MP conhecia paradeiro de Queiroz desde dezembro
Foto: Sebastião Moreira/EFE
A defesa do ex-policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), pediu nesta segunda-feira, 22, ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) a revogação da prisão preventiva de Márcia Oliveira de Aguiar, mulher de Queiroz, foragida desde a quinta-feira 18, quando foi deflagrada a Operação Anjo.
As prisões de Queiroz e Márcia foram decretadas pelo juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau porque, na avaliação do magistrado, eles tentavam obstruir as investigações do esquema de “rachadinha” no gabinete de Flávio e planejavam fugir. Também foi considerado o fato de o ex-PM ter fornecido endereço falso no processo. No sábado, 20, a desembargadora Suimei Cavalieri negou pedido de liberdade ao ex-assessor.
Entre as alegações do advogado Paulo Emílio Catta Preta, que defende o casal, está a de que o paradeiro de Queiroz, detido no Complexo de Bangu, no Rio, era conhecido pelo Ministério Público desde, pelo menos, dezembro de 2019. Apesar disso, argumenta, o ex-assessor não foi notificado a depor aos investigadores.
“Ademais, é patente a contradição existente na alegação de que as autoridades da persecução não tivessem mais localizado FABRICIO QUEIROZ, após a cirurgia de extração de câncer de colón, ocorrida em janeiro de 2019, visto que desde as apreensões realizadas em 18 de dezembro de 2019 já dispunham da informação de que FABRÍCIO QUEIROZ eventualmente se dirigia ao endereço de Atibaia/SP, o que poderia ter, sem qualquer dificuldade, ensejado a sua efetiva notificação para comparecimento perante os ilustres promotores/investigadores, o que efetivamente não ocorreu”, diz a defesa.
Queiroz é apontado pelas investigações do MP fluminense como operador financeiro de um esquema de desvio de parte dos salários dos servidores do gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) entre 2007 e 2018, quando o filho do presidente Jair Bolsonaro era deputado estadual. Segundo as apurações, Queiroz recebeu em suas contas bancárias, neste período, 2 milhões de reais oriundos da folha salarial do gabinete, ou seja, dinheiro público. A investigação aponta que ele pagou despesas de Flávio, como mensalidades escolares de suas duas filhas, e fez um depósito de 25.000 reais em espécie na conta de Fernanda Antunes Figueira Bolsonaro, mulher do senador.
O ex-assessor foi preso em Atibaia (SP), em uma propriedade do advogado Frederick Wassef, próximo à família Bolsonaro e figura habitual nos palácios de Brasília.
Em relação à prisão preventiva de Márcia Aguiar, os advogados do casal afirmam que está baseada em argumentos “amplamente genéricos e alicerçados tão somente no piso frágil das presunções, conjecturas e suposições”. “Percebe-se que as razões adotadas pela autoridade coatora não ultrapassam o campo das hipóteses, consubstanciando verdadeira criação mental de seu prolator, não respaldada em elemento informativo constante dos autos”, sustenta o habeas corpus.
Segundo a defesa, a alegação de que a mulher de Queiroz tentou obstruir as investigações se apoia sobre o fato de ela saber onde estavam o ex-assessor de Flávio Bolsonaro e Raimunda Veras Magalhães, mãe do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega, também investigada no esquema de “rachadinha”. Raimunda era funcionária fantasma no gabinete do então deputado estadual e chegou a se encontrar com Márcia na cidade de Astolfo Dutra (MG), onde passou a viver após o início das apurações.
“No entanto, tais conhecimentos sobre a localização de FABRÍCIO e RAIMUNDA jamais poderiam ser considerados como manobras para embaraçar as investigações, dado que nenhuma dessas pessoas estava procurada ou evadida à persecução penal”, dizem os advogados.
O habeas corpus ainda argumenta no sentido de que as viagens em que Márcia Aguiar acompanhava Queiroz a São Paulo eram destinadas ao tratamento dele contra o câncer e que “a discrição adotada pelo casal desde a publicação de notícias sobre a investigação se dava para evitar a natural (e insistente) curiosidade de veículos de imprensa sobre fatos da sua vida íntima e privada, notadamente relacionados à sua saúde corporal”. Mensagens encontradas pelo MPRJ no celular de Márcia Aguiar, apreendido em uma operação em dezembro de 2019, mostram que o casal tomava cuidados como o de desligar os aparelhos à medida que se aproximavam do destino final.
O material encontrado no celular de Márcia também baseou a alegação do MP de que ela e Queiroz planejavam fugir caso tivessem as prisões decretadas. Em novembro de 2019, o ex-PM relatou a ela a intenção de “Anjo”, provável referência a Wassef, de promover a mudança da família de Queiroz para São Paulo caso o Supremo Tribunal Federal (STF) decidisse pela continuidade das investigações do Ministério Público. Inicialmente, Márcia Aguiar disse achar a opção um “exagero”, mas em seguida a considera: “só se estivéssemos com prisão decretada”.
Outro ponto apontado pela investigação e contestado pelo habeas corpus são as anotações feitas por Márcia, também apreendidas, que indicam custos do tratamento de Queiroz. A promotoria aponta que ela recebeu 174.000 reais em dinheiro vivo, “de origem desconhecida”, para pagar as despesas no Hospital Albert Einstein. De acordo com os defensores, o ex-PM “tinha o hábito de manter consigo valores em espécie para o enfrentamento de suas despesas” e o controle de custos apreendido era “apenas o registro dos gastos médicos, hospitalares e medicamentosos despendido com o tratamento do seu câncer”. As referências aos valores recebidos por Márcia Aguiar seriam, segundo os advogados, o montante que Queiroz pediu para ser entregue à mulher.
Entre os elementos enumerados pelo MP do Rio para determinar a prisão de Fabrício Queiroz está a suposta influência dele sobre integrantes de milícias na capital fluminense. Em um diálogo em dezembro, Márcia levou a Queiroz o pedido de um morador da região do Itanhangá que havia sido ameaçado por homens que, na avaliação dos promotores, seriam milicianos. O ex-assessor de Flávio Bolsonaro diz à mulher que não pode ligar por temer estar “grampeado”, mas que poderia ir até lá pessoalmente, quando estivesse no Rio.
Para os advogados, no entanto, não é possível ter certeza que o casal falava de milicianos. Assim, a interpretação dos promotores traduziria “inconfessável preconceito social, pela suposição de que todos os moradores de comunidades carentes do Rio de Janeiro sejam milicianos ou traficantes”. “O pedido junto ao ex-PM, alegam os defensores, se deveria ao fato de que ele “sempre foi morador de bairros de classe média baixa e sempre manteve boas relações com lideranças comunitárias de várias comunidades carentes do Rio de Janeiro”.
“Aliás, os seus grandes préstimos à atividade política sempre foram notoriamente reconhecidos pela luta de condições minimamente dignas às populações de menor renda e para que as políticas públicas pudessem alcançar habitantes de baixa renda. Daí porque lhe ter sido solicitado pacificar conflito de moradores de comunidades carentes, o que foi rapidamente interpretado pelo parquet fluminense como suposta ascendência sobre milicianos”, argumenta.