Nomeação ao STF, torna Dino alvo do Centrão
Foto: Ton Molina/Fotoarena/Agência O Globo
Na mesma medida em que avançou como o favorito para assumir a vaga do Supremo Tribunal Federal (STF) que será aberta com a aposentadoria da presidente da Corte, Rosa Weber, em outubro, o ministro da Justiça, Flávio Dino, viu a pressão sobre si aumentar fora da pasta. Ele entrou na mira de lideranças do Centrão e colegas de Esplanada, incomodados com supostos excessos em operações da Polícia Federal, e do PT, partido que trabalha para diminuir o poder dele no núcleo do governo mais próximo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Alas da sigla voltaram à carga no plano de desmembrar o ministério em dois, criando uma estrutura exclusiva para cuidar de Segurança Pública.
O lance mais recente ocorreu ontem, quando o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), reclamou publicamente da PF e de “excessos que estão aflorando”. À “Folha de S. Paulo”, o deputado, um dos principais nomes do Centrão, defendeu que as emendas parlamentares não podem ser “criminalizadas”, alertou para o risco de uma “polícia política” e afirmou que foi “massacrado” após um assessor ter sido alvo de uma operação que mirava a compra de kits de robótica:
— Polícia Federal não trabalha como promotor de Justiça nem como juiz. Acabou a investigação, acabou o papel, mas tem policiais indo além.
Em junho, logo após a operação que irritou Lira, Dino chegou a ir à residência oficial do presidente da Câmara para um encontro, na tentativa de amainar a relação com o deputado, responsável pela pauta da Casa Legislativa, onde passam os temas de interesse do Palácio do Planalto. Integrantes do Ministério da Justiça minimizaram as novas queixas do parlamentar. Veem nas declarações tentativas de politizar o trabalho da corporação e motivar trocas em superintendências, movimento que ocorreu durante a gestão de Jair Bolsonaro e foi investigado pelo STF. Estes auxiliares de Dino pontuam que o posicionamento do congressista, na prática, funciona como “elogio” à atuação da PF.
O incômodo, no entanto, é mais amplo. Alcança o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, do União Brasil. Nos bastidores, ele tem atribuído a investigação que chegou a afastar Luanna Martins Bringel, sua irmã, do cargo de prefeita de Vitorino Freire (MA), a disputas locais com o Dino, ex-governador do estado.
A apuração investiga suspeitas de desvios envolvendo emendas parlamentares enviadas pelo ministro no período em que ele foi deputado. Juscelino teve os bens bloqueados, e sua irmã já retornou ao cargo, por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF.
— Emendas são um instrumento legal, pelo qual os recursos podem chegar a municípios remotos, distantes, com o olhar de um parlamentar. Há instrumentos para fiscalizá-las. Se alguém cometeu ato ilícito, que seja punido. Não podemos generalizar ou criminalizar as emendas — endossa o deputado Felipe Carreras (PE), líder do PSB, partido de Dino.
Ao portal Metrópoles, nesta segunda-feira, o novo ministro do Esporte, André Fufuca, reforçou o coro: disse que é “totalmente equivocado” criminalizar emendas e que as apurações devem se concentrar em eventuais “desvios”.
Aliados de Dino rechaçam que haja interferência dele na PF e argumentam que a única orientação foi evitar operações “espetacularizadas” como na Lava-Jato.
Dino e o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, são hoje os dois nomes mais bem posicionados para o STF. Como mostrou a colunista Bela Megale, o favoritismo de Dino já abriu a disputa por sua cadeira, uma das mais importantes da Esplanada. Uma alternativa seria o próprio AGU. Também estão cotados o secretário nacional de Justiça, Augusto de Arruda Botelho; o advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas; e o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Cappelli. Nesse cenário, o PT voltou a fazer pressão para a divisão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, na hipótese de indicação de Dino à Corte.
Petistas vêm criticando a falta de protagonismo das políticas de segurança pública, enquanto aliados do ministro enxergam movimento deliberado da legenda para reduzir poder do ministro e indicar um nome para assumir uma pasta que trate do assunto. Em meio à pressão, Dino reuniu equipe ontem e publicou um resumo das ações nas redes sociais. “Já repassamos aos estados, neste ano, R$ 504 milhões do Fundo Nacional de Segurança Pública”, escreveu
Durante a campanha do ano passado, Lula chegou a prometer que criaria uma pasta específica voltada ao tema, em uma tentativa de se aproximar de uma pauta cara à direita. Na transição de governo, no entanto, Dino conseguiu convencer o presidente a manter as duas pastas unificadas.
Em quase nove meses de governo, o ministro se tornou um dos principais conselheiros do presidente para assuntos do meio jurídico e tem ampliado sua influência em um círculo onde é o único nome fora do PT. Já cotado para a vaga, ouviu de Lula um pedido de nomes de mulheres que poderiam ser indicadas ao STF, pleito que mobiliza parte da base lulista.
Dino também foi um dos responsáveis pela indicação da jurista Marcelise Azevedo para a Comissão de Ética da Presidência e tem levado outros nomes, como o do ex-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) Fernandes Mendes para assumir como desembargador no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Declarações em que Mendes defendeu a Lava-Jato incomodaram petistas, e ele acabou barrado.
Integrantes do Ministério da Justiça avaliam que lideranças petistas se movimentam para ver Dino fora do posto e, assim, distanciar de Lula o único nome não petista que integra esse núcleo mais restrito de acesso ao presidente. Outra leitura é que, se Lula indicá-lo à vaga de Rosa Weber, estará abrindo mão do único ministro que faz embates políticos contra o bolsonarismo.
Em meio à disputa com Messias, aliados de Dino acreditam que, diferentemente do advogado-geral da União, o ministro está numa posição de “ganha-ganha”. Se permanecer no comando da pasta, seguirá fortalecido no governo, ao mesmo tempo que, se for para o STF, terá protagonismo na Corte — o que não o impediria de no futuro concorrer à Presidência da República.