Bolsonaro tem mais processos no STF que Dilma, Lula e Temer
Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
Em dois anos de mandato, o governo do presidente Jair Bolsonaro já acumulou contra si mais ações de partidos políticos no Supremo Tribunal Federal (STF) do que todos os processos ajuizados por legendas no mesmo período dos dois mandatos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e no governo de Michel Temer juntos.No total, Bolsonaro já foi alvo de ao menos 185 questionamentos na Justiça, enquanto seus antecessores responderam juntos a 144, aponta levantamento feito pelo GLOBO.
Sem maioria na Câmara e no Senado, as silgas de oposição a Bolsonaro como PT, PSB, REDE, PCdoB, PSOL e PDT já recorreram à Justiça contra os principais projetos e medidas apresentados em sua gestão por meio de Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) ou Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) — instrumentos usados para questionar leis, decretos, medidas provisórias e portarias do governo.
A “oposição jurídica” a Bolsonaro é capitaneada pela Rede Sustentabilidade, com 49 ações, seguida por PSB (38), PDT (33) e PT (29). O revés judicial mais recente ao presidente foi imposto pela ministra Rosa Weber. Ela suspendeu na semana passada, em decisão individual, trechos dos quatro decretos sobre porte e posse de arma, editados pelo presidente em fevereiro, em uma ação de PSB, PSOL, Rede e PT. Além de Rosa, o ministro Edson Fachin também já votou pela suspensão. O ministro Alexandre de Moraes pediu vista.
O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, diz que a contestação judicial é uma necessidade porque o Parlamento se recusa a fazer politica e, muitas vezes, se prende a medidas inconstitucionais.
— Quando o presidente vai além de sua competência é um dever dos partidos recorrer à Justiça. O Parlamento se renuncia a fazer a política e a Constituição nos garante esse direito. O governo tem tendência autoritária. Tem dificuldade de se moldar à atividade politica e tende a ter medidas, tanto decretos, quanto medidas provisórias inconstitucionais. Não deixaremos passar — afirma.
As ADIs são ações usadas para questionar leis e atos federais ou estaduais que sejam contrários à Constituição Federal. Já as ADPFs são usadas quando um ato ou lei do poder público fere um preceito fundamental da Constituição, como as cláusulas pétreas.
As legendas conseguiram ainda impor limites ao compartilhamento de dados da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e garantiram a autonomia para que Estados e municípios imponham medidas de isolamento social para conter a pandemia de Covid-19. No início do governo, o Supremo manteve a demarcação de terras indígenas no escopo da Fundação Nacional do Índio (Funai).
A “chuva” de ações dos partidos de oposição levantam a discussão sobre a judicialização de medidas e atos políticos. O atual presidente da Corte, ministro Luiz Fux, criticou no ano passado o excesso e ações de legendas. Para Fux, o Parlamento tem que “resolver os seus próprios problemas”.
“O Poder Legislativo coloca no colo no Supremo a solução de várias questões que dizem respeito ao Parlamento, porque muitas vezes o Parlamento não quer pagar o preço social de uma deliberação”, disparou Fux.
Com a maior bancada de parlamentares no Congresso Nacional, o PT foi responsável por 29 ações no STF. Em meio à escalada de mortes e casos confirmados de Covid-19 no país, o partido foi à Justiça para que Bolsonaro apresentasse explicações quanto às acusações de omissão do governo na contenção da pandemia e, em outra ação, questionou os vetos do presidente a um Projeto de Lei que determinava a exigência de uso de máscaras em espaços públicos e privados.
Segundo a presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann, as medidas judiciais não representam, no entanto, uma judicialização e omissão da política.
— Não é judicialização da política, mas usar instrumentos legais para barrar medidas que acreditamos ferir leis e a democracia. Estamos trabalhando com ações concomitantes, tanto na Justiça quanto com ações legislativas. No caso da extinção dos conselhos, por exemplo, entramos com uma ação no STF porque o presidente acaba com conselhos previstos em lei.
Para o cientista político Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o aumento no número de ações no STF pode ser explicado por dois fatores: a forma como Bolsonaro governa, por decretos, e a desmoralização dos partidos políticos após a eleição de 2018.
— O governo Bolsonaro passou a governar, essencialmente, por decretos, substituindo o Poder Legislativo. Os partidos de oposição, atordoados com a eleição de 2018, passaram a acionar o Supremo contra as medidas. Apesar de eficaz em determinados pontos, a judicialização tira do Legislativo a capacidade de regular as atividades da sociedade. Outro fator que influencia é a dinâmica do Parlamento, que centraliza a discussão na presidência da Casa. Não havendo caminho para o diálogo, os partidos recorrem à Justiça — explica Baía.
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