PCC queria matar Alckmin

Destaque, Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Wilton Junior/Estadão

Os chefes do setor do Primeiro Comando da Capital (PCC) responsável pelas operações especiais da facção – assassinatos e resgates de presos – foram os responsáveis por assassinatos de agentes prisionais, de policiais e de um juiz. A facção também “decretou”, jurou matar, o vice-presidente Geraldo Alckmin, o ex-secretário da Administração Penitenciária Lourival Gomes, o deputado federal Coronel Telhada (PL-SP), o diretor de presídios Roberto Medina, além do promotor Lincoln Gakiya.

Na terça-feira, dia 22, a Polícia federal deflagrou a Operação Sequaz para prender os chefes da Sintonia Restrita e outros envolvidos nos mais novos planos de resgate do líder máximo da organização criminosa, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Os bandidos queriam resgatar o chefão, mas, com o fracasso da ação, decidiu atacar autoridades em Rondônia, Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo. Além de policiais e agentes prisionais, a facção pretendia atacar o senador Sérgio Moro (União Brasil-PR), sua mulher, a deputada federal Rosângela Moro (União Brasil-SP), e os dois filhos do casal. Também planejava agir contra Gakiya.

As ameaças contra o promotor se repetem nos últimos cinco anos. Era 8 de dezembro de 2018 quando a polícia prendeu em Presidente Venceslau Maria Elaine de Oliveira e Alessandra Cristina Vieira, que iam visitar os presos Julio Cesar Figueira e Mauro Cesar dos Santos Silva, ambos detidos no Raio 1 (seção da cadeia) da Penitenciária 2 (P2), de Presidente Venceslau, o mesmo onde estava Marcola. Com as duas, foram achadas mensagens codificadas que foram decifradas. Os textos relatavam os preparativos do PCC para matar Gakiya, que é especializado em investigar a facção criminosa e o chefe dos presídios da região, Roberto Medina.

Carta apreendida com visitante da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, em São Paulo, escrita em código

Os promotores obtiveram então informações sobre planos para matar Lourival Gomes, então secretário da Administração Penitenciária, e o hoje deputado federal Coronel Telhada, na época parlamentar estadual. Em 2010, Telhada era comandante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) quando o PCC tentou matá-lo pela primeira vez. Os bandidos dispararam 11 tiros contra o policial, que conseguiu escapar. A tropa comandada por Telhada era responsável por algumas das principais ações contra a facção no Estado.

Três anos depois do primeiro atentado contra Telhada, Gakiya obteve provas de que a facção queria matar Geraldo Alckmin, então governador de São Paulo. Interceptações telefônicas mostraram que pelo menos desde 2011 a facção planeja matar o governador. Em uma das conversas interceptadas, um dos líderes do PCC, o preso Luis Henrique Fernandes, o LH, conversava com dois outros integrantes da facção. O primeiro era Rodrigo Felício, o Tiquinho, e o segundo era o então integrante da cúpula do PCC, Fabiano Alves de Sousa, o Paca – assassinado em 2019 em uma guerra interna da facção.

A conversa entre os bandidos aconteceu em 11 de agosto de 2011, às 22h37. Paca questionou os comparsas sobre o que deveriam fazer. Em seguida, manda os dois arrumarem “uns irmãos que não são pedidos (que não são procurados pela polícia) e treinar”. O treinamento para a ação seria para fazer um resgate de presos ou para atacar autoridades. LH disse que o tráfico de drogas mantido pela facção estava passando por dificuldades. “Depois que esse governador (Alckmin) entrou aí o bagulho ficou doido mesmo. Você sabe de tudo o que aconteceu, cara, na época que ‘nois’ decretou ele (governador), então, hoje em dia, secretário de Segurança Pública, secretário de Administração, comandante dos vermes (PM), estão todos contra ‘nois’.”

Em escutas de 2013, a ordem de matar o governador foi novamente mencionada por membros do PCC. Foi nessa época que o plano de atacar autoridades foi integrado a outra prioridade da facção: libertar Marcola. Nunca obtiveram sucesso. O primeiro plano de resgate foi descoberto em 2014 – a facção chegou a reunir um avião Cessna 510, um helicóptero Bell e um Esquilo blindado e com as cores da Polícia Militar de São Paulo para o ataque. Este último estaria armado com uma metralhadora calibre .30.

Em 2017, o plano de resgate mais uma vez foi descoberto, levando a PM a transferir um pelotão da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) para a cidade de Presidente Venceslau. A mesma tática foi usada para frustrar um novo plano, no fim de 2018. Na época, os policiais da Rota receberam treinamento do Exército para atirar com metralhadoras de calibre .50, que foram dispostas nas cercanias da penitenciária para frustrar a ação dos bandidos. Em razão disso, surgiu o plano para atacar autoridades. Logo, em seguida, em janeiro de 2019, Marcola e seus comparsas foram transferidos para o sistema penal federal.

A movimentação fez a facção reiterar a ordem para matar Gakiya, visto como principal responsável pelo destino dos 22 líderes do PCC, enviados ao sistema prisional federal. Em janeiro de 2019, uma nova carta foi apreendida, desta vez, na Penitenciária de Junqueirópolis. Em outubro do mesmo ano, outra mensagem da Sintonia Final, a cúpula da facção, foi encontrada na Penitenciária 1 de Presidente Bernardes. Por fim, em 16 de julho de 2020, novo bilhete foi apreendido, desta vez na penitenciária de Mirandópolis.

Este último foi encontrado com um detento da chamada “sintonia do sistema”, o grupo responsável pela ordem nos presídios. Ele ia se encontrar com um advogado. O documento “cobrava” dos integrantes da facção em liberdade a morte de Gakiya. Na época, a facção não ameaçava ainda o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro ou o então governador João Doria (PSDB), que executaram a determinação da Justiça de transferir Marcola e outros 21 líderes da facção. Desde então, Gakiya vive sob proteção policial.

Antes de planejar matar o promotor, a facção cumpriu duas vinganças contra autoridades no Estado. Há 20 anos, a facção assassinou o juiz-corregedor dos presídios de Presidente Prudente, Antonio José Machados Dias, em uma emboscada planejada por Marcola. Dois anos depois, a facção se vingou de José Ismael Pedrosa, ex-diretor da Casa de Detenção na época do massacre de 111 presos no Carandiru e do Centro de Ressocialização Penitenciária (CRP), antigo anexo da Casa de Custódia de Taubaté. Em 2006, a facção faria uma série de ataques contra forças policiais no estado, assassinando 59 agentes públicos.

Estadão