Rio tem oito candidatos bandidos, dizem PF e MP
Foto: Ana Branco/Agência O Globo
Investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público estadual (MP-RJ) apontam a presença de pelo menos oito candidatos ligados a organizações criminosas nas eleições do Rio. De acordo com os investigadores, eles podem levar vantagem no pleito de domingo por causa do livre acesso a áreas dominadas por milícias e narcotraficantes para fazer campanha, além do uso do poderio econômico relacionado às atividades ilícitas.
Com base em resultados de duas investigações, O GLOBO apurou que dois candidatos a deputado estadual — os empresários Tiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Jóias (MDB), e Cristiano Santos Hermógenes (PL) — e uma candidata a deputada federal, a advogada Flávia Pinheiro Fróes (União Brasil), têm ligação com organizações do narcotráfico. Outros dois — o candidato à Câmara Sérgio Porto (PROS), o coronel Porto, e o postulante a uma vaga na Assembleia do Rio Sérgio Roberto Egger de Moura, o Egger (DC) — são relacionados a milícias. Ricardo Abrão (União Brasil) e o ex-secretário de Polícia Civil Allan Turnowski (PL), candidatos a deputado federal, aparecem vinculados ao jogo do bicho. Turnowski foi preso no início do mês.
O oitavo nome da lista é o de Vandro Lopes Gonçalves, o Vandro Família, que busca vaga de deputado estadual pelo Solidariedade, teve a candidatura impugnada e tenta recurso em Brasília. De acordo com as investigações, ele tem ligação com milícias. Os outros sete estão aptos para a votação de domingo. A menos de uma semana do pleito, as autoridades mobilizam equipes para monitorar as campanhas na reta final e verificar o uso abusivo de recursos, única hipótese possível para impedir a diplomação do candidato suspeito, caso seja eleito.
A Lei da Ficha Limpa não foi suficiente para impedir as oito candidaturas. Isso porque só os condenados por órgão colegiado e os que renunciaram aos seus mandatos para evitar um processos de cassação são passíveis de impugnação. Embora a maioria dos oito candidatos responda a ações penais que vão do envolvimento em organizações criminosas a homicídios, manobras dos advogados impõem um ritmo lento aos processos, recheados de recursos.
No esforço de impedir as campanhas, outro parâmetro utilizado é cruzar as áreas dominadas pelas organizações paralelas com votações de candidatos em eleições anteriores para mostrar que a prática é recorrente. O trabalho, que está em andamento, deverá subsidiar a produção de relatórios para a sustentação de medidas legais. Praça Seca, Rio das Pedras e outros bairros da Zona Oeste do Rio e o município de Seropédica estão entre as regiões levantadas por causa da atuação de milícias. Os Complexos do Alemão e do Jacaré, na Zona Norte da capital, entram na lista pelo domínio do narcotráfico.
O resultado vai orientar os promotores eleitorais, fundamentando eventuais pedidos de impugnação de mandato eletivo com evidências sólidas de uso da máquina e de recursos ilegais. Porém, as autoridades eleitorais reconhecem que, depois da votação do dia 2 de outubro, fica mais difícil barrar a posse do eleito, que geralmente alega a tese do direito adquirido.
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Procurados pelo GLOBO, os investigados negam ligação com o crime. Cristiano Santos Hermógenes, irmão de Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, afirmou que o parentesco com um dos líderes de uma facção criminosa não atrapalha sua candidatura. Ele nega relação com os crimes pelos quais o irmão foi preso:
— Somos irmãos e eu o amo, mas não tenho orgulho dos crimes cometidos por ele.
Flávia Fróes, suspeita de ligação com traficantes como Marcinho VP e Fernandinho Beira-Mar, diz que apenas representa e luta pelos direitos dos familiares de presos.
O advogado do delegado Allan Turnowski, Daniel Bialski, afirmou ter esperança de seu cliente ser solto em breve para que possa continuar sua campanha, já que diz não haver prova da ligação dele com a contravenção ou que represente risco à segurança pública. Ricardo Abrão, sobrinho do bicheiro Anísio Abrão David diz respeitar o tio, mas sustenta que ele não participa de sua campanha. No entanto, se diz defensor da legalização do jogo do bicho como uma forma de gerar empregos e impostos.
A defesa de Sergio Egger atribui a acusação de ligação com milícias a adversários políticos e diz que já teve investigações nesse sentido encerradas sem comprovar nada. Coronel Porto e Vandro Família não foram localizados.
Tiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Jóias – Candidato a deputado estadual pelo MDB. Foi preso pela Polícia Civil, acusado de integrar uma quadrilha de traficantes, além de ser responsável pela lavagem do dinheiro com o uso de empresas do ramo de joias. Tiego também foi acusado de pagar propina para PMs, em troca de informações privilegiadas. Na Justiça, responde por tráfico, formação de quadrilha, organização criminosa, comércio ilegal de arma de fogo, receptação de veículo roubado, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Em foto nas redes sociais, aparece com o filho de Elias Maluco.
Cristiano Santos Hermógenes – Com nome na urna Cristiano Santos, é candidato a deputado estadual pelo PL. Já foi vereador em Belford Roxo em 2016. Disputou o cargo de prefeito em 2020, não sendo eleito. É irmão de Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, um dos líderes de facção do narcotráfico. Teria obtido autorização da cúpula da facção para fazer campanha no interior das comunidades.
Flávia Pinheiro Fróes – Candidata a deputada federal pelo União. Advogada, atua para a cúpula de uma facção do narcotráfico, tendo no portfólio nomes como Márcio Nepomuceno, o Marcinho VP, Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, e Abel Pacheco de Andrade, o Vida Loka. Se autointitula-se advogada do tráfico. Já foi acusada de ter repassado ordem 59 para compras de fuzis no Paraguai e ataques à ordem pública na cidade do Rio de Janeiro, incluindo morte a agente públicos.Vem fazendo sua campanha política em área sob domínio das facções, onde outros candidatos não têm autorização para entrar, como demonstrado em suas redes sociais.
Sérgio Porto – Coronel da PM, é candidato a deputado federal pelo PROS. O ex-vereador Jerônimo Guimarães Filho, o Jerominho, um dos responsáveis pela milícia Liga da Justiça, dias antes de ser assassinado, no dia 4 de agosto, anunciou seu apoio às pré-candidaturas do coronel Porto e do vereador Jalmir Júnior, do PRTB de São Gonçalo, como deputado estadual. Em uma publicação nas redes sociais no dia 31 de julho, Jerominho escreveu que a população “estará bem representada” por Porto, ex- comandante do 15º BPM (Duque de Caxias) e do Batalhão de Polícia Rodoviária (BPRv).
Vandro Lopes Gonçalves, o Vandro Família – Tenta recurso para disputar a eleição a deputado estadual pelo Solidariedade, impugnada pela Justiça Eleitoral. Militar reformado, ex-deputado estadual (cassado), foi vereador, vice-prefeito e secretário de obras em Magé/RJ. Foi preso em abril de 2012, quando ainda era sargento da PM, acusado de chefiar grupo miliciano em Magé. O bando criminoso fora denunciado pelo MP pela autoria de seis homicídios. Vandro Família foi alvo de operação policial em maio de 2019, contra suspeitos de integrarem grupo de extermínio. É acusado de ser mandante do assassinato de suplente de vereador.
Sérgio Roberto Egger de Moura – Com nome na urna Egger, é candidato a deputado estadual pelo Democracia Cristã. Ex-sargento da PM, foi vereador em Araruama em 2009, quando foi preso acusado de comandar uma milícia na Região dos Lagos e da . Em 2011, foi transferido para presídio federal após descoberta de plano de atentados contra policiais, promotores, magistrados e testemunhas.
Ricardo Abrão, filho de Farid Abraão David e sobrinho de Anísio – Candidato a deputado federal pelo União Brasil, já foi deputado estadual. Desde os anos 1970, a família do bicheiro Anísio comanda a política em Nilópolis e tem representantes no parlamento. No ano passado, morreu Simão Sessim, primo do bicheiro, que cumpriu dez mandatos de deputado federal. A candidatura de Ricardo, lançada com a presença no governador Cláudio Castro, teria o objetivo de preencher essa lacuna.
Allan Turnowski – Candidato a deputado federal pelo PL, é ex-secretário de Polícia Civil. Está preso desde o dia 9 e se tornou réu em processo de organização criminosa que tramita na 1º Vara Criminal Especializada da Capital e o aponta como braço de chefões do jogo do bicho dentro da estrutura da Polícia Civil.