O Rato que ruge
Confesso que não tenho opinião solidamente formada sobre o caso Cesare Battisti. Desde que o assunto ganhou a dimensão que se vê, percebi que cautela se fazia necessária quanto a esse personagem polêmico, amado e odiado com a mesma intensidade por gente como Tarso Genro e Mino Carta, respectivamente.
Li muitas opiniões sobre o processo. Apesar de boas argumentações contra o “ex-terrorista”, é absolutamente impossível ignorar que foi condenado em um processo em que as provas decisivas contra si foram obtidas por meio de depoimentos de companheiros de guerrilha que o incriminaram para receber o benefício da “delação premiada”, o que induz à crença de que podem ter mentido para obter benefícios que chegaram a comutação da pena dos delatores.
Poucas vezes me manifestei sobre o caso justamente por conta das dúvidas que o envolvem. Todavia, a forma como o governo italiano colocou as coisas desde a decisão do ex-ministro da Justiça Tarso Genro de conceder asilo a Batisti acabou me empurrando para o ponto de vista que passo a expor.
Capitaneado por uma figura como o primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, envolvido em escândalos sexuais, em denúncias de corrupção e sócio preferencial da delinqüente mídia tupiniquim, o governo da Itália desencadeou uma escalada de arrogância em relação ao Brasil que torna impossível julgar o caso Battisti apenas do ponto de vista técnico-jurídico.
Ameaças e insultos do governo italiano ao governo brasileiro deveriam unir brasileiros de todas as posições políticas contra esse imperialismo decadente de um país que me faz lembrar de um clássico do cinema dos anos 1950, “O rato que ruge”, com o inesquecível Peter Sellers, que interpreta vários papéis em uma história burlesca em que um ducado europeu decadente e atolado em dívidas decide declarar guerra aos Estados Unidos para que, sendo vencido, torne-se responsabilidade da potência desafiada.
A Folha de São Paulo de hoje traz um recado do governo italiano de que poderá retaliar o Brasil em um acordo de cooperação militar que envolve venda de naves de guerra a um país que, como se sabe, tem montes de opções nesse quesito de compra de armamentos, sendo a França apenas a opção mais vistosa.
Aliás, dado o estado periclitante da economia italiana, julgo pouco prudente e sábio esse país impor sanções econômicas ao Brasil por conta de uma questão política. Este país tem condições de responder com sanções à potência européia que podem ser muito mais danosas a ela do que as dela a nós.
E não me venham falar do estágio de bem-estar social que vige cada vez menos na milenar Itália em comparação com as nossas agruras sociais de país jovem, com alguns séculos de existência, ou da indústria mais moderna da Itália. O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que o Brasil se tornará a sétima economia mundial, desbancando a Itália, no ano que vem.
Mesmo que surgissem provas incontestáveis da culpa de Battisti, a forma como o governo italiano se dirigiu ao Brasil obriga o país a dar uma banana às suas exigências. Os ideólogos da diplomacia dos pés-descalços deveriam ter vergonha na cara e pararem de sugerir que este país aceite se humilhar.