Gestão Doria: Área social é uma das mais atingidas por cortes

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No primeiro ano da gestão de João Doria (PSDB) como governador, a área social foi uma das mais penalizadas por cortes de gastos orçados no estado de São Paulo.

A gestão deverá terminar o ano com R$ 108 milhões a menos que o planejado para a área, que abriga programas como Bom Prato, Viva Leite e atendimentos a adolescentes e idosos em situação de vulnerabilidade.

Seguindo uma trajetória de redução nos últimos anos, num contexto de aumento do desemprego e da pobreza, os gastos programados em 2019 para a função assistência social caíram de R$ 833 milhões para R$ 725 milhões, uma variação negativa de 13%. A única área que perdeu percentual maior foi a do trabalho, onde houve redução de 25%.

Por outro lado, os orçamentos de saúde, educação e segurança foram poupados por Doria. O governo diz que receitas superestimadas pela gestão de Márcio França (PSB) motivaram os ajustes.

O programa que sofreu o maior arrocho, na comparação com o valor previsto, foi o Vivaleite, que distribui leite para crianças e idosos em situação de vulnerabilidade. O orçamento de R$ 222 milhões caiu para R$ 173 milhões –dos quais foram gastos R$ 104 milhões até o momento.

Outros programas que terminarão 2019 com menos dinheiro que orçado inicialmente são o Renda Cidadã, Proteção Social Especial de Alta Complexidade, Ação Jovem e Bom Prato –somados, eles terão R$ 62 milhões a menos, se o novo orçamento for cumprido.

Apesar do ajuste, o Bom Prato, uma vitrine tucana, ainda tem orçamento maior que o de 2018, com a criação uma nova unidade em São Bernardo do Campo (Grande SP) e previsão de outras duas. No entanto, os R$ 8 milhões contingenciados parecem estar fazendo falta, uma vez que nem sempre as as unidades existentes têm dado conta da demanda cada vez maior.

Na tarde desta quarta-feira (9), a unidade dos Campos Elíseos passou a barrar a entrada antes do fim do horário mínimo previsto, às 13h, porque acabaram as cotas de refeições para aquele dia. O segurança do lugar culpou as pessoas que repetem os pratos e o fato de ser dia de feijoada.

A desempregada Regina Soares, 58, saiu de lá dizendo que pediria para alguém na rua pagar uma refeição para ela. “Quando não consigo aqui, o jeito é pedir”.

Usuários afirmaram à Folha que é comum nesta e em outras unidades que parte das pessoas não sejam atendidas. Na recém-criada unidade de São Bernardo, chegou a ser colocada uma placa avisando que, quando as senhas acabassem, não seriam mais distribuídas refeições, mesmo durante o horário de funcionamento normal.

Os cortes na área social vêm sendo rotineiros nos últimos anos e se acentuaram após a crise econômica. Em 2013, as despesas na área social chegaram a quase R$ 1,3 bilhão, em valores corrigidos pela inflação. No ano passado, foram liquidados R$ 743 milhões, em valores atualizados.

Desde então, as despesas na área só vêm caindo –em 2019, no décimo mês do ano, o governo efetivamente gastou R$ 458 milhões com assistência social. Se conseguir cumprir o orçamento, o que é improvável, ainda assim gastará quase R$ 20 milhões a menos que em 2018.

A presidente do Cress-SP(Conselho Regional de Serviço Social de São Paulo), Kelly Melatti, afirma que a área social é sempre a primeira a sofrer os cortes. “Por que isso acontece? É porque a assistência social lida com uma população que nem sempre é ouvida, desempregada, vítima de violência”, diz.

De acordo com ela, os municípios menores são especialmente dependentes do estado para a aplicação de políticas sociais.

Ela cita como exemplo da invisibilidade dos atendidos por essas verbas o contingenciamento no programa de proteção de alta complexidade. “São serviços que atendem populações de rua, atendimento institucional para crianças e adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, serviços para as pessoas que não possuem respaldo familiar”.

Doria tenta se cacifar para disputar a Presidência da República em 2022 e investe em ações de visibilidade. Isso inclui desfazer medidas malvistas pela sociedade.

No início do ano, ele desistiu de fazer contingenciamento de 18% na pasta de Cultura após mobilização de personalidades do mundo cultural.

Saneamento, habitação e direitos da cidadania também estão entre as pastas que terão menos dinheiro.

Além de saúde e educação, a segurança, uma das apostas de Doria no seu projeto presidencial, foi poupada do facão. Os transportes, calcanhar de Aquiles do tucanato devido a atrasos nas obras do metrô, tiveram aumento de 5%.

Comunicação teve um contingenciamento de 8%, mas, ainda assim, deve superar em mais de R$ 30 milhões o valor efetivamente gasto em 2018.

Os gastos nessa área são criticados pela oposição. “O governo pode não fazer absolutamente nada, mas tem outdoor”, disse em plenário o deputado Paulo Fiorilo (PT).

Para o ex-governador Márcio França, as mudanças no orçamento, incluindo cortes na área social, refletem a visão de mundo do governador João Doria, vitoriosa nas eleições disputadas contra ele.
Ele cita contingenciamento do Vivaleite. “Ele [Doria] fez a redução na prefeitura, porque, sinceramente, quem não toma leite pode não entender a necessidade”, disse.

França afirmou ainda que o projeto enviado por ele foi modificado pela base do tucano, que tinha ampla maioria na Assembleia Legislativa, e que deixou verba em caixa.

O ex-governador citou medidas em que governo renuncia a receitas, para reforçar o argumento de que as contas estavam em ordem. “Fizeram uma redução de ICMS de combustível de avião [de 25% para 12%]”, exemplificou França. “Essas reduções só podem ser feitas com as contas equilibradas”.

A gestão Doria afirma que “receitas incertas e superestimadas” pela administração anterior levaram a gestão a tomar medidas para reduzir o déficit orçamentário de 2019, estimado em R$ 10,5 bilhões”.

Segundo o governo, foi feito um contingenciamento de R$ 5,7 bilhões para preservar serviços como saúde, educação e segurança. “Exceto essas três áreas, outras precisaram reajustar orçamentos”, afirma a gestão em nota.

Posteriormente, o governo previu orçamento R$ 5 bilhões maior do que o inicial, devido a excesso de arrecadação, entre outros motivos.

O governo afirmou que o Vivaleite deve manter média de 338 mil beneficiários ao mês e que o Ação Jovem e o Renda Cidadã atendem 108.964 pessoas.

Folha