de uma câmera de monitoramento mostram o momento em que um homem, identificado como Yuri de Moura Alexandre, agride brutalmente o ator, enquanto o porteiro observa a cena sem tomar nenhuma providência.
Segundo o advogado de Victor, Ricardo Brajterman, ele foi se despedir na portaria do prédio, mas Yuri não gostou da “exposição” e teria tido o ataque de fúria.
O ator, juntamente com a mãe, Regina Meyniel, prestou queixa na 12ª DP. Victor Meyniel passou por exames de corpo de delito no IML. O caso segue sendo investigado.
Delegacias: As delegacias devem atender todas as vítimas de homofobia e é necessário registrar um Boletim de Ocorrência.
190: Número da Polícia Militar para serviço telefônico. Funciona 24 horas por dia.
Disque direitos humanos: Disque 100 – O atendimento acontece também via telefone. A ligação é gratuita funciona em todo território brasileiro, 24 horas por dia, sete dias por semana.