Eduardo Bolsonaro defende Pinochet e sistema que fez aposentados chilenos ganharem 30% do salário mínimo
SANTIAGO – O deputado federal e filho do presidente eleito brasileiro Eduardo Bolsonaro, que tem atuado como representante informal do futuro governo em temas de relações exteriores, está no Chile, com o objetivo de conhecer o sistema previdenciário do país e se encontrar com membros do governo e outros políticos de direita.
No Twitter, ele disse que seu objetivo é conhecer o “exemplo de sucesso da economia chilena”.
“Chegou a vez de o Brasil ter os seus ‘Chicago boys’ comandando a economia. O Brasil é tão abençoado que por vezes nem precisa desenvolver ou criar uma nova política, com risco de falhar, basta copiar as que já dão certo no exterior”, escreveu.
Em uma entrevista ao portal de notícias El Mercúrio Online (Emol), ele afirmou que seu principal objetivo é ter maior contato com o sistema previdenciário do país.
— Pensamos que o Brasil pode ser o próximo Chile, se conseguirmos aprovar a reforma previdenciária. Os detalhes desta reforma serão apresentados provavelmente no começo do ano que vem — afirmou.
Após ser questionado sobre como o governo conseguiria adotar a reforma, uma vez que o Chile o fez durante a ditadura de Augusto Pinochet, Eduardo disse que fatores como “um grande apoio popular, uma eleição que foi uma tsunami, uma comunicação direta com as pessoas nas ruas e a melhor equipe econômica de todos os tempos” devem garantir apoio. Ele também afirmou que pretende “melhorar” o sistema chileno.
— Sei que o sistema chileno de pensões não é perfeito, por isso também quero ver como fazer um sistema melhor que o chileno. Queremos ter uma comunicação mais próxima com o Chile — disse.
Em entrevista ao jornal La Tercera, Bolsonaro defendeu Pinochet, sobretudo economicamente, e disse que o ditador, cujo regime matou mais de 3 mil pessoas e torturou mais de 30 mil, “impediu que o Chile se transformasse em uma nova Cuba”:
— Isto aconteceu com o Chile, com o Brasil e com a Argentina, com mais ou menos energia. Mas no Chile hoje vocês veem os frutos de sua reforma nas pensões, na economia, que têm muito a ver com as reformas que ele fez na década de 1980 — afirmou. — Então, o que fez de mau, sejam torturas, mortes, pode-se falar, mas há também muitas coisas boas. Mas preciso esclarecer que não tenho profundo conhecimento da situação do Chile.
Primeiro país do mundo a privatizar a Previdência, ainda na década de 1980, o Chile adotou um modelo no qual cada trabalhador cuida de sua própria poupança, depositada em uma conta individual, em vez de ir para um fundo coletivo. A administração do dinheiro é feita por empresas privadas, que podem investir no mercado financeiro, o que estimula o crédito, investimentos e emprego.
Apesar disso, o modelo é atualmente tido como insustentável até pelo governo de Sebastián Piñera, de direita. Por motivos variados, como falta de renda, um grande número de idosos no país não fez a própria poupança. Apesar de ser o país de renda per capita mais alta da América Latina, os aposentados chilenos recebem, em média, de 30% a 40% do salário mínimo, de 241 mil pesos chilenos (cerca de R$ 1.365). A situação, alvo frequente de protestos, é considerada tão grave que Piñera deve em breve enviar uma proposta de “reforma da reforma” ao Congresso, mudando o sistema de contribuições.
Durante os anos Pinochet, após viver um colapso econômico em 1973, no último ano de governo de Salvador Allende, a economia chilena viveu um boom econômico a partir de 1977, em grande parte devido a reformas econômicas adotadas por economistas conservadores educados na Universidade de Chicago, que reduziram os gastos públicos. Críticos afirmam, entretanto, que isto veio ao custo de um grande aumento da desigualdade social e que culminou na crise econômica de 1983, a pior desde a décade de 1930.
Como exemplo, a taxa de desemprego chilena passou de 4,3% em 1973% a 22% em 1983, devido à queda do número de servidores públicos. Os salários em termos reais perderam 40% de seu valor no mesmo período. Durante a crise, a economia chilena encolheu 14,3% e o desemprego aumentou em 23,7%.
Companhia disputada
A companhia de Eduardo, que chegou ao país na quinta-feira às 14h locais, está disputada. Já no aeroporto, foi recebido pela senadora e presidente da União Democrática Independente, partido de direita que apoiou a ditadura de Pinochet e atualmente integra a coalizão do governo de Sebastián Piñera, Jacqueline Van Rysselberghe.
O encontro não constava no planejamento inicial da visita e aconteceu porque a senadora, que conheceu o pai do deputado em outubro no Brasil, estava no aeroporto e aproveitou a ocasião para recepcionar o brasileiro. Eles almoçaram juntos, ao lado do principal cicerone de Eduardo, o seu amigo, advogado e membro do Conselho para a Transparência, Francisco Javier Leturia.
or ocasião da reunião informal, Bolsonaro atrasou-se para um encontro marcado com o ex-candidato presidencial José Antonio Kast, militante histórico da UDI, até se desligar do partido em 2016, que atualmente lidera o movimento de direita Ação Republicana. O encontro foi o que atraiu maior atenção midiática, devido à proximidade entre o político chileno, que chegou em quarto no pleito de 2017, e Jair Bolsonaro, a quem veio ao Brasil cumprimentar pessoalmente após o primeiro turno.
Kast é um fervoroso defensor do pinochetismo e já declarou que, se eleito, concederia indulto a militares condenados à prisão perpétua por crimes contra a Humanidade. Em 2017, após se reunir com Miguel Krassnoff, ex-brigadeiro que, por sua atuação na polícia secreta Direção de Inteligência Nacional (Dina), foi condenado a mais de 600 anos de prisão, disse que o ex-militar era “um bom sujeito”. Também em 2017, Kast afirmou que o governo chileno se curvava “diante de uma ditadura gay”.
No Twitter, Kast saudou o emissário do novo governo brasileiro:
“Bem vindo ao Chile, Eduardo Bolsonaro. Nós, chilenos, queremos que o Brasil vá bem e que as ideias de liberdade sigam triunfando na América Latina e rechaçando a ideologia, a violência e as falsidades que a esquerda nos quer impor”, escreveu.
Na reunião, da qual participaram seis deputados da Renovação Nacional, de Sebastián Piñera, e um deputado da UDI, foram abordados temas como gêneros sexuais, corrupção, a relação comercial entre Brasil e o Chile e o pacto global de imigração, da ONU, que o novo governo, assim como Chile, anunciou que boicotará.
— Venho para escutar e ver o exemplo do Chile por sua estabilidade financeira. Muito mais para escutar que para falar — disse o deputado na reunião, segundo o jornal El Mercurio.
De acordo com o jornal La Tercera, no final da reunião, Eduardo exaltou o futuro ministro da Fazenda Paulo Guedes, a quem apresentou como “um dos Chicago Boys, que vocês tiveram a sorte de ter nos anos 1980. Por isso o Chile está hoje tão bem financeiramente”, afirmou.
Os parlamentares fizeram três pedidos ao político do PSL, segundo o diário: facilitar o apoio para a investigação de uma suposta “rota de financiamento a terroristas e comunidades da Araucanía provenientes de Venezuela ou Cuba”; ajudar em iniciativas para avançar o Corredor Bioceânico e abrir uma comissão investigativa anticorrupção.
Nesta sexta-feira, o deputado encontrou-se pela manhã com o ministro do Desenvolvimento Social, Alfredo Moreno. Às 16h locais, ele tem um encontro marcado com o ministro da Fazenda, Felipe Larraín, em ambos os casos, com a companhia de Jacqueline, que teria sido a ponte para as reuniões.
Eduardo Bolsonaro deve permanecer no Chile até segunda-feira. No sábado, participa de um seminário sobre “Marxismo cultural e desafios da atualidade cultural”, organizado pela fundação Cuide Chile, da mulher de Kast, Miría Pía Adriasola. A conferência terá a presença de Agustín Laje e Nicolás Márquez, autores do “Libro Negro de la Nueva Izquierda”, da deputada da RN Aracely Leuquén e da advogada e militante católica Christine Tonietto, recém-eleita deputada federal pelo PSL do Rio de Janeiro.
De O Globo