STF vai ignorar PGR enquanto Aras não sair

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Foto: Pablo Jacob

Após se opor ao acordo de delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, a Procuradoria-Geral da República (PGR) discute entrar com um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para contestar a decisão do ministro Alexandre de Moraes, que homologou a colaboração no sábado. De acordo com integrantes do órgão ouvidos pelo GLOBO, esse recurso, porém, não deve ser apresentado agora, mas após a fase de apresentação de provas pelo ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. A intenção é avaliar antes se elas serão úteis para uma eventual denúncia, agregando algo ao que já se sabe.

Por isso, de acordo com esses integrantes da PGR, é improvável que a apresentação do recurso ocorra ainda sob a gestão de Augusto Aras, cujo mandato termina no próximo dia 26, deixando uma decisão sobre o tema a cargo do procurador-geral da República escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem em Bolsonaro seu principal adversário político. Os nomes favoritos nesta disputa são os subprocuradores Paulo Gonet e Antônio Carlos Bigonha.

Como mostrou O GLOBO, o presidente indicou a aliados que pretende acelerar a escolha de um nome para a vaga, como forma de evitar que o cargo seja ocupado por muito tempo em um “mandato-tampão”. Caso não haja uma definição até o dia 26, quem assume de forma interina é a subprocuradora-geral da República Elizeta Ramos, eleita na semana passada vice-presidente do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF).

No sábado, após a decisão de Moraes de homologar o acordo entre Cid e a PF, Aras publicou uma mensagem nas redes sociais na qual afirma que a PGR “não aceita delações conduzidas pela Polícia Federal” e criticou colaborações feitas pela Lava-Jato, como as do ex-ministro Antonio Palocci e do ex-governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral.

Apesar de se manifestar contrariamente ao acordo, a PGR tem a função de supervisionar a colaboração e, já no sábado, instaurou um procedimento interno para acompanhar as tratativas. Responsável por atuar nos casos que tramitam no STF, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, pediu acesso aos documentos relacionados à delação de Cid.

A posição contrária a delações firmadas pela PF não é uma exclusividade da atual gestão da PGR. Historicamente, o Ministério Público é contrário à possibilidade de delegados negociarem benefícios com investigados, sob o argumento de que essa competência é privativa dos procuradores. Em 2016, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, recorreu ao Supremo contra a possibilidade de o ex-ministro Antonio Palocci fechar uma colaboração do tipo. O recurso, contudo, foi rejeitado pela Corte.

Em 2021, outro acordo firmado pela PF foi questionado pela PGR: o caso envolvia a delação do ex-governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral. Na época, a maioria dos ministros votou para anular a delação sob o argumento de que havia ilegalidades naquela específica, mas manteve o entendimento de que a PF pode realizar este tipo de tratativa.

A crítica de Aras à decisão de Moraes sobre a delação premiada de Cid é mais um capítulo da série de embates entre o chefe da PGR e o ministro do STF. Um dos episódios de maior acirramento ocorreu após o pedido de arquivamento do inquérito dos atos antidemocráticos, em 2021, que tinha como alvo aliados de Bolsonaro.

À época, a procuradoria argumentou que o caso estava parado havia um ano sem que a PF produzisse provas contra os parlamentares investigados. Por entender que havia elementos suficientes para o prosseguimento do caso, Moraes decidiu tirar o sigilo do inquérito e expor tudo o que havia sido coletado. Em seguida, pediu esclarecimentos à PGR sobre os motivos de querer arquivar tudo.

O Globo