Rejeição do PT a Alckmin repete rejeição a José Alencar
Foto: Roberto Stuckert Filho / 30/01/2003
Vinte anos depois, o PT vive novamente uma disputa interna por causa da indicação de um candidato a vice numa chapa encabeçada por Luiz Inácio Lula da Silva. Assim como ocorreu em 2002 com o empresário José Alencar, o ex-governador Geraldo Alckmin, que ontem anunciou que vai se filiar ao PSB, também enfrenta resistência das correntes de esquerda do partido.
Na época de Alencar, porém, os obstáculos colocados dentro do PT foram maiores. Agora com Alckmin, a indicação do vice não chegou sequer a ser discutida formalmente nas instâncias partidárias. O argumento da presidente petista Gleisi Hoffmann é que, até ontem, o ex-governador paulista não tinha nem partido.
Uma liderança petista lembra que os principais problemas em 2002 estavam no fato de a vinda de Alencar trazer junto o PL. Havia ressalvas a quadros do partido nos estados. As negociações para aliança eram comandadas por Valdemar Costa Neto, que, assim como há 20 anos, preside hoje o partido. Ele foi o responsável pela filiação do presidente Jair Bolsonaro no fim de 2021.
Os ataques pesados dos petistas à aliança em 2002 fizeram com que Lula ameaçasse desistir de levar sua candidatura adiante. Então presidente do PT, José Dirceu dizia que rejeitar o PL era uma “tremenda hipocrisia” por parte das correntes de esquerda. José Genoino, ex-presidente do partido, hoje um dos líderes das mobilizações contra Alckmin, defendia a união.
Havia também mais engajamento da militância contra o acordo, o que ainda não ficou explícito agora no caso do ex-governador paulista. Em um evento em Poços de Caldas (MG), em março de 2002, Lula teve a sua fala interrompida por um coro de 3 mil pessoas que gritavam “com o PL não, aliança com o povão”.
No mesmo mês, uma proposta de suspensão das negociações para a união foi colocada em votação no diretório nacional e recebeu 29 votos favoráveis e 38 contra. A margem apertada criou insegurança.
O acordo chegou a ser descartado quando a Justiça Eleitoral ratificou a necessidade de verticalização de alianças nos estados. O PL exigiu apoio do PT em disputas a governador e diretórios petistas se rebelaram. Segundo uma liderança do partido, muitos dirigentes só foram convencidos por Lula e seus aliados a endossar o acordo no intervalo para o almoço da última reunião do diretório antes da convenção, já no mês de junho. A votação para obrigar os estados a se enquadrarem foi apertada: 34 votos a favor da imposição da coligação, 30 contra e sete abstenções.
Ao ser chamado para discursar na convenção do PT, Alencar foi vaiado e um grupo de militantes com nariz de palhaço gritou: “Lula sim, Alencar não”.
— Entendo que a ampliação frentista hoje é, ainda, mais necessária — diz o ex-governador gaúcho Tarso Genro, que em 2002 chegou a apontar problemas na aliança com o PL, mas não se opôs ao acordo.
Acadêmico com olhar voltado para a história do PT, o professor do departamento de sociologia da USP Ricardo Musse avalia que as duas situações são “só aparentemente similares”.
— Os contextos e os objetivos são diferentes. Em 2002, a aliança com o PL e a escolha do Alencar foi uma estratégia visando incorporar, no futuro governo, setores empresariais que até então haviam se mostrado reticentes e mesmo avessos à postulação petista. Em 2022, a escolha de Alckmin aponta para a construção de uma frente anti-bolsonarista ampla o suficiente para incorporar os outrora maiores adversários do PT.