Dallagnol será julgado hoje no CNMP
Foto: Heuler Andrey/DiaEsportivo / Agência O Globo
O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) deve julgar nesta terça-feira um processo disciplinar contra o procurador Deltan Dallagnol, ex-coordenador da força tarefa da Lava-Jato em Curitiba. Ele pode ser condenado no máximo à pena de censura, que, nas palavras de um integrante do órgão, equivale a um “puxão de orelha”. Na prática, essa pena, se aplicada, pode atrasar sua progressão na carreira, ou servir como agravante em futuros julgamentos no CNMP, onde Deltan enfrenta outros processos.
O caso que deve ser julgado agora foi movido pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL). Ele acusou o procurador de ter feito campanha no Twitter em 2019 para atacar sua imagem e influenciar na eleição da presidência do Senado. Na queixa, o parlamentar reclamou de mensagem compartilhada pelo procurador, na qual ele dizia que Renan, se eleito, dificultaria o combate à corrupção. O senador acabou perdendo a disputa pelo comando do Senado para Davi Alcolumbre (DEM-AP).
O processo não foi incluído na pauta porque até a semana passada estava valendo uma decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendendo a análise do caso. No fim de semana, porém, outra decisão, dessa vez do também ministro do STF Gilmar Mendes, liberou a realização do julgamento. Ele levou em conta o argumento do conselheiro Otavio Luiz Rodrigues Júnior, do CNMP, segundo o qual o caso prescreveria na quinta-feira desta semana, se não julgado. O mais provável é que, com a decisão de Gilmar, o CNMP realize o julgamento na manhã desta terça-feira.
Uma outra decisão, dada em agosto pelo ministro do STF Luiz Fux, fez com que punições mais severas, como a de suspensão, não possam ser aplicadas a Deltan. O procurador já tinha sido condenado por advertência em outro processo no CNMP. Em caso de nova punição, ele seria reincidente. Mas Fux deu uma liminar a Deltan proibindo o órgão de levar em conta essa pena na análise de novos processos.
O julgamento de um outro caso, em 25 de agosto, mostrou que o clima no CNMP não é dos melhores em relação a Deltan. O órgão arquivou a reclamação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra o procurador no caso da exibição de um Powerpoint, que apontava Lula como chefe da organização criminosa na Petrobras. Mas a absolvição ocorreu em razão da prescrição. Na ocasião, houve indicativos de que, se não fosse isso, haveria maioria de votos contra o procurador: oito dos atuais 11 conselheiros viram indícios de infração disciplinar.
De lá para cá, houve um fato novo: Deltan, alegando questões de saúde da filha, deixou a coordenação da Lava-Jato. Dois integrantes do CNMP com quem o GLOBO falou, porém, disseram que isso não afeta o processo movido por Renan, que não tem relação com a Lava-Jato.
Em documento que faz parte do processo do STF em que houve decisões dos ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes, o relator do caso no CNMP, o conselheiro Otavio Luiz Rodrigues Júnior, destacou que a pena de censura, que pode ser aplicada a Deltan, prescreve em 10 de setembro de 2020, ou seja, na quinta-feira desta semana. Ao STF, Deltan contra-argumentou dizendo que o prazo de prescrição levaria mais um ano.
No mesmo documento, o conselheiro reproduziu a íntegra de uma decisão que ele tomou no CNMP destacando que a realização do julgamento seria boa para Deltan: “Evita-se, assim, que seja suprimido o direito de se provar a inocência do processado e não o favorecimento por eventual prescrição, algo que subtrai às partes a possibilidade de demonstrar materialmente a idoneidade de suas condutas.”
No recurso ao STF, aceito por Celso e depois revogado por Gilmar, a defesa de Deltan afirmou que houve cerceamento ao direito de defesa, o que o conselheiro Otavio Luiz nega. No documento entregue ao STF, o relator do processo no CNMP destacou que “ainda estão em aberto as opções pela absolvição ou condenação”.
Celso de Mello também havia suspendido a análise de outro processo no CNMP, no qual a senadora Kátia Abreu (PP-TO) pedia o afastamento de Deltan da Lava-Jato. Nesse caso, houve, no jargão jurídico, “perda de objeto”, porque o procurador já deixou a força tarefa.