Um dia no coração da “balbúrdia”: leia reportagem sobre a UnB
Reconhecida como uma das melhores universidades da América Latina, a UnB (Universidade de Brasília) foi acusada pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, de ser uma das universidades federais que promovem “balbúrdia” em seus campi.
Em sua fala, o ministro mencionou festas e eventos políticos. “A universidade deve estar com sobra de dinheiro para fazer bagunça e evento ridículo”, disse, citando como exemplos “sem-terra dentro do campus, gente pelada dentro do campus”.
Após repercussão negativa, o MEC recuou e mudou o discurso. A pasta, então, passou a afirmar que o bloqueio valeria para todas as instituições de ensino –e que era necessário para cumprir a meta fiscal.
Mas o meme já estava pronto. Nas redes sociais, estudantes passaram a divulgar imagens de gente trabalhando em laboratórios e estudando em bibliotecas para mostrar a “balbúrdia” que estavam fazendo nas universidades.
A reportagem do UOL visitou o campus Darcy Ribeiro, o maior e mais tradicional da UnB, em uma sexta-feira, às 9h. No local, além de faixas contra os bloqueios no orçamento da educação, o que se viu foi muita movimentação de alunos –e muita gente estudando.
“Eu costumo falar, com os meus amigos, que a UnB é uma prova de sobrevivência, e o prêmio final é a morte”, diz Júlio César Nunes, 19.
Aluno do curso de física, o jovem define sua rotina como uma “maratona de estudos”. “Você vem, estuda, vai para a aula e estuda de novo. É bem puxada a universidade; ela realmente cobra muito dos estudantes”, diz.
“Passo o dia aqui todos os dias”, conta Luiz Felipe Ayub, 21, que está no quinto semestre de engenharia ambiental. Além de assistir às aulas pela manhã, ele dá tutoria de disciplinas da grade curricular do curso para seus colegas.
“Minha visão da UnB talvez seja meio debilitada, porque passo muito tempo na FT [Faculdade de Tecnologia]. Aqui, eu não vejo nada que justifique balbúrdia”, diz. Na manhã em que conversou com a reportagem, Luiz Felipe estava estudando –no horário, ele teria uma aula, que foi cancelada.
Se existe algum evento que justifique a acusação de balbúrdia? Para o aluno de agronomia Felipe Lara Carvalho, 18, ela representa um estereótipo, e não que acontece de verdade na universidade.
Em maio, um evento no ICC (Instituto Central de Ciências), que reúne cursos de exatas, humanas e sociais, virou alvo de críticas nas redes sociais. Era uma competição de drag queens, realizada em comemoração ao Dia Internacional de Luta contra a LGBTfobia.
“Mas isso não é feito com o dinheiro público, com o dinheiro do trabalhador”, diz Felipe. “O que se vê por balbúrdia é o que muita gente pensa porque nunca pisou na UnB”, afirma.
“Qualquer ambiente que tenha jovens, tem festas. Mas aqui, por ser um espaço aberto e de acesso livre, tem sido visto com maus olhos. Em outras universidades também acontece esse tipo de coisa, mas, por serem privadas, tudo fica bem escondido”, diz Maia*, aluna do curso de serviço social.
Ex-aluno de escola pública, Júlio César conta ter sentido dificuldade em acompanhar as aulas quando passou na UnB. “Entrei no ano passado, mas estou fazendo o primeiro semestre de novo. Na escola pública, eu vejo que nivelam o aluno por baixo”, conta.
Espalhados pelas paredes da UnB, há cartazes contra o machismo e dizeres em defesa dos direitos LGBT, causas que são mais associadas à esquerda. Também há placas de movimentos que se dizem antifascistas.
A atual gestão do DCE (Diretório Central dos Estudantes), por outro lado, se define como sendo de direita. Eleita no ano passado, a chapa Aliança pela Liberdade derrotou a Unidade para Resistir, que tinha o apoio de partidos como PT, PCdoB e PSOL.
Para os alunos, há de fato uma pluralidade de ideologias na universidade.
“Eu vi um pessoal migrando mais para o centro atualmente. Teve por muito tempo um discurso de esquerda, mas a direita cresceu bastante. O discurso da direita foi crescendo e foi migrando mais pessoas para o centro”, diz Carlos*, aluno do curso de direito.
“Hoje, eu não consigo definir o perfil da universidade. A última gestão do DCE foi da esquerda, e foi meio caótico, porque a esquerda tem dificuldade de se manter unida.”
“O perfil político depende do curso. No ICC norte tem mais cursos de humanas e, quando tem manifestação eles vão, muito levados pela esquerda. Na FT, quando tem greve, é o prédio que não fecha”, diz Felipe, da agronomia.
A aluna de engenharia mecânica Rute Borges, 22, diz acreditar que há uma mistura de vertentes políticas entre os alunos. Ela também rejeita rótulos e afirma não saber se se identifica como sendo de direita ou esquerda.
“Tanto direita quanto esquerda podem vir aqui e dar suas opiniões, suas propostas. E a gente vai dizer se concorda ou não”, afirma. “Por exemplo, se vier algum representante de um partido aqui dizer alguma coisa, não quer dizer que os alunos concordam com ele ou não.”
Luiz Felipe, aluno de engenharia ambiental, diz se identificar mais à esquerda, assim como seu quase xará Felipe, estudante de agronomia.
“Sou de centro, porque sabe esses testes de internet? Penso no equilíbrio das duas partes. Acho importante. Me considero no centro, nem direita nem esquerda”, afirma Júlio, aluno do curso de física.
Do UOL