CPMI das fake news acha dinheiro público envolvido

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Folha: Karime Xavier/Folhapress

O deputado estadual bolsonarista Douglas Garcia (PSL-SP) contratou com verba de seu gabinete, na Assembleia Legislativa de São Paulo, uma empresa cujo dono foi processado por publicar em redes sociais material considerado ofensivo à honra de adversários do parlamentar.

Garcia foi apontado pela deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), rompida com Bolsonaro, como integrante do braço paulista do suposto “gabinete do ódio”, estrutura que funcionaria dentro do Palácio do Planalto na produção de ataques virtuais contra autoridades da República e rivais políticos do governo.

Joice fez a acusação em depoimento à CPMI das Fake News, que apura a disseminação de notícias falsas. Garcia é próximo ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente.

Garcia pagou com dinheiro público R$ 50 mil pelos serviços da Dataulfo Desenvolvimento Web e Gestão de Redes, descrita na Junta Comercial de São Paulo como especializada na área de informática e internet.

A Dataulfo pertence a Carlos Alberto Rigat, ativo militante do bolsonarismo nas redes sociais. A empresa foi fundada por ele em abril de 2019 e, no mesmo mês, recebeu R$ 5.200 do gabinete de Garcia por serviços de informática. Ao longo do ano, os pagamentos somaram R$ 45 mil.

Em 2020, segundo o site da Assembleia Legislativa, houve o pagamento de mais R$ 5.000 à empresa.

O deputado e a Dataulfo dizem que a contratação se refere apenas à manutenção do site de Garcia, sem envolver serviços em redes sociais.

Carlos Rigat é alvo de um processo em São Paulo proposto por um militante político que se sentiu ofendido por suas publicações nas redes sociais. Ele também chegou a ser investigado por injúria racial contra um vereador, mas a Justiça arquivou o caso.

A ação foi movida por Alexandre dos Santos, atacado por Rigat nas redes sociais. Ele era chamado de estelionatário em postagens e entrou com duas ações na Justiça acusando calúnia, injúria e difamação –uma penal e outra cível.

Alexandre é irmão de Renan dos Santos, um dos fundadores do MBL, grupo de jovens de direita que emergiu incentivando protestos a favor do impeachment de Dilma Rousseff (PT).

Na ação penal, Rigat foi absolvido em última instância. Já o processo cível, em que o integrante do MBL pede uma indenização de R$ 60 mil, está suspenso sem uma sentença.

Essa ação também tem como alvo o empresário Cléber dos Santos Teixeira, da empresa O Jacaré de Tanga Propaganda e Marketing, que administra perfis nas redes sociais dedicados à defesa do governo Bolsonaro e ataques a políticos adversários.

Foi nos perfis de “O Jacaré de Tanga” no Facebook e no Youtube que Rigat publicou ofensas a Alexandre dos Santos e outros integrantes do MBL. Ele colaborava com publicações nessas páginas.

Em novembro de 2018, Rigat foi acusado de racismo pelo vereador Fernando Holiday (DEM). O parlamentar, também líder do MBL, sentiu-se ofendido com um vídeo divulgado pelo dono da Dataulfo em uma rede social.

Na gravação, Rigat mostra as instalações de um escritório e diz que o local havia sido oferecido como senzala para o vereador, que é negro.

“Na época da campanha do Holiday eu ofereci uma sala aqui para a gente fazer a senzala do Holiday aqui, né? Só que os donos da Casa Grande da rua da União [local da sede do MBL] ali, os donos do ‘Fernandinho [Holiday]’, não deixaram”, diz Rigat na gravação. Neste ano, a Justiça arquivou o caso.

Antes de se tornar militante bolsonarista, Rigat atuou na campanha de Fernando Holiday para a Câmara Municipal, em 2016.

Com a ascensão de Bolsonaro à Presidência, o MBL logo passou a adotar uma postura crítica em relação ao governo federal. Rigat, então, desvinculou-se do movimento e se aliou ao grupo político de Eduardo Bolsonaro. Passou a atacar os antigos aliados.

Em março passado, Rigat foi preso acusado de porte ilegal de arma em um bar da rua Canuto do Val, região boêmia do centro de São Paulo. Foi levado para a delegacia e saiu depois de pagar fiança de R$ 2.500.

O deputado Douglas Garcia afirma desconhecer as acusações contra Carlos Alberto Rigat. Disse que conhecia sua atuação nas páginas do “O Jacaré de Tanga” e então o chamou para cuidar do seu site. Mas afirmou que Rigat não cuida de suas redes sociais.

“Fiz a contratação da empresa dele para divulgar o meu trabalho. O trabalho que ele fazia lá é completamente diferente do que ele faz aqui. Ele cuida do meu site e divulga meu trabalho na Assembleia”, diz. “O núcleo de fiscalização e controle da Assembleia aprovou a contratação.”

Carlos Alberto Rigat, proprietário da Dataulfo, diz que cuida do site do deputado, mas nega trabalhar com suas redes sociais. “Não distribuo fake news.” Em nota, ele diz que a Dataulfo “não tem acesso a qualquer rede social do deputado Douglas Garcia” e “limita-se única e exclusivamente à gestão da página web”.

Em relação às acusações feitas por Alexandre dos Santos, ele diz que não se preocupa porque não há crimes contra a honra nas postagens. “Os caras inventaram isso, levaram até o Supremo e perderam em todas as instâncias.”

Sobre o vídeo com a ofensa racial, ele diz que era uma piada. “Se você for ver, o inquérito é um trecho de um vídeo em que eu fiz uma piada que era sempre feita junto com o Holiday”, diz.

A prisão por andar armado ele atribui a um erro fruto do alcoolismo. “Eu saí bêbado de casa. É uma coisa que eu não me orgulho.”

Alexandre dos Santos disse, em nota, que as ações de injúria e difamação foram propostas para inibir a conduta de Rigat que passou “o limite da liberdade de expressão para atingir a honra e a dignidade das pessoas”.

Cleber Teixeira, dono do “O Jacaré de Tanga”, diz que na época que Rigat publicou ofensas ele estava se recuperando de um problema de saúde e por isso não tem responsabilidade pelas postagens.

O vereador Fernando Holiday diz, em nota, que “como se pode ver, são pessoas que, além de disseminarem mentiras pela internet de forma orquestrada, enxergam em pessoas negras, como eu, uma inferioridade racial”. “Algo que precisa ser repudiado e punido pela lei o quanto antes.”

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