Para Lula, esquerda vence em 2022
Foto: Reuters
“Tem gente que fala que precisa derrubar o Bolsonaro. Ele foi eleito democraticamente, então nós aceitamos o resultado da eleição. Mas ele foi eleito para governar para o povo brasileiro e não para os milicianos do Rio de Janeiro”, afirmou. “A gente não pode permitir que milicianos acabem com esse país.”
Como Lula solto pode aumentar polarização, enfraquecer centro e beneficiar Bolsonaro
A repercussão internacional da libertação do ex-presidente Lula
“[Bolsonaro] tem que explicar onde que está o [Fabrício] Queiroz, ele tem que explicar como ele construiu um patrimônio de 17 casas”, falou o ex-presidente, se referindo ao ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) investigado sob suspeita de desviar recursos públicos.
O ex-presidente participava de festa de comemoração de sua soltura. Ele foi libertado na sexta, depois de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que proibiu a prisão a após condenação em segunda instância — e motivou protestos neste sábado em algumas das principais cidades do país, como Rio, São Paulo, Brasília, Porto Alegre, Salvador e Curitiba, em que manifestantes fizeram pressão pela aprovação de uma proposta de emenda à Constituição que permite a prisão neste caso e tramita atualmente no Congresso.
Lula afirmou que a esquerda precisa “fazer mais” e que não pode apenas “resistir”, mas que precisa “partir para o ataque” para conquistar as urnas em 2022.
“Se a gente se organizar direitinho, a chamada esquerda, de que o Bolsonaro tem tanto medo, vai derrotar a ultradireita”, disse o ex-presidente, que afirmou que voltará a percorrer o país.
Lula também fez ataques à Rede Globo. “Lá em cima está o helicóptero da Rede Globo para falar merda outra vez sobre o Lula e sobre nós”, disse ele, em discurso que estava sendo exibido ao vivo pela GloboNews.
A Globo divulgou uma nota em seguida dizendo que “a prova de sua isenção é receber críticas” tanto do presidente Bolsonaro quanto do ex-presidente Lula.
Lula afirmou novamente ser inocente e elegeu o ministro Sergio Moro como alvo de críticas em diversos momentos, dizendo que foi perseguido por ele e pelo procurador Deltan Dallagnol.
“Eu preciso provar que o juiz Moro não era um juiz, era um canalha que estava me julgando”, disse ele. “O Dallagnol não representa o Ministério Público, que é uma instituição séria. Ele montou uma quadrilha com a força tarefa da Lava Jato.”
Disse que em 2018, quando foi preso, poderia ter ido para uma embaixada ou para fora do país, mas resolveu se entregar para provar sua inocência.
‘Lula paz e amor’
Apesar das duras críticas, disse que saiu da prisão sem “ódio no coração” e deu broncas na militância que xingava Bolsonaro com palavrões. “A gente não pode falar isso. Não pode falar palavrão para o Bolsonaro, porque ele já é um palavrão.”
“Durante 580 dias eu me preparei para não ter ódio, para não ter sede de vingança e para não odiar os meus algozes”, afirmou. “Porque eu queria provar que, mesmo preso por eles, eu dormia com a minha consciência tranquila.”
“Eu li muita gente perguntando, será que o Lula via sair radicalizado? Vai querer vingança? Eu não quero nada, eu quero construir esse país com a mesma alegria que já construímos.”
América Latina
O ex-presidente comentou a situação política em diversos países da América Latina.
Comemorou a vitória do presidente eleito Alberto Fernández na Argentina, contra o atual presidente Mauricio Macri, e falou sobre os protestos populares no Chile.
“Estamos vendo o que está acontecendo no Chile, é o modelo de país que o [ministro Paulo] Guedes quer construir”, afirmou.
Também mencionou a situação da Bolívia. “O companheiro [Evo] Morales ganhou o quarto mandato. Ele foi quem fez melhor governo na história da Bolívia, que está crescendo a 5% ao ano. Ele foi eleito, mas a direita, assim como aqui, não quer aceitar”, disse ele, comparando com impeachment de Dilma Rousseff em 2016.
O presidente boliviano Evo Morales foi reeleito em 2019 com uma margem pequena em uma eleição conturbada. A Organização dos Estados Americanos fez uma auditoria nas eleições após a oposição alegar fraude no pleito. O resultado deve sair semana que vem.
Disse também que os brasileiros precisam ser solidários com os “companheiros” desses países, mas respeitando sua soberania, e criticou a interferência dos EUA no continente.
“Que o [presidente americano Donald] Trump resolva o problema dos [norte] americanos e não encha o saco dos latino-americanos”, afirmou.
“Ele que governe os americanos, ele que cuide da pobreza deles.”
No entanto Lula não mencionou a situação da Venezuela – o país vive uma grave crise e é comandado por Nicolas Maduro, sucessor de Hugo Chávez, que era próximo do governo do PT no Brasil.
Críticas à política econômica
Lula criticou a agenda econômica do governo Bolsonaro, em especial os projetos de privatização e a proposta de congelamento de reajustes acima da inflação para o salário mínimo por dois anos.
O ex-presidente chamou o ministro da Economia, Paulo Guedes, de “ministro demolidor de sonhos, destruidor de empregos” e relativizou ainda o benefício da redução da taxa Selic, que se encontra em mínima histórica.
“A taxa de juros que cai é a Selic, que envolve o governo e sua dívida pública. Quero saber se o juro do cartão de crédito de vocês caiu, se o juro do cheque especial caiu, porque é esse juro que toca diretamente no bolso do trabalhador.”
O presidente Bolsonaro, que vinha mantendo silêncio sobre a libertação de Lula desde quinta-feira, comentou brevemente o assunto na manhã de sábado.
“A grande maioria do povo brasileiro é honesto, trabalhador, e não vamos dar espaço e contemporizar com presidiário”, disse. “Ele está solto mas está com todos os crimes dele nas costas”
Lula disse que voltará a fazer um novo pronunciamento em cerca de 20 dias. No fim do discurso, convocou os deputados aliados a “virarem leões” para o Congresso e não aprovar “leis contra o povo”.
Lula saiu da prisão após decisão do STF contra prisão após 2ª instância
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva saiu da prisão em Curitiba no fim da tarde da última sexta-feira, depois de 19 meses. Centenas de militantes o aguardavam, do lado de fora da carceragem da Superintendência da Polícia Federal (PF) na capital paranaense.
Lula estava em uma cela no prédio da PF desde abril de 2018, quando foi preso após ter sido condenado a mais de oito anos de prisão em segunda instância pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro pelo caso do tríplex do Guarujá.
O ex-presidente dormiu na capital paranaense na sexta-feira e, neste sábado, embarcou em um jatinho até São Paulo. Depois, foi para o Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo, no ABC paulista, região que é berço do PT.
O juiz Danilo Pereira Junior, da 12ª Vara Federal de Curitiba, expediu o alvará de soltura em resposta ao pedido feito pela defesa de Lula pela manhã de sexta, com base em uma decisão tomada no dia anterior pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que vetou a chamada execução antecipada da pena — impedindo que réus fossem presos após julgamento em segunda instância e antes do esgotamento de todos os recursos possíveis.
O STF decidiu na quinta-feira proibir por 6 votos a 5 o início do cumprimento da pena antes de esgotados todos os recursos dos réus, o chamado trânsito em julgado. A BBC News Brasil resumiu os votos de cada um dos ministros, inclusive em sessões anteriores do julgamento.
Iniciado em 17 de outubro, o julgamento foi o primeiro no qual a Corte analisou, de forma abstrata, se o Artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) está de acordo com a Constituição. Este artigo diz que “ninguém poderá ser preso senão (…) em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado”.
O julgamento no Supremo abriu o caminho para a soltura de até 4.895 presos, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Entre eles, está o ex-presidente. O caso mais avançado contra o petista, o do tríplex do Guarujá, ainda tem recursos pendentes. Isto é, ainda não transitou em julgado.
Votaram a favor da prisão apenas depois do trânsito em julgado os ministros Marco Aurélio Mello, relator do caso, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli, presidente do STF.
Já a tese derrotada — a favor da prisão em segunda instância — foi defendida pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.