Dallagnol diz que provas contra Lula são “consistentes”, mas não cita quais

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Foto: Geraldo Bubniak / Agência O Globo

Fora do comando da força-tarefa da Lava-Jato de Curitiba desde setembro, o procurador Deltan Dallagnol afirmou nesta segunda-feira que vê “reais chances de prescrição” nos processos que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STTF) Edson Fachin que anulou todas as condenações do petista na operação. Ainda assim, Dallagnol defendeu a consistência das provas apuradas pela força-tarefa e afirmou que é preciso abrir os olhos para os retrocessos no combate à corrupção.

“Processos envolvendo o ex-presidente serão retomados em breve em Brasília, mas com reais chances de prescrição. Várias questões serão rediscutidas nos tribunais. Nada disso, contudo, apaga a consistência dos fatos e provas, sobre os quais caberá ao Judiciário a última palavra”, escreveu o procurador no Twitter.

Crimes de corrupção, como os de que Lula é acusado, prescrevem em 16 anos, segundo advogados consultados pelo GLOBO. Como o petista tem mais de 70 anos, esse prazo cai pela metade. A ação do sítio de Atibaia, que investiga supostos crimes ocorridos entre 2004 e 2014 prescreve entre 2012 e 2022. Segundo a lei brasileira, ninguém pode ser punido por um crime que prescreveu. Já o processo do tríplex do Guarujá avalia suspeitas de irregularidades entre 2006 (que prescreveram em 2014) e 2014 (que vão prescrever no ano que vem). Há também a acusação de lavagam de dinheiro, que prescreve em oito anos, ou seja, em 2024.

Dallagnol evitou críticas a decisão do ministro Fachin. Afirmou que, embora a condução dos casos da operação por Curitiba já tivesse sido apreciada pelos tribunais em outras ocasiões, houve uma expansão desse entendimento para que os casos fossem redistribuídos pelo país. Nos primeiros anos da operação, uma decisão do Supremo estabelecia que o ex-juiz Sergio Moro só teria atribuição nos processo relacionados com a corrupção da Petrobras. No entanto, posteriormente outras decisões da Segunda Turma da Corte relacionadas a casos da Transpetro, subsidiária da estatal, foram retiradas de Curitiba e redistribuídas.

Após falar sobre a decisão desta segunda-feira, Deltan fez um comentário sobre medidas, como o fim da prisão em segunda instância, que, em sua opinião, atacam o legado da Lava-Jato: “Precisamos discutir essas amplas mudanças em curso (e aqui não falo mais do caso concreto) para decidir se queremos ser o país da impunidade e da corrupção, que corre o risco de retroceder vinte anos no combate a esse mal, ou um país democrático em que impere a lei”, disse Dallagnol.

Outro ex-integrante da Lava-Jato que se manisfestou publicamente foi o procurador Januário Paludo. Ele afirmou que decisão do Supremo “se cumpre”. Segundo ele, é pequena a probabilidade do plenário mudar o entendimento de Fachin.Na força-tarefa de Curitiba, Paludo foi o responsável pelas investigações de dois dos processos que envolvem Lula, o do tríplex do Guarujá e o do sítio de Atibaia.

— Decisão do Supremo se cumpre. Neste caso, se recorrrer, a probabilidade de êxito é ínfima — disse o procurador.

Ao contrário do que ocorreu em outras derrotas sofridas pela Lava-Jato, procuradores do grupo que restou da Lava-Jato no Paraná adotaram postura cautelosa e evitaram embates e críticas. Em nota, eles informaram que seguirão com os trabalhos e que não atuam junto ao STF. A última afirmação sugere que quem deveria se manifestar sobre o caso seria a Procuradoria Geral da República (PGR), já que é quem tem a competência para o caso. Em outros tempos, porém, os procuradores não delimitavam esse tipo de fronteira e rebatiam qualquer decisão que se voltasse contra a Lava-Jato.

Entre as defesas dos réus, que antes acumulavam uma série de derrotas e condenações, agora o clima é de otimismo.

O advogado Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, ex-defensor da OAS, afirma que desde o início do processo foi questionada a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, mas que os argumentos não foram aceitos pelo então juiz Sérgio Moro e pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que analisou a sentença em segunda instância. Coutinho afirma que foi forçada a hipótese de que o tríplex seria um pagamento feito com recursos da Petrobras.

O advogado Roberto Podval, que defende o ex-ministro José Dirceu, também condenado na Lava-Jato, afirma que a decisão do ministro Fachin “foi um freio de arrumação” no processo, já que a “competência extravagante” da 13ª Vara Federal de Curitiba sempre foi uma grande discussão no meio jurídico.

— Não há dúvida da correção da decisão do ministro Fachin – afirma Podval, acrescentando que a decisão repercute mais por se tratar do ex-presidente Luiz Inácio Lula da SIlva.

Segundo ele, a próxima discussão é a partir de onde os processos que envolvem Lula serão retomados, uma vez que o novo juiz e o novo procurador do caso terão de levar em conta também as denúncias de parcialidade.

— Se a prova foi colhida por um juiz parcial, o mais seguro é que recomece do início, do zero — diz.

Podval acredita que, embora haja possibilidade de prescrição dos casos que envolvem o ex-presidente, o próprio Lula não pretende ver os processos encerrados desta forma.

— O que ele gostaria realmente de ver julgado é o mérito de sua inocência. Melhor do que o não-julgamento é a absolvição.

Para Podval, embora seja afastada a discussão de parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro na condução dos processos que envolvem Lula, o tema poderá ser levado novamente aos tribunais por outros acusados e condenados na Lava-Jato. O advogado afirma que é cedo para avaliar se a discussão pode ser feita nos processos que envolvem José Dirceu.

O Globo