Partidos da base de Lula pedem ruptura de acordos da Lava Jato
Sede da Petrobras no Rio – Foto: Tânia Rêgo/Ag. Brasil
O PSOL, PCdoB e Solidariedade, partidos da base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ingressaram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender as indenizações e multas impostas em todos os acordos de leniência celebrados entre o Estado e empresas investigadas durante a Operação Lava-Jato.
O objetivo da ação, segundo o texto, é reconhecer que os acordos foram pactuados em “situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional”, mediante “situação de coação e, portanto, sob um Estado de Coisas Inconstitucional”.
A ação ainda diz que o Ministério Público Federal, “de forma inconstitucional”, chama para si todos os acordos de leniência.
Afirma também que o MPF “arrogou-se competência exclusiva” para celebrá-los, o que, segundo as legendas, ocasionou “graves distorções na parte pecuniária dos acordos, que não observaram, nem de longe, os critérios revelados pelo ACT”.
“Um modelo constitucionalmente adequado de enfrentamento da corrupção por meio de acordos de leniência tem de (i) prever a possibilidade de repactuação; (2) preservar a companhia, prevendo, conforme o caso, a compensação de crédito tributário ou em precatórios. Caso contrário, o Judiciário chancelará uma dicotomia inconstitucional, a pretexto de combate à corrupção, entre a persecução estatal e a garantia fundamental da função social da empresa”, afirma a ação.
Os partidos pedem ainda que a celebração de acordos deste tipo seja centralizada pela Controladoria-Geral da União (CGU) e que o órgão seja também responsável pela revisão de todos os acordos a partir de critérios a serem fixados pelo Tribunal Federal no julgamento do recurso.
A revisão, segundo os partidos, é necessária porque os acordos foram contaminados por coação como também pela incapacidade de as empresas pagarem acordos de leniência “superfaturados”. Defende que as dívidas, dentro do possível, sejam equacionadas com a capacidade de geração de caixa das empresas. “Só paga quem está vivo”, assinalam.
Acordos foram celebrados com vício de coação, dizem partidos
Na ação encaminhada ao Supremo, os partidos afirmam que os acordos de leniência e delação premiada foram firmados num contexto de “absoluta e irresistível coação” e que poderiam até mesmo ser tipificados como crime de extorsão.
Segundo o documento, as empresas foram obrigadas a celebrar acordos para evitar “um mal maior” e que, na Operação Lava-Jato, a lei permitiu ou até mesmo incentivou a prática de atos de coação de órgãos do Estado sobre as empresas, criando vícios a validade dos documentos.
O pedido foi feito por meio de um instrumento jurídico chamado Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), com pedido de medida cautelar para que a decisão da Suprema Corte passe a valer imediatamente.
Além do chamado vício de coação, a ação afirma que houve arbritariedade na aplicação de uma espécie de multa híbrida, que uniu ressarcimento de valores e multa propriamente dita, celebração de vários acordos de leniência e inclusão, neles, de fatos que acabaram não sendo qualificados como ilícitos.
O documento cita como exemplo o caso da Odebrecht, onde um contrato “guarda-chuva” com a empresa disciplinava os acordos de delação premiada dos executivos que aderissem a ele, lembrando que 77 executivos assinaram num mesmo dia. “Leniência da pessoa jurídica e delação premiada das pessoas físicas estavam completamente mescladas em um único instrumento”.
Para exemplificar o clima nos acordos de leniência, os partidos citam trecho do livro da jornalista Malu Gaspar, “A Organização”:
“Na ocasião, o procurador Federal Carlos Fernando dos Santos Lima, confiante de que estava em uma posição negocial muito superior, em virtude de recentes prisões que havia realizado e provas apreendidas, teria dito aos advogados da Odebrecht que “se a negociação com a Camargo Corrêa foi um embate entre judeus e palestinos, com a Odebrecht será como se os sobreviventes do holocausto estivessem negociando com os soldados da Gestapo”.
Os partidos tomam como marco para a ação o Acordo de Cooperação Técnica firmado em agosto de 2020 entre o STF, a CGU, a Advocacia-Geral da União (AGU), o Ministério da Justiça e o Tribunal de Contas da União (TCU). Nele, as instituições estabeleceram o papel da CGU na negociação de acordos de leniência. Na Lava-Jato não houve participação de órgãos da União, apenas do Ministério Público Federal e da Justiça.
Deltan Dallagnol e Moro reagem a pedido
O ex-procurador e hoje deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), que coordenou a Força Tarefa da Lava-Jato em Curitiba e vários acordos de delação premiada, reagiu pelo twitter indagando se partidos aliados do presidente Lula querem impedir que as empreiteiras paguem os valores desviados.
“O que você sentiria ou pensaria, em uma frase, se descobrisse que partidos aliados de @LulaOficial”. “querem impedir que as empreiteiras que fizeram acordos na Lava Jato devolvam o dinheiro de corrupção desviado dos cofres públicos?
O ex-juiz e senador Sérgio Moro (União Brasil-PR) afirmou que a ADPF está sendo usada em “prol do mundo do crime e contra o cidadão”.
O ministro da Casa Civil, Rui Costa, afirmou em janeiro que o governo trabalharia para que empresas condenadas pela Lava Jato possam pagar suas dívidas com investimentos em obras públicas. Caberia ao Executivo indicar quais obras seriam beneficiadas. A empresa que optar por aderir ao programa poderá quitar o débito com a construção de um hospital ou escola, por exemplo.