Energia cara aumentará juros que esfriarão a economia
Foto: Lalo de Almeida
A crise de abastecimento de energia e seus impactos sobre a inflação é mais um fator que deve levar o BC (Banco Central) a sinalizar nesta quarta-feira (16) um aumento mais forte da taxa básica de juros neste ano.
Somente a mudança de patamar da bandeira tarifária para vermelha 1 em maio já representou um aumento de 6,5% na conta de luz. A alteração para vermelha 2 em junho e a correção dessa taxa extra em cerca de 20% a partir de julho, para contemplar o uso maior de termelétricas, deve representar alta de mais 5% para os consumidores, segundo cálculos da FGV (Fundação Getulio Vargas).
A expectativa praticamente unânime do mercado é que o Copom (Comitê de Política Monetária) anuncie nesta quarta um aumento da taxa Selic de 3,5% para 4,25% ao ano. Essa é a estimativa dos 33 economistas consultados pela agência Bloomberg e também a mediana das projeções da pesquisa Focus do BC.
Em maio, o Comitê aumentou os juros em 0,75 ponto percentual e afirmou que deveria fazer outro ajuste da mesma magnitude em junho.
Embora alguns analistas não descartem um aumento de 1 ponto percentual agora, a avaliação é que o mais importante é uma sinalização do BC de que a alta da inflação demanda o fim do estímulo monetário adotado durante a pandemia. Para isso, a taxa teria de voltar ao patamar neutro, próximo de 6,5% ao ano.
No seu último encontro, a instituição afirmou que avaliava como “apropriada uma normalização parcial da taxa de juros, com a manutenção de algum estímulo monetário ao longo do processo de recuperação econômica”. Essa avaliação deve mudar.
Mauro Morelli, estrategista-chefe da Davos Investimentos, afirma que o BC deve tirar a menção à normalização parcial e que pode sinalizar com uma normalização total ou deixar a questão em aberto, dependente da evolução dos dados. “Essa discussão é até mais importante do que se o aumento vai ser de 0,75 ou 1 [ponto percentual]”, afirma.
“A questão é mais a perspectiva do que o BC tem a dizer sobre o futuro do que o que ele vai fazer no presente. Não vejo uma mudança de postura agora no curto prazo tão extrema”, afirma Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset.
Em relatório, o banco Goldman Sachs também afirma que espera uma alta de 0,75 ponto percentual, com indicação de outra alta da mesma magnitude na reunião de agosto, e um ajuste no comunicado eliminando a referência à normalização parcial da política monetária.
A Sicredi Asset é uma das poucas instituições que avaliam que o Copom já deveria elevar a Selic em 1 ponto percentual agora. Para a gestora, em meio a surpresas de atividade e inflação, o BC deveria acelerar o ritmo de ajuste da taxa de juros para demonstrar claramente sua disposição em controlar os preços e manter o compromisso com a meta de inflação.
De acordo com a economista do Itaú Unibanco Júlia Passabom, o impacto da energia no IPCA, índice de preços ao consumidor que serve como meta de inflação, dependerá do desenrolar da crise hídrica e da bandeira que estará em vigor no final do ano.
Ela estima que a bandeira deve passar para vermelha 1 em dezembro, o que representará um alívio na conta de luz na comparação com a vermelha 2 do final de 2020, mesmo com o reajuste dos valores da taxa extra proposto pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) na consulta pública.
Nesta terça-feira, a agência afirmou que o reajuste das bandeiras deve superar os cerca de 20% propostos na consulta, devido ao uso maior de termelétricas, mas os valores ainda não estão definidos.
Passabom estima que o aumento total da energia fique em 5,5% neste ano, considerando também o reajuste anual das distribuidoras.
“No final das contas, importa sempre a bandeira que você teve em dezembro de cada ano para o IPCA do ano fechado”, afirma.
O economista André Braz, responsável pelos índices de preços divulgados pelo FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da FGV), afirma que uma bandeira vermelha 2 reajustada em vigor no final do ano traria um impacto de 0,40 ponto percentual no IPCA, mas que a volta das chuvas pode reduzir esse valor.
Ainda assim, será necessário observar o impacto indireto da alta da energia ao longo do ano sobre a atividade industrial e a prestação de serviços, o que pode ter repercussões no índice de preços no próximo ano. “Vai ser mais um desafio em relação ao cumprimento da meta em 2022”, afirma.
A meta de inflação deste ano é de 3,75%, com limite de tolerância de 5,25%. Para 2022, a meta é de 3,50%, com limite de 5%. As projeções do Focus apontam um IPCA de 5,82% neste ano (com estouro da meta) e 3,78% no próximo.